TEXTOS DO I CONCURSO DA AECALB NO RJ COM OS RESPECTIVOS PRÊMIOS
ALFREDO NOGUEIRA FERREIRA - ALDO NORA (FLORIANÓPOLIS - SC)
O MESTRE VAI AO ESTÁDIO DE FUTEBOL
Era domingo. Um sol fulgurante, morno e aconchegante, num céu azul sem mácula, alegrava o dia.
Havia um movimento desusado nas ruas . Gente, carros buzinando, ônibus atulhados, davam mais vida e redobravam a alegria nesse domingo.
Toda a festiva animação era a decorrência do grande clássico de futebol que se jogaria dentro de algumas horas.
Os portões do estádio já estavam abertos e uma mole humana se concentrava nas imediações.
Viam-se bandeiras, faixas, grupos com tambores e cornetas, homens e mulheres envergando as camisetas de seus clubes. Gritos, palavras de ordem, desaforos, enfrentamentos, por vezes, intervenções da polícia.
Uma multidão imensa coloria as bancadas do imponente estádio. Entrava sempre mais gente que se acomodava, agora, em pé, na volta do campo. Já próximo do início do jogo, entra no estádio um grupo compacto de homens e algumas mulheres e que chama a atenção pela sobriedade do comportamento. Dava a impressão de um grupo de turistas, pois não tomava partido por qualquer dos litigantes. Era notória a presença de um líder que comandava o grupo. Simpático, erecto, barbaçudo, sandálias nos pés, envergava uma túnica vermelha.
A bola rolava, os torcedores manifestavam-se. Gritos, xingamentos, um coro de vozes apoiando o time dos encarnados feriam os tímpanos dos mais próximos, neles se incluindo aquele peculiar grupo. O adversário fardava-se de azul e seus apoiantes situavam-se no lado oposto do campo.
Em determinado momento um jogador dos azuis apanha a bola, dribla um, avança, finta um segundo, um terceiro e já na área, para, levanta a bola e de cabeça atira para o golo. A bola bate no travessão e sai. O líder do grupo que até ali se mantivera quieto e calado, aplaudiu, entusiasticamente, a jogada. Torcedores do outro clube vaiaram o jogador e, tendo notado a manifestação daquele homem, começaram a ofendê-lo, lançando injúrias e insultos. Passados poucos minutos o goleiro dos rubros faz uma defesa assombrosa, “voando” para o alto e desviando a bola do ângulo, após uma cobrança de pênalti. Novamente aquele homem aplaudiu o lance de belo efeito. Toda aquela chusma que o havia vaiado ficou, agora, calada. Que torcedor era aquele que ora aplaudia os de azul, ora os de vermelho? E um deles, mais atrevido e gritando, perguntou:
– E aí, meu? Qual é o teu time?
Um dos do grupo ouviu o desafio e cutucou o Mestre (era assim que o chamavam) que falava com outro.
Este, calmo, virou-se para o provocador e disse:
– Sou do Azul, a cor do céu. Veja como está lindo! O vermelho lembra o fogo, o sangue...
– O sangue que é vida, energia e força. O sangue que nos vai dar a vitória, emendou o outro.
– O sangue que é derramado em disputas inúteis,completou o Mestre.
O insolente não perdeu tempo e provocou:
– E por que esse vermelho que te cobre o corpo? E esses arreganhos, ainda há pouco, na defesa do nosso goleiro? Não dá pra te entender, meu chapa!
– É simples, meu caro senhor, a cor nada mais é do que luz e a luz alumia o mundo. O mundo é a natureza. E a natureza é feita de cores. Assim, o mundo é colorido e por ser colorido é mais belo. Não devemos desmerecer as cores. Há criaturas que não aceitam certas cores por razões clubísticas ou outras. Isso não é próprio de alguém que se preza. Já disse, sou torcedor do time azul, mas não deixo de vestir um blusão ou uma camiseta vermelha, sempre que me aprouver.
Isso foi dito em meio a uma zoeira atordoante e, assim, poucos puderam ouvir essas palavras.
O jogo continuava disputado, atraente, eletrizante. A bola não saía da área, ora de um, ora de outro, sempre com o risco de golo. E aí aconteceu... numa jogada rápida, dois avançados da equipe escarlate tabelando de cabeça, entram na área e um deles finaliza para o fundo das redes. A jogada arranca aplausos e leva ao delírio a sua torcida.
O Mestre aplaude, levanta os braços para os seus pupilos que seguem o Mestre nos aplausos.
O atrabiliário torcedor rubro empolgado vira-se para o grupo com a intenção de gozar os adversários e alvejá-los com ironias e indecências; e vê o Mestre comemorando o gol. E não se conforma. E não entende o que vê. E em tom de provocação, grita:
– Só tinha de comemorar mesmo, seu palhaço. Os otários do teu time não fazem isso. São uns... (e cuspiu um palavrão).
O Mestre esperou que a barulheira abrandasse, acercou-se do exaltado torcedor e, como nas anteriores intervenções, falou comedido.
– Sabe o senhor, que o esporte é um espetáculo que atrai muito público. Esse público sabe que vai encontrar duas qualidades: o bom e o belo. Há exceções é evidente. Ora, o futebol sendo um espetáculo é bom porque nos proporciona prazer. E se jogado segundo as regras e com qualidade, torna-se vistoso e de extraordinária beleza. Quem não vibra com um golo de bicicleta? Um golo de bicicleta é pura arte. Só ele já paga a entrada no estádio. Quem não aplaude um daqueles dribles que deixa o adversário estatelado no chão? Um drible assim é pura arte. Quem não se entusiasma vendo um goleiro “voando” para defender uma penalidade chutada no canto de sua goleira? Esse “vôo” é arte que encanta. Quem não pasma quando um jogador apanha a bola no seu meio campo e, com ela grudada no pé, vai avançando e fintando quantos adversários lhe apareçam pela frente e, no derradeiro toque, passa pelo goleiro e empurra a bola para a goleira vazia? Um lance assim não é uma obra de arte? Devemos aplaudir a arte no momento em que ela se define aos nossos olhos. Não importa que a arte seja executada pelo adversário. Foi o que fiz. Se todos fizessem isso o futebol seria maravilhoso dentro e fora do campo.
A essa altura, já se cumpria o intervalo e o torcedor havia chegado mais perto do Mestre. E com as arquibancadas menos rumorosas ficou mais fácil a conversação.
– E onde fica a torcida e o amor pelo clube que pede ou exige o recurso ao xingamento e ao palavrão? Retrucou o apaixonado torcedor rubro.
– A torcida e o amor pelo clube ficam intocados. Cada um vai continuar torcendo pelo seu time do coração. Eu me referi aos lances de efeito, de grande beleza. A beleza dentro do campo deve ser aplaudida. E quem assim proceder estará dando um espetáculo de beleza fora do campo. Quanto ao xingamento e ao palavrão, aquele que os profere dá uma pobre demostração de si, não ajuda o time em nada e estimula mais o ânimo belicoso.
– Eu não vou nessa conversa de que tudo é arte e maravilha dentro do gramado. Não vês agressões, violências, brigas generalizadas? E digo mais, cara. Em noventa minutos de jogo, só há trinta ou quarenta minutos de jogo jogado. A arte e a beleza de uma jogada é exceção. O expectador é o mais prejudicado. Os jogadores usam de malandragem e de desonestidade o tempo todo. Um tipo toca o outro com o dedo e o cara cai ao chão, rebola três, quatro vezes, abre a boca e grita, parece que vai morrer. São desonestos, fazem uma falta claríssima e dizem ao juiz que nada fizeram. Chutam a gol, a bola vai direto pra fora e apontam logo para o escanteio. Tinha de haver um código de ética para os jogadores. E os técnicos deviam chamar a atenção do jogador para este aspecto.
– É verdade. Há muitas faltas e é pena. Isso torna o espetáculo caro para um esporte que se diz popular.
– Não tens jeito de torcedor, desses que frequentam os estádios sempre que há jogos, mas parece que entendes do assunto. Então, me diz, qual seria a solução para o caso?
– É simples. O jogador de qualquer modalidade esportiva deve olhar o adversário como um colega de profissão, melhor ainda, como um irmão. Ninguém vai tratar mal um irmão, não é assim?
– Isso não funciona. Os caras entram em campo para enfrentar um inimigo. Tinha de haver uma punição mais dura para esses infratores. Repito, um código de ética para os jogadores.
– Esse código já existe e tem um só artigo.
– Como assim?
– Está dentro de cada um.
– Não entendo, cara. Põe clareza nisso.
– Ama o teu próximo como a ti mesmo. Se não queres o mal para ti, não o faças a outro. Este preceito , se fosse levado à risca, resolveria tudo.
– Não acredito nisso. É coisa do passado. De dois mil anos atrás e nesse tempo nem futebol havia. Hoje, no futebol, só interessa vencer. Vencer significa mais dinheiro e é o dinheiro que comanda o futebol . E para vencer vale tudo – até quebrar uma perna ou um braço do adversário. As entidades esportivas, os dirigentes, os técnicos, os jogadores, os empresários dos jogadores só pensam em dinheiro, querem enriquecer rápido. Estamos diante de um capitalismo feroz no reino do futebol.
O Mestre concordava com o torcedor, pois, o que ele dizia era evidente. Porém não abdicava de seu ponto de vista.
– Mas lembro, e uma vez mais, que o futebol é um espetáculo e como tal deve ser jogado. E dar pontapés e agredir o outro não é esporte. Precisamos, urgentemente, ser mais humanos. O que vemos é um clubismo doentio que cega as pessoas e lhes tolhe a razão. E quando esta não funciona o homem se embrutece. E então, nosso próximo já está muito distante de ser um irmão.
– Não achas que os técnicos com a responsabilidade do cargo e com a ascendência que têm sobre os jogadores podiam ter uma palavra a dizer nesse problema?
– Os técnicos, muitos deles, mandam bater, jogar duro com o adversário.
– Então para que servem os técnicos?
– Para nada. O técnico é um desperdício para o clube. É o que mais ganha e o que menos rende. Começa que está do lado de fora do gramado, portanto, não joga. E quem ganha ou perde os jogos são os que estão lá dentro. Digo mais: são eles, muitas vezes, a razão da derrota do time.
– Mas, há aqui uma contradição. Se não faz nada, como diz, e se são até a causa de derrotas, por que é que são tão disputados?
– É isso que me intriga. Como é que uma diretoria composta de homens (que se supõe) esclarecidos paga uma fortuna para um cidadão que é figura nula numa equipa de futebol? E depois, – o que é altamente assombroso – despedem-no após duas derrotas e contratam outro, talvez por uma soma maior ainda.
– E, depois, de tudo o que disse, eu pergunto. E para que serve o técnico, então?
– Para nada. O técnico é uma figura decorativa, uma espécie de rei que não manda e, principalmente, que nada decide.
– Aí eu não concordo. O técnico manda, sim senhor, é ele que determina a estratégia do jogo, a tática a ser usada, a escolha dos jogadores, os que devem ser substituídos, o ritmo a ser empregado e por aí vai...
– Meu caro senhor! Aparentemente, manda. Contratado a peso de ouro ele não tem que dizer alguma coisa a seu jogadores? Não chamam a isso preleção? Preleção é dar lição, é ensinar. Ora, o técnico não ensina o jogador a jogar. O que faz é dar umas noções de tática, e de como atuar dentro de campo. Dizer isso e não dizer nada é o mesmo. No campo vão encontrar um adversário que pode desfazer todos os seus intentos. Basta que tais adversários sejam melhores. Melhores, digo. E aqui está o segredo de tudo – os melhores serão sempre os vencedores, seja qual for o técnico. Há exceções, claro; estas, confirmam a regra. Mas, dizia, por essas preleções começaram os técnicos a ser chamados de professores. Com isso desmoralizaram uma classe de escol. A classe mais imprescindível de um país, pois, sem essa classe, nenhum país cresce, nenhum povo se torna civilizado. O professor é alguém que muito estudou e que depois vai ensinar, em qualquer ramo do conhecimento, a tornar uma pessoa capacitada a exercer as suas habilitações e a vencer na vida. É como um oftalmologista que procura dar luz aos olhos de um ceguinho. Ora, o que vemos são técnicos quase iletrados dirigindo equipes de futebol. O que se pode esperar deles?
– Quer dizer, então, que é um despropósito contratar um técnico de futebol?
– Sem dúvida. Com o que pagam para contratar um técnico, comprariam uns quatro ou cinco muito bons jogadores. Isso é que deixaria mais forte e competitiva a equipa. E com o salário do técnico, a cada mês, pagariam dois ou três jogadores do elenco. Olhe, para não dizer que não servem para nada, servem, pelo menos, para divertir o publico. São mais atores cômicos do que, propriamente, técnicos de futebol. Eu me divirto muito com eles quando vejo os jogos pela televisão. Mas não vou falar disso, agora. Para encerrar essa questão do técnico vou lhe citar apenas uma (dentre muitas) expressão de um afamado técnico. Perguntado, ao final de um jogo, porque só vitórias acumulava, respondeu: “eu ganho porque tenho os melhores jogadores”. Essa resposta diz tudo.
A esta altura, o exaltado torcedor esquecia o jogo e era todo ouvidos para as palavras do Mestre. Já não era seu contraditor, mas um atento admirador desse homem que, apesar da aparência , conhecia as artimanhas do futebol e falava tão melifluamente.
Estavam tão embebidos no diálogo que estremeceram com a explosão de gritos e a ovação retumbante vindas das arquibancadas.
O jogo estava no fim dos acréscimos quando, depois de um escanteio a favor dos azuis, a bola é cabeceada para fora da área, cai nos pés de um contrário que, de uns trinta e cinco metros, manda uma “bomba” para empatar a partida.
A saída é tumultuada. Há gritos, aplausos, empurrões, bandeiras lambendo a face de muitos, a estridência de cornetas ferindo os tímpanos. Na confusão, o torcedor e o Mestre se desencontram.
Fora do estádio vão se formando grupos que logo se adensam em multidão. Um alarido infernal vai se alastrando naquele imenso espaço. Gritos histéricos, xingamentos, um batucar contínuo de tambores. O chão está coalhado de garrafas e de latinhas. Há, seguramente, nos vasos sanguíneos álcool suficiente para deflagrar um enorme incêndio. As provocações são cada vez mais ferinas. Um clima tenso, nervoso desce sobre o local. Há choques de torcedores, um prenúncio de conflito.
Surgem os primeiros policiais . Torcedores exaltados xingam os recém-chegados . Só se ouvem frases carregadas de fetidez. Logo dois se engalfinham e, num átimo, são dezenas em luta corporal. A polícia procura separar os desafetos. O que era um entrevero torna-se numa verdadeira batalha. Torcedores de ambos os clubes que lutavam entre si, envolvem-se com os policiais. A refrega é geral e vale tudo. Pedras, paus, garrafas, barras de ferro, cadeiras são arremessadas na confusão. Já há armas engatilhadas nas mãos de policiais. Um corre-corre desordenado e aflito gera mais confusão.
O grupo liderado pelo Mestre, ao deixar o estádio depara-se com um ambiente caótico e hostil. Uma espécie de névoa paira sobre esse palco de distúrbios, fruto do gás lacrimogênio e gás pimenta lançados pela polícia. Repórteres dos veículos de informação correm, ora procurando um flagrante insólito, ora fugindo dos canhões d'água.
Sem saber o que fazer o torcedor dos rubros, agora perdido na multidão, pede a um repórter – pensando em uma solução para acalmar os ânimos – que entreviste o Mestre. O repórter não sabe quem é o Mestre e onde encontrá-lo. O torcedor dá-lhe algumas referências sobre a criatura, ligando-o a um grupo. O repórter aceita a incumbência e com um megafone nas mãos lança no ar um apelo. “Pedimos a um ilustre senhor envergando uma túnica vermelha e que lidera um grupo de pessoas, o favor de dirigir-se até nós, com urgência”. E deu uma referência fácil de ser identificada. Volvidos alguns minutos, surge o Mestre e seu séquito. E, então, o repórter com voz firme, pede: “por favor, atenção, pedimos a todos que escutem. É alguém que vos quer falar”.
O Mestre com serenidade diz: “Senhores torcedores e senhores policias. Peço-vos um instante de atenção”. Suas palavras reboam no espaço como algo estranho e sobrenatural.
– Depois de um espetáculo prazeroso não se pode presenciar uma batalha entre irmãos. Caríssimos senhores, estou vendo pais de um lado e filhos de outro; maridos em lado oposto ao das esposas; jovens confrontando jovens. Isto não é de humanos. O amor a uma camisa de clube não pode ser maior que o amor a um ser humano.
A esta altura, todos, sem exceção, ouviam em silêncio.
– Quero lembrar que há uma única regra de boa convivência entre os homens: amai-vos uns aos outros. Se todos a seguissem com rigor não haveria disputas, não haveria crimes. Não haveria, sequer, zangas. Vimos há pouco um espetáculo de beleza, no estádio. Essa beleza deve ser procurada a cada instante, no mundo que nos rodeia. Ver e sentir o belo extasia a alma e nos torna feliz. Mas, parece que o homem abdicou da beleza para contemplar a fealdade. A beleza nos eleva; a fealdade (o mau uso da vida) nos rebaixa. Precisamos inverter estes valores. Deixar os ínvios caminhos que trilhamos e enveredar pela senda do amor.
Assim, ia discorrendo o Mestre quando uma voz esgoelada varou o espaço. Vinha de um torcedor, ocultado por uma árvore para não ser apanhado pelas balas de borracha.
– Não vem com esse papo, parceiro. Ninguém vai deixar de xingar os caras do time adversário. Não há coisa melhor do que abrir a boca e vomitar todos os palavrões conhecidos e inventados contra os jogadores, técnicos, juiz e até mesmo os do próprio time. A gente descarrega toda a tensão e nervosismo e fica aliviado. Dá um sentimento de prazer como se se festejasse um golo. É isso aí... não vem com essas baboseiras.
O Mestre ouviu tudo e quando o agastado torcedor terminou, ele, com brandura e alteando a voz para que todos ouvissem, continuou:
– Meus amigos: vivemos pela cabeça, a parte mais nobre do corpo. Por ser nobre está no alto e o seu interior – a porção mais importante – está resguardada em uma redoma óssea. Daí, partem os comandos para o resto do corpo. É, pois, vital que a cabeça se mantenha limpa para que a boca não se abra para sujidades. Quando tal acontecer seremos mais afetivos e mais compreensivos. Seremos mais humanos. E, se na boca aflorar um sorriso, tanto melhor, pois as palavras que se seguirem serão de suavidade e não de aspereza, de amor e não de ódio. E como disse um poeta, às vezes basta um sorriso para dar sabor à vida. Se desejamos ser bem acolhidos e bem tratados, sejamos acolhedores e reverentes. Se assim procedermos a vida será melhor e não haverá desacatos. Os que me ouvem, agora, estiveram, como eu, assistindo a um espetáculo. E quem vai a um espetáculo, é para fruir esse espetáculo. Do princípio ao fim. E de lá sair satisfeitos pelo prazer que nos proporcionou. Lembro a todos que a cobiça do primeiro lugar e a conquista dos três pontos estão na origem de todas as disputas. Devemos manter sempre o nosso cariz humano quando, nos espetáculos desportivos, se digladiam dois adversários. Os que estão na luta vão procurar vencer e é justo que assim procedam, desde que obedeçam às regras, tanto regulamentares quanto éticas. Os que, fora do campo assistem à disputa, cabe-lhes incentivar com aplausos, cantos, gritos, e frases de estímulo e tudo o que for capaz de contribuir para a vitória do seu grupo. E, no final, se vitoriosos, fazer a festa. Os perdedores, embora tristes, devem sair de cabeça erguida, se jogaram como lhes competia. Perderam no resultado, mas foram sócios na feitura do espetáculo. E devem merecer elogios porque aceitaram com dignidade a vitória dos seus opositores. Destes, deveriam ouvir como homenagem o “víctis honos”, em honra dos vencidos.
Na quietação daquele momento, quando todos os olhares buscavam aquele homem falando com suavidade, o torcedor avinagrado e num esganiço, lança farpas contra o Mestre.
– Chega de conversa fiada, cara. Ninguém vai nessa de dar a mão ao próximo, ver no adversário um irmão, ter um sorriso na boca. Isso não cola mais, isso é palhaçada. Hoje, o que vale é a esperteza, o “jeitinho”, a engambelação. O resto é frescura...
Logo um sussurro se alastrou rapidamente. Vozes cada vez mais fortes se juntaram em desaprovação e uma atordoadora vaia fez calar o desabrido torcedor.
E, então, ouviram-se palmas. Um estrepitoso bater de palmas dirigido ao Mestre que se afastava do local, à frente de seu grupo. As dezenas de torcedores que, ainda, permaneciam no recinto, ovacionavam e cumprimentavam o Mestre ao vê-lo passar. Polícias, muitos com as armas nas mãos, faziam um sinal de positivo com o polegar erguido.
Um casal que se afastava lentamente, ia trocando impressões sobre o acontecido e, um deles, comentava não ter, agora, mais dúvida sobre a força da palavra – “na verdade, a palavra tem mais força que a própria força. O episódio trouxe-me à memória um poema que li e que dizia: os canhões não podem derrotar a ideia”.
(MEDALHA DE OURO EM CONTO NO JÚRI CIVIL)
FASHION? E POR QUE NÃO MODA?
Quero abordar um assunto que está sempre na consideração das gentes –– a moda. Porque moda é moda e todos gostam de andar na moda.
Mas, interessante, não vejo quase o termo “moda” indicando essa faceta tão referenciada por muitos. O que encontro estampada nos órgãos de comunicação social, nas vitrinas das lojas, nas faixas celebrando o desfile de modelos, é a palavra “fashion”.
Se vou falar em moda, não devo entrar em considerações de ordem linguística. Apenas, para esclarecer, quero avivar que o “portinglês” (palavra que usei nos idos da década de oitenta) está mais forte, mais presente do que nunca. Incompreensível numa pátria em que sua lingua é premiada com um Nobel e que, nessa mesma língua, foi escrito que a “língua é a nossa Pátria”. Não vou adiante, porque o tema é a moda e na moda vou me fixar.
Andar na moda é a ambição máxima da maioria e o andar na moda, hoje em dia, não tem a ver só com a roupagem que se veste. Vai além, muito além. Atinge a cabeça, o rosto, os seios, o “traseiro”, o calçado, “et reliqua”.
A moda! Que grande tirania para as “massas”. Mas dessa tirania ninguém retruca, ninguém esperneia. Ao contrário, enfuna as velas, põe-se a favor do vento e em clangores vibrantes, rende-se à “ditadura” da moda. E, então, correm na ansiada busca do produto da moda.
Há assim, uma verdadeira mutilação do normal. O “normal”, de que falo, é o indivíduo reger-se por normas próprias, adequadas ao seu estilo de vida, à sua maneira de ser, ao modo de pensar e de olhar o mundo. Quero dizer que, no tocante à moda (que agora, infelizmente, não é mais moda, e sim, “fashion”) a regra é vestir-se e calçar-se e pentear-se e adornar-se, segundo as suas conveniências e gostos pessoais. Teríamos, então, no que tange à moda, uma sociedade de rostos de homens, de mulheres, de crianças, de jovens, de velhos, vivendo adequadamente segundo a idade, o sexo, o porte físico.
Diante desse insopitado desejo de referenciar a moda, uma questão aflora: por que tal acontece? Será a força do propagandismo, da publicidade exacerbada? Afinal, sempre existiu a moda. Sim, é verdade. Mas, essa moda, praticamente, se restringia às roupagens, numa palavra, à maneira de vestir.
Agora, como disse atrás, há modas que afetam os outros aspetos do ser humano. Chegou-se à conclusão que o indivíduo não é notado apenas pelos trajes que exibe. O rosto que ri, e chora pode ter e tem um grande poder de atração. É por ele – quase sempre – que tudo começa, em se tratando de relacionamento amoroso. Então, nada melhor que aformoseá-lo para atrair o olhar de outrem. E hoje, com a cirurgia estética, trabalhada por mãos hábeis de mestres especialistas, não é difícil alcançar o pretendido –– um rosto belo, renovado e atraente. Hoje é possível transformar, com facilidade e rapidez uma face caveirosa em um rosto de Vênus. Os cirurgiões-esteticistas estão mudando as feições das pessoas (pena é que não possam mudar, também, os sentimentos e os valores morais).
Mas no rosto, há boca. E na boca, dentes, E temos, então, outra moda. Moda exclusiva de adolescentes e jovens, não ideada por eles que – pela idade e pela cultura – não a adotariam. Trata-se dos dentes tachados pelos aparelhos ortodônticos. Os jovens que sempre se sobressaíram pelos seus sorrisos alvares, agora irradiam sorrisos alvinegros. É uma febre que leva os pais a contratar os serviços profissionais de um ortodontista para colocar um dentinho ligeiramente encavalitado no outro, no alinhamento da arcada dentária. Os ortodontistas agradecem, embolsam bom dinheiro e não desestimulam os pais, da idéia. É sabido que os protesistas ao confeccionar uma peça protética (dentadura, ponte fixa ou móvel), procuram simular os dentes naturais, desviando-os, levemente, do alinhamento da arcada ou dando-lhes uma tonalidade tal que os façam parecer naturais.
E há, ainda, na cabeça, um ponto a ser considerado –– os cabelos. Quem não sabe que os cabelos são um enfeite. Um careca não gosta de se ver sem pelo. Logo sai à procura de quem lhe possa ataviar a cabeça. Vai procurar um peruqueiro ou um cirurgião-plástico.
Os cabelos têm, também, a sua moda. Homens e mulheres apresentam-se em público com fantasiosas cabeleiras. Há até, uma inversão nos padrões tradicionais –– homens guedelhudos, mulheres de cabelos curtos. Mesmo que não haja muitos guedelhudos há, contudo, muita barba na cara. E por quê? Porque a moda, agora, é ser barbaçudo. O que antes era considerado desleixo agora passou a ser chique, elegante, coisa de gente apurada. É a moda.
Voltando aos cabelos é de salientar a variada coleção de cortes apresentados, notadamente por praticantes do esporte, com ênfase para os jogadores de futebol. Há de tudo nessas cabeças, tão orgulhosamente expostas aos olhares públicos. Alguns figurinos são tão artísticos que deixam seus portadores mais em evidência pela cabeleira do que pelo trato com a bola. Mas por que tanto empenho em enfeitar a cabeça? Claro, se não há nada ou quase nada a mostrar por dentro, pelo menos mostra-se que se tem alguma coisa por fora. Quem não conhece a trova de Laurindo Rabelo: “cabeça, triste é dizê-lo / cabeça, que desconsolo / por fora não tem cabelo / por dentro não tem miolo”. Pois, no caso dos jogadores, por fora há cabelo e um cabelo artisticamente traçado. Mas, na maioria dos casos, por dentro resta muito pouco.
Mais abaixo –– os seios
Os seios assumem relevância especial no naipe feminino. As mulheres querem seios imensos, redondos, empinados. O médico esteticista faz-lhes a vontade e enche-os de colágeno. Sendo assim, os homens não mais apertam seios, mas verdadeiras “melancias”, recheadas de colágeno e botox.
E, agora, a moda chegou ali, ao lugar onde as costas mudam de nome. Já há disputas para saber quem tem as melhores nádegas (que agora, não sei porquê, virou “bumbum”). E aí entra em ação, mais uma vez, o botox e o colágeno. Tudo para dar as mais atraentes e mais sensuais curvas e arredondamentos.
Ora, o ser humano, como qualquer moeda ou página de livro possui, também, um rosto e um verso, subentendido, a frente e a parte de trás.
Sendo assim, quando há um concurso de misses, os jurados, para bem julgar, são obrigados a observar –– e bem observar –– o rosto e o verso. Se a candidata escolhida o for pelo rosto e pelo verso, dilacera-me uma dúvida: pelo rosto, certamente, ganhará dinheiro, títulos, carros, viagens, promessas de emprego, propostas de casamento, “et reliqua”. Mas, e pelo verso? Se os jurados a aclamaram, também, pelo verso, será que a vencedora receberá um convite para fazer parte de uma Academia de Letras?
Andar na moda é pertencer a um rebanho. É ser “rebanho”. O rebanho anda sempre junto e todos se comportam de igual modo. Às vezes, se um de seus elementos –– por desconhecida razão –– envereda por uma qualquer azinhaga, todos o seguem e, logo, todos se juntam. No rebanho não há um “condutor”. O condutor está sempre fora do conjunto.
O andar na moda é o retrato fidedigno da natureza medíocre do rebanho. O “rebanho”, aqui, é a massa humana que aceita, passivamente, o que um indivíduo (homem ou mulher) idealiza e materializa, lançando, após, seu “produto” no vasto mercado mundial. Há, acaso, algum sentido nesse tipo de comportamento? Um pacóvio, um badameco qualquer diz que eu tenho de andar com calças desbotadas ou esfarrapadas e eu baixo a cerviz e aceito. Não. Eu sei como tenho de me vestir. Eu visto-me à minha moda. Sou eu que a dito e não o tal palerma. Ou se uma determinada senhora alvitrar que as mulheres têm de andar com a saia arrastando pelo chão, como se fora uma caudatária de Mafoma; ou se, pelo contrário, a tem de usar tão curta que permita a visualização da peça íntima, logo abaixo, a mulher se segue essa voz e passa a vestir-se segundo ela, então, temos uma mulher sujeita, abdicando de seu direito a vestir-se conforme seu gosto. Portanto, podemos afirmar que o homem ou a mulher não têm gosto ao vestir-se; não têm gosto ao pentear-se; não têm gosto nos adereços que usa. Perde o seu caráter, a sua individualidade e deixa-se conduzir pelos ditames de alguém que não conhece. Entra assim, homem ou mulher, no “rebanho”. E o “rebanho” não tem voz, não tem vontade. Apetece-lhe, apenas, seguir o “pastor”, à distância.
Então, tem cabimento um “quidam” qualquer mandar um noivo para o altar, todo enfarpelado, terno e gravata e com tênis ou mesmo chinelo de dedo, nos pés. Aquele que aceitar a fórmula vale menos que o tal “quidam”. É um ser degradado. Um aviltado que não tem sobranceria, que verga a espinha a qualquer embusteiro.
(MEDALHA DE OURO EM CRÔNICA NO JÚRI CIVIL)
OS VENDILHÕES DO TEMPLO –– VERSÃO 2008
Ano da graça de dois mil e oito,
Jesus, o Mestre, entra na cidade.
Vai à frente de um grupo unido e afoito.
Ao ver um Banco com a porta aberta
Fala Jesus a Judas, em verdade,
De todos o mais hábil tesoureiro:
“Alguns de vós, já sente fome e sede
Mesmo o cansaço igualmente aperta
Neste caminhar duro o dia inteiro.
Eu os quero fiéis, não sofredores.”
Todos param, Jesus a Judas pede:
“Vai, pois, Judas ao banco e traz dinheiro.
Pede as contas e vê que não demores
E vem ao nosso encontro aqui na rua.”
Judas algo vê que o olhar desperta,
Após cruzar salões e corredores.
Na caminhada para a caixa certa.
Numa parede branca, lisa e nua,
Um negro crucifixo esmaltado
Paira no alto, só e abandonado.
Perante a cena de rudeza crua
Magoado e triste, Judas, desgostoso,
Num canto escuro, clama desolado:
Oh! Cristo amoroso
No lenho pregado
Que fazes, bondoso,
Olhando curioso
A gente a teu lado!
Que estranho recanto
Te deram a morar!
Não mostres espanto
Pois, Jesus a tanto
O homem pode chegar.
Sabes Tu, acaso,
Onde estás? Pois crê.
Sobre um muro raso
Em que nem um vaso
Com flores se vê.
Habitas um banco
(Casa do dinheiro)
Quem Te pôs no branco
Muro desse banco
Foi um mau banqueiro.
Não foi por respeito,
Por amor ou fé.
Pois ele a despeito
De todo o conceito
Bom cristão não é.
Ele explora os pobres
Empregados seus.
Mas quer que lhes dobre
Ou até tresdobres
O capital. És Deus...
Por trinta dinheiros
Venderam Jesus.
Pois hoje os banqueiros
Por alguns milheiros
O dariam à cruz.
É um ato perjuro
Pôr Cristo num banco
A par do impuro
Capital e juro
Do negócio franco.
Cristo –– o Nazareno
Quer ser morador
De um templo sereno,
Humilde e pleno
De Fé e de Amor.
Sai do Banco e vai em busca do Mestre,
Sem dinheiro mas com palavras prontas:
“Não retirei dinheiro nem extrato,
Rabino, não quero saber de contas...
Quero, sim, que seu braço forte adestre
E dê a esse braço o melhor trato
Para ensinar muitas cabeças tontas.”
E, então, narra tudo o que viu lá dentro
Na parede a cruz, nos caixas do Banco
A dança febril e o negócio franco
Tendo o dinheiro como polo e centro.
O Mestre escuta tudo, calmo e atento.
À porta um segurança, olhar calhorda
Vê Jesus que avança em compasso lento.
Agarra num canto um troço de corda
E entra firme no interior do Banco.
Ao ver aquele homem, a fronte erguida,
Envolto o corpo inteiro em rubro manto,
Todos O fitam, toda a gente cala.
Os rostos todos mostram ares de espanto
E uma tensão nervosa mas contida.
Jesus, então, eleva a voz e fala
E ao falar, tempos de outrora, evoca:
“Esta casa não faz senão comércio
Aqui se compra, aqui se vende e troca.
Mandava noutras eras o sestércio,
Mesmo valendo menos que o denário.
O dólar, hoje, não nos sai da boca,
Entanto, tê-lo em mão é temerário.
Se o dinheiro é o deus aqui na casa
Não faz, então, sentido aquela cruz.
Arrancai da parede branca e rasa
Esse lenho que é a imagem de Jesus”.
A multidão inteira ouve aturdida
Jamais alguém falou tão decidida.
Magnânimo, na mão sustendo a corda
Jesus, de pé, aguarda. De repente,
Do meio daquela atontada horda
Um homem se apresenta –– era o gerente.
Determinado sobe a um escadote
E da nua parede rasa e branca
A cruz num apressado golpe arranca
Atirando-a nos braços de um velhote.
E tudo serenou dentro do Banco.
A força não usou como no Templo
Mas tão-só a palavra como exemplo.
Saiu à rua sempre alegre e franco.
Palmas. “Muito bem”. Ouve-se uma voz.
Em meio à turba, soberano e firme,
Jesus lembra o que dissera aos fariseus:
“Dai a César o que é de César e a Deus
O que é de Deus... digo isto a todos vós
Que me escutais aqui, antes de ir-me.
Porquanto esta casa é do dinheiro,
Minha Casa é uma Casa de oração.
É lá que deve erguer-se, sobranceiro,
O lenho da Cruz –– a Cruz da salvação”.
Em pouco tempo a multidão se some.
Jesus e mais os seus estão na estrada,
E há muito sem comer já sentem fome,
Mas não há nada à volta nem dinheiro.
O grupo segue na manhã que avança
E logo brota alegre gargalhada.
Todos os olhos vão para o tesoureiro
Que de cantar bem alto não se cansa.
“Judas! Judas!” Grita um. “Que fiasco!
Agora, sem cartão, dinheiro ou cheque
Não se pode comer um bom churrasco
E nem comer sequer um simples queque”.
Faz calor... mas seguem estrada fora.
A fome aperta. Bem perto um olival
Convida a descansar em fresca sombra.
Ali ninguém habita, ninguém mora.
Caminham lado a lado a um parreiral
Sobre uma macia e suave alfombra.
Sentam-se todos. Logo, Jesus manda:
“Vai, João, a qualquer uma oliveira
E traz uma azeitona –– uma somente,
Vai, meu filho, mas sem demora, anda...
Em seguida, de uma qualquer videira
(E para que não obres diferente),
Apanha um cacho de uvas –– um, apenas,
Com bagas grandes ou bagas pequenas”.
Com os dois frutos na concha da mão,
Levanta os olhos, faz o sinal da cruz,
Murmura, envolto em fé, breve oração.
Logo um clamor de espanto colossal
Brota do grupo e corta o olival.
Numa inopinada onda de emoção,
Há vivas, há palmas, uma alegria
Viva nos rostos todos se traduz.
Como num passe de pura magia
Surgem uvas e azeitonas, em porção.
Ante a esfaimada horda diz Jesus:
“Comei todos e saciai a fome...
Lembrai-vos que amanhã é outro dia
E se houver sobra amanhã se come”.
De novo em marcha vai João à frente,
No meio está Jesus, mais atrás Mateus.
“Cantemos”, diz o Mestre, sorridente,
“A glória de Deus Pai que está nos céus”.
E aos discípulos não cansava de ensinar:
“Sempre que pedirdes qualquer coisa a Deus
É assim que haveis todos de rezar:
“Pai nosso que estais nos céus...”
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
O SORRISO DA NATUREZA
Olha o azul do infinito
E o azul-turquesa dos mares!
Olha o verde da campina
E o colorido bonito
Dos jardins e dos pomares!
Olha a fonte borbulhante
D'água pura e cristalina
A correr de monte a monte!
Olha o encanto da floresta
Com seus brados e rumores!
Olha as aves multicores
Nos seus voos e gorjeios
Numa alegria de festa!
Olha a lua, a branca lua
A tingir de prata os seios
Da moça a banhar-se nua!
Olha a beleza e a fragrância
Do lírio da cor da neve
Tremulando à brisa leve
E a recender à distância!
Olha o frescor e a pureza
Dos campos e pinheirais
E neles a singular reza
Que é o pipilar dos pardais!
E o sol rubro no poente
Caindo no azul do mar
Muito, muito lentamente.
Visão de encanto e magia
Não é noite, não é dia
É cena que faz sonhar!
Tela imensa de riqueza
Divina tela florida
Em que a alegre natureza
Tem mais graça, tem mais vida.
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE OURO EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
MINIBIOGRAFIA:
Aldo Nora é o pseudônimo literário do professor Alfredo Nogueira Ferreira, que exerceu o magistério na Universidade Federal de Pelotas (UFPEL) durante quase quarenta anos. Tem premiações vencedoras em torneios literários de poesia, conto e crônica em diversos estados brasileiros e em Portugal.
É membro correspondente da Academia de Letras de Teófilo Otoni e colabora, até hoje, no Diário Popular da cidade de Pelotas, o jornal mais antigo do Rio Grande do Sul. Reside atualmente em Florianópolis.
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ANAIR WEIRICH CORÁ - ANAIR WEIRICH (CHAPECÓ - SC)
LOUVOR
Meus momentos com o Altíssimo
são de extremo regozijo...
De inenarrável enlevo!
Penso, sinto e vivo sua essência...
Quando como, quando penso,
quando escrevo!!!...
(MEDALHA DE BRONZE EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
PRESTAÇÃO DE CONTAS
NO MEU SONHO
UM VENTO FORTE SOPRAVA
E A NATUREZA TODA DANÇAVA!
ERA TÃO FORTE ESSE VENTO
QUE FAZIA DE TUDO UM LAMENTO,
TANTO VENTAVA E ASSOVIAVA!
SUA MÚSICA SOPRAVA
E ATIÇAVA O PENSAMENTO.
E UMA CHUVA DE FORÇA TAL
FUSTIGAVA O MUNDO EXTERIOR,
MOSTRANDO UM PULSO ATEMPORAL
QUE APONTAVA COM SUA DESTRA
A MÃO MESTRA DO CRIADOR!
MOMENTO DE ORAÇÃO
NOITE LACRADA
EM PROFUNDO SILÊNCIO...
A LABUTA DO DIA FINDOU!
ACONCHEGADA EM MEU LEITO,
NA CLAUSURA DO VERSO,
COM "ELE" CONVERSO
EM MOMENTO PERFEITO
DE PAZ E DE AMOR:
... AGORA NÓS, SENHOR!
(MEDALHA DE PRATA EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
ORAÇÃO DOS FILHOS AO PAI
BOM DIA, LUZ DO MUNDO!
PAI DO SILENCIO QUE CANTA!
DA MELODIA QUE EMBALA,
DOS HINOS QUE ENTOAM
NO SINO QUE BADALA.
LOUVORES PARA TI, PAI!
PALMAS E VIVAS AO TEU REINO
DE GLÓRIAS INFINDAS!
DE IDAS E VINDAS
A ATENDER OS TEUS FILHOS.
MIL LOUVORES A TI, CRIADOR
DA LUZ E DO AMOR,
DO CÉU COM SEUS BRILHOS.
(MEDALHA DE OURO EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
MINIBIOGRAFIA:
Anair Weirich é de Chapecó (SC) e vive de seus livros desde 1996. Dá palestras sobre poesia em escolas, feiras de livros e eventos, além de visitar livrarias e empresas. Pertence a diversas entidades culturais e foi presidente por duas vezes da Associação Chapecoense de Escritores. Viaja por todo o sul do país e algumas vezes por ano a SP também.
O melhor meio de saber sobre seu trabalho é chamar seu nome no Google e para vê-la recitar, chamar seu nome entre aspas no Youtube, clicando na poesia que quer ouvir.
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ANDRADE JORGE (CAMPINAS - SP)
SERTANEJO
Sertanejo, Sertanejo!
da terra seca fez sua habitação,
a procura do alimento
pra mulher e rebentos,
respirando a poeira do alto sertão.
Olha a plantação,
sem arado, sem regado!
É a raça, é a luta,
Eta vida bruta!
nesse sol que queima o tempo,
seca o chão e mata a fruta.
Sertanejo, Sertanejo!
mais um dia sem farinha, nem feijão,
outubro se passou,
e a chuva de Caju não molhou.
É a raça, é a luta
eta vida bruta!
No sol que queima o tempo,
seca o chão e mata a fruta.
Sertanejo, Sertanejo!
sem arado, sem saber,
o caminho é penoso
na mão do poderoso,
olha a plantação que se queima,
e não dá não!
mais um dia sem farinha, nem feijão.
......................................................... (fala Sertanejo!)
____ Latifundiário aonde tá ocê?
Dezembro já passou,
cadê a água de Santa Luzia?
Que me alembro não pingou ...
O peito aperta, a barriga berra
é a fome, é a fome!
é a fome "seu home"!!
___ Latifundiário, aonde tá ocê?
é março já se indo
e as agueira de São José
no meu plantio não feiz fé!
Eta vida bruta do sertão!
o sor queimou meu tempo
secou o chão, matou a fruta.
___ Cadê minha plantação?
cadê a minha luta?
cadê o Dotô da promessa
que espero e vem não?
O peito aperta
a barriga berra
é a fome, é a fome!
é a fome "seu home"!!
MÃES DA ESPERANÇA
O manto da noite
que envolve a humanidade,
envolve a sentida saudade,
que bate forte feito açoite.
Na onda do vento
a esperança flutua livre desse chão,
vozes ecoam: essa espera não será em vão!
A esperança é o doce alento.
Mas a mãe aflita, contrita,
desafia o infortúnio e a sorte,
a força da fé é mais forte,
e silencia a dor que por dentro grita.
Mães da espera, súplica sem revolta,
Mães das rezas ao pé da Cruz
Mães que buscam na Divina Luz
a luz que conduza ao caminho da volta
Nas escadarias da Sé esperam a hora certa,
o tempo que passa,
e na espera da graça
ao filho uma porta da casa sempre aberta.
Dedicada às mães da Sé, que mantém a esperança do reencontro com o filho perdido no mundo.
PENSOU EM MIM?
Pensou em mim? Essa era a pergunta preferida que Lilica fazia ao seu namorado quando se encontravam. Ele respondia laconicamente: “Pensei”. Mas ela insistia:
___ Pensou bastantinho ou bastantão? Ele repetia a mesma resposta: “Pensei”.
Lilica que na verdade chamava-se Eliana era uma moça bonita, simpática, romântica, sonhadora, vivacidade estampada no semblante, e dona de um sorriso encantador. Ela conquistava todos que a conheciam porque era também muito prestativa, sempre solicita daquele tipo “pau pra toda obra”. Com todos esses predicados e dons inatos, buscou um curso onde se identificasse com a profissão, assim foi fazer Serviço Social.
Seu namorado era o Carlos Henrique, que Lilica chamava carinhosamente de Cacá. Ele era oposto de Lilica, metódico, reservado, detalhista e seu negócio eram as ciências exatas, calcular era com ele mesmo. Adorava matemática e física e seu desejo era ser um cientista físico, para trabalhar em projetos espaciais. E estava estudando muito pra isso.
Quem conhecia bem Lilica e Carlos Henrique ficava se perguntando: Como pode dar certo esse namoro? Pois é, o amor tem dessas coisas, juntarem opostos. Mas na realidade os dois se davam muito bem, porque Lilica apimentava um pouco a vida dele, e ele colocava um pouco de razão na vida dela, que era de muita, mas muita emoção.
Mas havia uma coisa que incomodava Carlos Henrique, quando Lilica o encontrava e vinha com aquela pergunta: “Pensou em mim?” E depois: bastantinho ou bastantão? Tinha vezes que ele perdia um pouco a paciência e respondia:
___ Pensei, oras! Sei lá se foi bastante ou pouco, sei que pensei!
Lilica ficava toda chorosa e dizia:
___ Poxa amor, não precisa falar assim, só queria saber se pensou em mim.
E assim viviam os dois, mas ninguém duvidava que fossem completamente apaixonados.
No terceiro aniversário de namoro deles, combinaram que iriam jantar num restaurante chique e depois pra fechar a noite com chave de ouro (nesse caso era para abrir a noite) um luxuoso motel, afinal mereciam. E assim aconteceu.
O jantar foi maravilhoso, com direito a um concerto exclusivo de violino, champagne francesa, flores e tudo mais. Saíram e foram para o Motel, que inclusive já haviam reservado. Estavam felicíssimos ao entrarem na suíte especial. Realmente a suíte era luxuosa, tudo de bom. Ligaram o som, música romântica, começaram dançar apaixonadamente, rosto colado, corpo igualmente, foi aí que Lilica toda amorosa fez a famosa pergunta:
___ Amor você pensou em mim hoje?
Carlos Henrique parou de dançar, olhou longamente para sua amada e delicadamente pediu pra ela sentar na cama, e falou
___ Ah! Minha querida vou te explicar direitinho o quanto penso em você. Li, o dia tem vinte e quatro horas e eu penso em você uma vez cada hora, portanto são vinte e quatro pensamentos. Você ta acompanhando o raciocínio? Então, cada vez que penso em você fico pensando por uns dez minutos, logo num dia penso em você catorze mil e quatrocentos segundos, ou seja, duzentos e quarenta minutos que transformados em hora teremos quatro horas. Isto significa minha querida, que num universo de vinte e quatro horas, penso em você 16% do dia. Entendeu?
Lilica balançou a cabeça dizendo que sim, estava estupefata com a exposição de Carlos Henrique. E ele ainda emendou:
___ Ta vendo como penso em você pra caramba! Lilica saindo do semitranse falou exultante:
___ Poxa amor! Você foi fundo! Mas gostei viu, agora sei o quanto você pensa em mim.
Abraçaram-se carinhosamente e o amor, desejo, paixão, excitação, fluíram e beijos cada vez mais ardentes foram sucedendo-se, e os corpos se entrelaçando. Até que Carlos Henrique, todo apaixonado, sussurrou no ouvido da amada:
___ Li o quanto você me ama? Ela respondeu de imediato:
___ Meu amor te amo mais que a distância da terra à lua, só que elevada ao cubo.
Carlos Henrique deu um longo suspiro e voltaram a se beijar novamente. Os dois já estavam chegando ao ápice, no êxtase total, no momento supremo, ela gemia de prazer e ele soltava uns “ahh!”, “ééé”, “hummm”. Lilica notou que a desempenho de Cacá estava diferente, explica-se, diferente para melhor, muito melhor, seu amado estava simplesmente levando-a as nuvens como nunca houvera feito antes, não que as anteriores tivessem sido ruins, mas essa estava acima da expectativa. Como diria um personagem de novela: estava “felomenal”. Até que ela numa entrega total gritou:
___ Agoraaaa, agoraaaa, agora amor... E ele respondeu: Simmm!, Ahhhh! E com a voz embargada de paixão disse:
___ Amor, a distância é de 56 quatrilhões, 800 trilhões, 235 milhões de quilômetros entre a terra e a lua, elevada ao cubo. Agora sei o quanto você me ama. E a beijou ternamente.
Lilica depois de se recuperar totalmente disse toda apaixonada
___ Nossa amor foi demais! O que você falou sobre quatrilhões, trilhões...?
___ Ah querida! Cheguei ao resultado da questão que você me falou sobre a distância entre a terra e a lua só que elevado ao cubo, e disse que agora sei o quanto você me ama.
___ Amor você já sabia esse resultado?
___ Não sabia. Calculei enquanto a gente fazia amor gostoso...
Depois daquele dia os amigos de Lilica estranharam o fato dela sempre estar lendo livros de física, matemática, e quando perguntada respondia:
___ Nunca se sabe quando iremos precisar de uns exercícios... as ciências exatas auxiliam em tudo, em tudo mesmo, pode crer!
E saía com aquele brilho no olhar.
FIM
(MEDALHA DE PRATA EM CONTO NO JÚRI CIVIL)
A “OREIA” DO XICO PAULISTA
Chegou a noite tão esperada lá pelas bandas do Arraial de Santo Antão. Até chegar esse dia, a lida fora dura o mês inteiro naquelas terras secas e áridas. A busca de água para os animais, a plantação e corte de palma para o sustento dos bichos e muitas vezes das próprias famílias, também era um trabalho incessante. Mas naquela noite a tristeza não foi convidada, era noite de música, forró arretado.
O pessoal foi chegando ao barracão de chão batido. Num canto um improvisado balcão servia de bar, onde a cachaça descia rápida. As mulheres formavam rodinhas de um lado, os homens de outro. Elas conversavam mais timidamente, riam comedidamente, por vezes lançavam olhares furtivos em direção à roda dos homens. No meio das moças estava Lindaura, morena bonita. Os homens conversavam desbragadamente, falavam alto, até mesmo para chamar atenção das moçoilas.
E regado à cachaça, tudo que era assunto ia sendo discutido. Entre eles havia um novato, o Xico Paulista, nascido no interior de São Paulo.
O papo rolava, quando um trotear de cavalo anunciou a chegada de Didi da Porteira, tinha esse apelido porque gostava de ficar trepado nas porteiras da fazenda quando era moleque. Didi entrou no barracão, cruzado no peito o talabarte que sustentava a espingarda lazarina, que ele se orgulhava em dizer que fora presente de Lampião ao seu falecido pai.
Didi colocava sua “namorada", como ele chamava sua espingarda, pendurada na parede e ai daquele que colocasse a mão na sua joia. Depois ia cumprimentar os amigos e tomar seu gole da “marvada”. A conversa se alongava animadamente, quando alguém falou sobre as peripécias de Lampião no tempo de cangaço, talvez motivado pela chegada de Didi com sua espingarda, supostamente presente do cangaceiro. E Zé Bode disse:
- Lampião ainda vadeia por esse sertão de meu Deus fazendo das suas!
- Verdade memo cumpadre! Ouvi dizê que ele apareceu numa festança por aí, concordou Anastácio.
Xico Paulista ali ouvindo a conversa, se coçava, se remoía, até que não se conteve mais.
- Tudo bestera! Tudo ignorânça desse povo, Lampião tá morto e bem mortinho, e quem tá morto não aparece não. Já foi, já era.
Discordando do Xico Paulista, Zé Bento se intrometeu na conversa:
- Tu não é nordestino, ô cabra, e não pode dizê isso não, proque não conhece as coisas da nossa terra, as coisas do sertão! E Anastácio emendou:
- Ô xente! Ta chamando nóis de mentiroso, tá? Ta mangando de nóis, tá?
Xico Paulista já ia retrucar, não fosse os músicos começarem a tocar, e começaram justamente pra terminar aquela pendenga. E a música encheu o barracão.
Os músicos formavam um quarteto: Zé Lino no pandeiro, Zé Mica na zabumba, Dentinho no triângulo e Quincas na sanfona.
O chão do terreiro se agitou com o forró. Os homens foram escolhendo suas damas e vice-versa. E lá estava Lindaura, longos cabelos negros, vestido rendado, largo sorriso. Diziam que ela era tataraneta de Lampião, mas ninguém sabia se era fato verídico. Lindaura era moça manhosa, mas trabalhadeira, não tinha namorado porque não queria, e não queria porque gostava de viver livre, pretendentes não lhe faltava.
O forró seguia alegre, o suor descia, a poeira levantava. Lá pelas tantas os músicos atacaram de xaxado. Imediatamente Lindaura segurou nas pontas de sua saia rendada, colocou a mão na cintura, dando aquele ar de sensualidade, seus pés começaram a desenhar no chão batido os passos do xaxado. Ela ria, volteava, os pés deslizavam com aquele chiado característico da dança. Homens e mulheres fizeram um círculo em torno dela. Para os homens era uma visão imperdível, colírio para os olhos. E ela rodava o terreiro no embalo do xaxado, e suas belas coxas, por ora, ficavam expostas à vista daqueles peões sedentos. Os olhos daqueles homens pareciam que iam saltar, a moça estava sendo devorada com aqueles olhares. E Lindaura rodava no xaxado.
Até que Xico Paulista não aguentando mais ver aquele corpo trigueiro deslizando à sua frente, ousadamente correu a mão nas coxas da bela morena. Lindaura parou de dançar. Anunciava-se encrenca e das grossas. Estancou no meio do terreiro, a faceirice, a brejeirice, desapareceram da face da moça, tomou lugar uma expressão feroz, dura. Lançou um olhar frio, sinistro, aterrorizante em direção a Xico Paulista, o cabra que tinha passado dos limites. Xico, porém não se intimidou com aquele olhar, pois era tido como homem valente, segundo contam chegou fugido de São Paulo, jurado de morte, por haver feito muitas estripulias por lá. E foi dizendo:
- O que que há moça, num gosta de cabra macho não?
Não deu tempo de nenhum homem presente tomar qualquer atitude contra o abusado. Lindaura, olhar esbugalhado, girou a cabeça como a procurar alguma coisa e ágil feito uma gazela correndo nos campos, passou a mão na espingarda lazarina, a espingarda de Didi da Porteira, que estava pendurada na parede. Apontou na direção do Xico e disparou. Pum! Esfumaçou o barracão. Ouviu-se um berro aterrorizado do cabra abusado, a fumaça foi dissipando e o povo viu o estrago, o tiro arrancou um pedaço da orelha do safado. E Lindaura ali parada no centro do terreiro, com o mesmo olhar de antes, falou pro desafeto:
- “Não lhe matei proque hoje tô muito feliz visse? E proque quero que vosmecê se alembre desse dia pro resto dessa sua vida sem valor. Vai aprender cabra da peste, fio de rapariga, que não se bole onde não se pode bulir, proque macho que se assanha sem respeito pra cima de meu sangue, merece ponta de faca que tiro é pouco”.
Quem estava lá, jura de pé junto que a voz de Lindaura se modificou ao dizer essas palavras, ficou grossa, seca. E após proferir esta sentença, Lindaura levantou a mão e acenou para os músicos tocarem. Estes imediatamente atenderam, e o xaxado reiniciou e ela saiu rodopiando e cantando:
- “É lampa, é lampa, é lampa, é lampa, é lampião, pro amigo faço tudo, do inimigo não tenho dó não...”
A poeira levantava. A moça dançava ainda segurando a espingarda. Didi já estava impaciente, pois sua “namorada” estava bailando na mão de Lindaura. Foi quando a morena parou à sua frente e falando com aquela voz estranha:
-“Se avexe não seu moço, essa espingarda conheço bem, nas cuspidas dessa lazarina muitos volantes safados tombô e muito Coroné dito valente foi pros quinto do inferno. Oia bem, cada risco no cano, um que se escafedeu, e cuida que tem pra mais de cem risco. Guarde bem proque Zé Baiano, vosso falecido pai, mereceu o presente”.
Entregou a espingarda e saiu rodopiando. Didi da Porteira ficou ali parado, boquiaberto. De repente ela caiu no meio do terreiro desmaiada. Socorrida, acordou assustada com aquela gentarada olhando pra sua cara.
- Vixe minha Nossa Senhora! O que tô fazendo deitada aqui?
O Veio Nhô que estava quietinho no seu canto, cachimbando seu cachimbo de barro, assistindo a tudo, se aproximou e apressou em responder:
___ Ô xente! Se avexe não menina! Foi Lampião, o tinhoso, que alumiou o terreiro, pra modo de ensinar o cabra safado a respeitá nossas mulê.
Lá fora. Xico Paulista gemia num canto, sem um pedaço de orelha, e dizia com seus botões
- Ainda bem que a moça é ruim de mira...
Depois disso, O Xico Paulista sumiu do lugar, ninguém mais viu o abusado por aquelas bandas.
O tempo passou.
Numa pequena cidade do norte de Minas Gerais, já noitinha, numa animada roda de prosa, tinha um sujeito que se destacava contando seus “causos” era um tal Francisco. E um dos ouvintes perguntou:
- O amigo me descurpe, mas que aconteceu com vossa oreia, que tá fartando um pedaço?
Francisco respondeu sem pestanejar:
- Olhe, isso foi obra de um bando de jagunço, quando fui defender a honra de uma moça que estava sendo atacada lá pelas bandas do nordeste. Um dos jagunços amirô na minha cabeça e atirô, se não sou esperto morria ali, o tiro pegou na minha oreia, mas arranquei a arma do cabra e botei todo mundo pra correr.
Terminada a explicação do caso, assim do nada Francisco sentiu um tremendo chute no traseiro, que o jogou no meio da roda, caindo de bunda no chão. E alguém perguntou:
- O que foi amigo? Ninguém lhe encostou, como foi parar de bunda no chão, sô?
Francisco levantou-se sem graça e disse:
- Sei não, a prosa tá boa, mas preciso ir andando, até mais ver.
E saiu ligeiro.
Zé Paraíba, um dos homens da roda, assim que Francisco foi embora, comentou:
- Ó xente! A história desse tal Francisco tá estranha, tá parecendo uma que fiquei sabendo de um cumpadre que mora nas bandas de Santo Antão, no sertão do nordeste. Lá um cabra mexeu com uma morena e ela deu um tiro na oreia do safado. A moça, dizia o povo, tinha sangue de Lampião nas veia, e há quem diga que foi ele que baixô no barracão da festa, e feiz a desgracera. O nome do abusado era Xico Paulista, será que o Xico de lá não é esse tal Francisco daqui? Se não for tem oreia demais nesse “causo”.
FIM
(MENÇÃO HONROSA EM CONTO NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE PRATA EM CONTO NO JÚRI MILITAR)
MINIBIOGRAFIA:
Andrade Jorge é natural de Jundiaí/SP, filho de Benedito e Alice. Membro das entidades: Associazone Culturale Falanthra – Taranto/Itália, UBE/SP- União Brasileira dos Escritores, Associação Profissional dos Poetas e Escritores do Estado Rio de Janeiro – APEERJ, CAPPAZ-Confraria dos Artistas e Poetas pela Paz, Casa dos Poetas da Praia Grande/SP. Acadêmico das Academias: Nacional de Letras do Portal do Poeta Brasileiro, Internacional de Letras, Artes e Ciências – ALPAS-21, Boituvense de Letras e Artes, Saltense de Letras; Títulos Recebidos: Embasciatore di Pace – Entidade: Salotto Culturale “Pelazzo Recupero” – Martina Franca/Itália; Acadêmico Destaque do 2º Semestre/2014 – Academia Nacional de Letras do Portal do Poeta Brasileiro; Cargos: Diretor de Relações Acadêmicas da Academia Saltense de Letras; 1º Secretario do Conselho Municipal de Políticas Culturais de Salto/SP.
Livros publicados: Encanto e Desencanto, Quem é esse ser? e contos, En...cantos&Peripécias.
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ANTÔNIO FRANCISCO CÂNDIDO (CONGONHAL - MG)
SOCORRO!
A natureza grita: socorro!
Estão me matando.
A natureza chora,
Tamanha crueldade.
O homem ignora seu pedido,
Seu pedido de socorro e proteção.
A água já está faltando,
Em muitas cidades, estados, países e no sertão.
Está faltando ao homem civilizado,
Amor, carinho, piedade e visão,
Pois em primeiro lugar fala mais alto a ambição.
Quantos animais morrendo!
E também em extinção?
Acorda homem, ser inteligente,
Antes que tudo termine!
Numa terrível explosão.
Explosão de dor e desespero,
Mundo vazio, Oh Deus!
Inabitável e todos sem direção.
O tempo urge, não tenham dúvidas,
Vamos aquecer os nossos corações.
CRISTO CRUCIFICADO
Os braços abertos,
O madeiro sobre o altar,
Um chamado a conversão.
Uma oração simples e profunda,
A tocar o coração de ateus e cristãos.
O olhar fixo do Mestre,
Na cruz a olhar você,
O sangue por ele derramado,
A coroa de espinhos sobre a cabeça,
Um momento entre o Mestre e seus filhos,
Transmitindo comoção, desapego e transformação.
O ateu que nega o existente,
O pai que acolhe o filho ausente,
A mãe a rezar pelo filho doente,
Tudo começa e termina com o Mestre:
O nascimento, o batismo, a morte e a ressurreição.
DEPRESSÃO
Sozinho no meu quarto a pensar,
No amor que foi embora!
Na criança que de fome chora,
No melhor amigo do homem,
Que muitos dizem ser o cão.
Muitas vezes choro de saudade...
E de tudo que passou,
Da música que marcou,
Quando estava junto de você.
Não sei escrever bonito,
Não sou poeta, doutor, rico,
E muito menos escritor!
Sou uma ave que perdeu seu ninho,
E procura amor, ternura e carinho,
Onde haja um leito para eu deitar,
Uma boca para eu beijar,
Um rosto para eu acariciar.
Sozinho no meu quarto,
Imagino a imensidão do universo,
O quão a vida é interessante,
Crucial, desigual e estonteante,
Pois numa fração de segundos,
Nascemos, vivemos e morremos.
Hoje escrevi esse poema,
Com o coração em dor,
Pois não consigo te esquecer,
E para sempre perdi o seu amor!
Amanhã hei de ser lembrado,
Nem que seja por alguns minutos,
Esse ser diminuto que na vida,
Amou, trabalhou e sofreu,
A pior das dores que existe,
Onde o remédio é um consolo,
Para esse mal que machuca a alma,
E tudo vemos em forma de escuridão:
A doença do século vinte e um,
A terrível e cruel depressão.
FRATERNIDADE
Fraternidade sim,
Violência não.
Nunca levante a espada!
Sobre quem te pediu perdão.
Quem ama a Deus,
É fraterno com o irmão.
Você negaria a quem tem fome,
Um pedaço de pão?
Quanto se pode escrever,
Sobre a palavra fraternidade!
Amor, ternura e doação,
Carinho, respeito e bondade.
Palavra bonita e abrangente,
Seu teor realça longevidade.
Convida todos a serem unidos,
Em prol do irmão, da justiça e da caridade.
Antes tarde do que nunca,
Sempre é tempo de se doar.
Seja fraterno com o mundo,
Você só tem a ganhar.
MINIBIOGRAFIA:
Antônio Francisco Cândido é filho único e órfão de pai e mãe. Nasceu em Pouso Alegre, Minas Gerais, em 1968 e reside em Congonhal, também Minas Gerais. Escreve desde o ano de 2004 e está presente em 32 antologias. É Membro Honorário da ACLAC (Academia Cabista de Letras, Artes e Ciências de Arraial do Cabo), Rio de Janeiro. Membro Honorário da ALEART ( Academia de Letras e Artes da Região dos Lagos), Rio de Janeiro. Membro Correspondente da Academia Internacional de Artes, Letras e Ciências "A Palavra do Século 21 - ALPAS 21, Cruz Alta, Rio Grande do Sul. Membro Titular da Sociedade dos Poetas Mineiros Vivos e Afins, Caxambu, Minas Gerais. Trabalha no Teatro Municipal de Pouso Alegre como auxiliar de serviços. E-mail para contato: candidok1917@gmail.com
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CARLOS ALBERTO DE ASSIS CAVALCANTI (ARCOVERDE - PE)
DOR MAIOR
Padecendo o profético suplício,
pendurado na cruz, lá no Calvário,
Jesus Cristo vivia o ato vicário
do “Cordeiro de Deus” pro sacrifício.
Se não fosse predito desde o início,
nada mais incoerente que o cenário
em que o Justo é julgado temerário
por fazer da justiça um exercício.
Em Jesus, pois, “O Servo Sofredor”,
outra dor lhe doía mais que a dor
dos maus-tratos e açoites recebidos:
era a dor de saber que tanta gente
mantinha o coração indiferente
àquele que morreu pelos perdidos.
(MEDALHA DE OURO EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE PRATA EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
HÓSPEDE DIVINO
Por saberem que o Mestre, lá cruz,
padecera tamanho sofrimento,
seguiam, pela estrada de Emaús,
dois irmãos, em completo desalento.
Nem notam que, com eles, vai Jesus,
se inteirando do assunto do lamento,
no trajeto da estrada que os conduz
à vila, onde ambos têm seu aposento.
Não sabem os discípulos o nome
daquele que com eles o pão come,
até que Ele se dá a conhecer.
Então o desalento se desfaz,
ao coração dos dois retorna a paz,
pois Jesus Cristo a fé faz renascer.
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
A BÍBLIA É A VERDADE
“Santifica-os na VERDADE; a tua PALAVRA é a VERDADE” (João 17:17)
Hoje o mundo se dobra aos vaticínios
dos arautos da mídia consumista,
que arrasta multidões a tantos vícios
no tobogã do pool relativista.
O saber filosófico-hedonista
faz ruir estruturas e princípios
e leva, de roldão, a tantos ímpios
que, cegos, seguem a lei escravagista.
Enquanto assim caminha a humanidade,
o pós-moderno mundo agonizante
de Cristo vai ficando mais distante,
pois, contra a multidão, o mal conspira:
convence que é verdade a vil mentira
e que é mentira a Bíblia, que é a Verdade.
(MEDALHA DE PRATA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
BRILHO MORTAL
Jamais os habitantes de Hiroshima,
naquela manhã quente e ensolarada,
iriam esperar que lá de cima
fosse a morte sobre eles derramada.
Mas a trama mortal estava armada,
uma nova Guernica se dizima,
a cidade-cobaia é enquadrada
no veneno letal que invade o clima.
Dobra-se o mundo em luto e desencanto
ao ver os mortos, sobre o chão nipônico,
imolados no altar das ambições.
Que as lições ensinadas pelo pranto
(alívio que restou do incenso atômico)
faça a paz renascer nos corações.
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
VOX POPULI
“Verás que um filho teu não foge à luta”,
assim desperta a massa em cada esquina,
e se levanta e marcha, resoluta,
liberta a voz refém da vil surdina.
Soa, com destemor, voz matutina,
e aos quatro ventos grita, impoluta,
em combate à quadrilha da propina,
que tira o pão da boca e ao povo enluta.
Mas, das ruas, o povo, encorajado,
transforma seu protesto num cajado
com que combate os lobos de plantão.
E da voz sai o cântico retido:
“Povo unido, jamais será vencido”,
gritam todos em cívico arrastão!
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE OURO EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
POEMA DESENTRANHADO DE UM OLHAR INFANTIL
Não olhe para o horizonte nebuloso
dos homens incertos; há fumaça no ar,
e o crepúsculo se levanta encobrindo o dia
e as vidas plantadas nas valas
(sementes infrutíferas);
minha mãe se foi; e o pai nunca veio;
somos órfãs e pouco importa o amanhã;
não olhe para os lados,
os escombros dão de ombros
sobre o nosso destino;
o que virá adiante?
(que lhes importa se somos menores,
se lhes cegam rancores maiores?);
não olhe para cima, as estrelas brilham
e os deuses talvez estejam a ouvir as ladainhas
dos que cantam a Jeová ou a Alá,
nos seus templos suntuosos,
mas logo esquecem as promessas de paz,
e rangem os dentes contra a gente;
não sei ao certo o que nos espera,
além do abraço que agora nos une;
quem sabe, alguém nos acolha por dó,
ou talvez, como nós, também ande só;
(a guerra é coletiva, mas as sobras são solitárias)!
ÂNGULO DE VISÃO
Uma figura de renome
lítero-grã-fina
olhava a via-láctea
com seu olhar-lunar,
à procura de algo etéreo
que explicasse o mistério
interestelar;
enquanto isso,
uma figura de fome
literalmente fina
olhava a via pública
com seu olhar aéreo,
à procura de algo sólido
que alimentasse o etéreo
introcelular;
e assim, os dois terráqueos
pareciam habitantes
de galáxias diferentes:
um, com fome de saber,
olhava o infinito;
outro, por saber da fome,
olhava sempre aflito;
e os dois, de um só planeta,
nem mesmo de luneta
puderam se olhar,
pois havia entre ambos
os limites espaciais
que separam os humanos
em classes sociais.
FOGO QUE NÃO QUEIMA
Nabucodonosor decreto espalha
e ao povo do seu reino intima urgente:
ou presta culto ao deus ou vira palha,
quem não servir à estátua reluzente.
Em servidão, o povo ao rei canalha
se prostra, genuflexo, obediente,
e logo adora à estátua que enxovalha
a fé de quem a Deus é mui temente.
Então, o rei histérico gargalha
daqueles que confiando fielmente
em Deus, que é provedor, e nunca falha,
não temiam do forno o fogo ardente.
E pela fé, os três vão à batalha,
jogados no porão efervescente,
sob a vista do rei e sua gentalha,
à espera do fim trágico iminente.
Nabucodonosor vê, na fornalha,
que, enquanto queima o fogo incandescente,
aos três reféns se junta outro valente
e, aos quatro, então, não há fogo que valha.
Nabucodonosor ao servo ralha:
sete vezes o fogo agora aumente;
mas queima mais no rei impenitente
saber que aos quatro o fogo não atrapalha.
Até que o rei os olhos esbugalha
e amedrontado vê que, de repente,
fogo da terra não cozinha crente,
nem sua fé a brasa torra ou talha.
Por fim, ao vil decreto ele estraçalha,
restabelece a Deus culto decente,
impõe que o reino a Deus seja servente
e que a Jeová não troque por migalha.
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE PRATA EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
MINIBIOGRAFIA:
Carlos Alberto de Assis Cavalcanti é diácono da Congregação Batista Memorial de Arcoverde, mestre pela UFPE e professor do Centro de Ensino Superior de Arcoverde (área de Língua Portuguesa e Literatura); e da Escola Industrial de Arcoverde; tem várias premiações nacionais / internacionais em concursos de poesia; é associado à UBE, delegado municipal da UBT e membro-correspondente das Academias de Letras em: Ponta Grossa – PR; Cachoeiro do Itapemirim – ES; e da Academia de Letras Rio – Cidade Maravilhosa, Rio de Janeiro, na qual foi recentemente laureado com a medalha: Machado de Assis.
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CORACY BESSA (SALVADOR - BA)
AMORES
Há os que chegam lentos, gestos suaves, pequenos prazeres, silêncios quietos. Mansamente, vão ocupando espaços, sentimentos e pensamentos. Não empolgam mas cativam a tal ponto que nos envolvemos em seus grilhões de seda. Forcejar por escapar é inútil: com a leveza e resistência da tessitura das aranhas, sua teia de sedução enganadoramente nos faz sentir livres, em nosso cativeiro. Outros, tempestuosos, explodem em nossas vidas com trovões de desejos, angústias torrenciais, pavores atávicos. Devastam, arrastam, escavam sulcos profundos, tornando estéril ou fecundo o nosso viver — após a tempestade. E se vão...
Orgulhosos, alguns se fazem de rogados, maltratam e, sadicamente, gozam o poder de nos fazer sofrer. Indiferentes às vítimas, semeiam insegurança, recolhem troféus de desespero. Há quem diga que não são amores, porém esta é a sua feição: mal de nascença, defeito de fabricação? Indigentes — tantos! — suplicam, infernizam, perseguem, tocaiam, exigem, ameaçam e, às vezes, suicidam-se — literal ou metaforicamente. Sofrem — e o seu sofrer incomoda, irrita, enoja, talvez. Este é o seu gozo...
Há os inconseqüentes, inconstantes — hoje paixão, amanhã desprezo, logo, exigência, depois, perdão... É viver em corda bamba, na gangorra do sentir e do fazer, ganhar ou perder, galgar montanhas ou afundar-se em abismos.
Alguns nos surpreendem, nos divertem, nos tomam pelo lado criança escondido em nós. Cobrem-nos de mimos, de carinho, fazem cócegas em nosso ego. Mas, às vezes, pedem colo, fazem manha e choram de mentirinha...
Serão tantos, os amores?! Tantas são suas facetas, suas máscaras, suas performances, que se chega a duvidar que existam.
O amor é um só, existe, se faz torrente, riacho, cascata. Mutante, fugidio como arco-íris, explode em luzes, cores, sons. Aquece, congela, fere, cura. Indefinível, indecifrável, imponderável, o que o faz configurar-se são as feições que lhe damos, as vestes que o cobrimos, os adereços que o enfeitamos. Há tantos e tantos — que são o mesmo!
O Homem é onipotente, em se tratando de AMOR: ele o cria, o molda e dá-lhe vida ou o destrói — segundo sua própria imagem. Tal como fez com Deus...
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(MENÇÃO HONROSA EM CRÔNICA NO JÚRI CIVIL)
O CAVALO DA CRINA AZUL
No começo, ao perceber que existia, ficou muito confuso. O que era existir? Não sabia, exatamente, mas tinha consciência.
Primeiro, percebeu que quase não tinha peso, pois o líquido em torno dele o pressionava tão suavemente por todos os lados, que era como se não houvesse nada em volta — como se estivesse solto no espaço. Era uma sensação gostosa, morna. Depois, se deu conta de que podia se movimentar em todas as direções, mas, ao mesmo tempo, era como se não saísse do lugar — nada mais havia além daquele líquido. Pensou que fosse o primeiro e único ser no mundo. Mas, o que era o “mundo”? Não tinha a mínima noção do que fosse, porém, tinha a certeza de que existia — tanto quanto ele próprio.
Engraçado: parecia-lhe já saber uma porção de coisas que, no entanto, não conhecia. Entretanto, sabia que existiam. Era como se, antes de existir, houvesse uma programação de conhecimentos que lhe seriam entregues no momento em que passasse a existir.
Súbito, passou a perceber algo diferente: eram sons. A princípio, confusos, mas, com o passar do tempo, começou a aprender a distinguí-los, embora parecessem sempre longínquos e não soubesse de onde vinham. Um dia, surpreendeu-se produzindo um som: abrira a boca, entrara-lhe um pouco daquele líquido em que morava e, espontaneamente, o engolira, fazendo “glut-glut”. Daí em diante divertia-se, eventualmente, fazendo “glut-glut”.
Certa vez foi sacudido, subitamente, em todas as direções: ficou apavorado, sem saber o que lhe acontecia. Tudo não passou de um grande susto, ao notar que nada se modificara nele. Percebeu então que, não apenas “ele” podia se movimentar, mas, também, o “seu” mundo se movimentava — às vezes, suavemente, outras, com brusquidão. Deixou, então, de sentir medo quando essas coisas ocorriam. Entretanto, continuava intrigado.
De quando em vez, tinha a impressão de que sonhava com coisas que haviam acontecido e outras, que iriam acontecer.
Ultimamente, vinha tendo a impressão de que o “seu” mundo estava diminuindo cada vez mais — o espaço em torno de si era progressivamente menor. Ficou preocupado, até perceber que “ele” é que estava ficando cada vez maior. Notou, também, outras novidades: sua pele — que era rósea, com riachos azulados parecendo uma rede de malhas irregulares — estava coberta por uma camada de pêlinhos lustrosos, brancos, com manchinhas escuras. Em sua cauda havia, na extremidade, um penacho de pêlos longos que flutuavam no líquido ambiente. Suas patas tinham, agora, uma carapaça lisa, dura e escura. Sentia também que, em sua cabeça, seguindo em direção às costas, algo novo havia — mas não conseguia identificar o que era. Ficou bastante intrigado e procurava ver, contorcendo o pescoço, mas nada conseguira. Que enigma era aquele? Já conhecia todo o seu corpo, podia vê-lo — exceto, justamente, no local onde acontecia aquele mistério. Sua curiosidade era tão grande que não ficava mais sossegado, quase não dormia, tentava dar cambalhotas para ver se, assim, conseguia visualizar a parte alta da cabeça e superior do pescoço — sem resultado. Começou a ficar angustiado, sentindo necessidade de mais espaço, pois, àquela altura, quase não se podia mover: o líquido em que vivia já era muito escasso.
Então, para piorar a situação, passou a sentir uma pressão estranha, cada vez maior — como ondas que o comprimiam por tempos cada vez mais longos — deixando-o, simplesmente, aterrorizado. Seu coração batia mais e mais rápido. Um ruído surdo — como de tempestade ao longe — o envolvia todo, latejando violentamente em seus ouvidos. Sentia-se paralisado pelo medo e pela falta de espaço, com as patas dobradas comprimindo o seu tórax e o abdome.
Subitamente, ocorreu-lhe uma idéia louca: “Preciso sair daqui, preciso fugir, preciso respirar, preciso de ar, ar, AR!”
Não teve tempo de raciocinar mais nada: lançou-se, de vez, na direção em que estava a sua cabeça e sentiu que algo se partia, rasgando — e o resto do “seu” líquido escoava por aquele túnel que se abria à sua frente. Totalmente em pânico, escorregando e sentindo-se empurrado pelo que lhe pareceu uma onda gigantesca, caiu, aos trambolhões, num outro mundo. O impacto no solo o deixou totalmente aturdido, até esquecido daquele desejo intenso que o impulsionara pouco antes: respirar!
Tudo se passou muito rápido: sentiu um frio intenso e um peso enorme sobre o seu tórax — quase tão grande quanto o que sentira nos momentos finais em que habitara o “seu” mundo — ao tempo em que algo pesado, morno e áspero movia-se sobre suas narinas, sugando-as.
Despertando bruscamente do seu estupor, dilatou o tórax, inspirando algo que lhe penetrou os pulmões de uma maneira violenta — quente e frio ao mesmo tempo — parecendo que iria rasgá-lo por dentro: o ar!
Sentiu-se aturdido: essa foi a emoção mais completa e complexa que sentiu em toda a sua vida — a dor-prazer da primeira respiração.
Completamente exausto, deixou-se ficar molemente onde estava, respirando suavemente — e uma sensação de bem estar infinito arrastou-o para o sono.
Despertou com uma algazarra de vozes infantis que se aproximavam.
Estupefatas, as três crianças pararam junto ao estábulo, enfiando as cabeças pelas traves do gradil, até que o mais velho delas disse, incrédulo: “Mas ... é um cavalinho de crina azul!”
Sorrindo dentro de si mesmo, o cavalinho adormeceu novamente.
(MEDALHA DE BRONZE EM CONTO NO JÚRI CIVIL)
PC, PT e Outros que tais...
- Eu acho que nasci fora do tempo...
- Como assim?!
- Todo mundo gosta de computador e eu, não!
- Tolice! É que você ainda não encontrou uma forte razão para se interessar por ele...
Assim estavam a conversar Julinho e seu primo Ariel. Os dois, sentados na escadaria da matriz da cidadezinha onde moravam, aguardavam a passagem de Marianinha. Ariel, um pouco mais velho, já era um craque no uso do computador da escola e vivia sonhando com o momento em que conseguiria um para ele, instalado em sua casa: um verdadeiro PC. Enquanto isso, Julinho vivia sonhando com um PT. Em seus planos estavam se tornar um verdadeiro atleta, disputar provas e chegar às olimpíadas...
Marianinha, a vizinha dos meninos (por quem ambos se acreditavam apaixonados), ainda não decidira de qual dos dois gostava mais: se de Ariel, “o intelectual”, como dizia a professora Neinha, ou de Julinho, “o cara”, como era apelidado pelos colegas quando disputavam as provas atléticas. O chato, achava Marianinha, era aquela mania deles de gostarem tanto de política e serem de partidos diferentes! E logo de quais?! Do Partido Comunista e do Partido dos Trabalhadores! Pelo menos, era o que ela acreditava, pois eles só viviam falando em PT, PC e outros que tais!... Aliás, essa maneira de falar por letras independentes, era uma mania que vinha se alastrando entre as crianças na escola. Ela, de sua parte, gostava das letras casadinhas, como a Pró antigamente escrevia no quadro negro da escola. Porém agora, depois que chegou aquela máquina parecida com televisão, nas salas de aula quase tudo era falado em código, cifrado! Igualzinho à Língua do P, que só entendia quem soubesse. É verdade que havia, também, outra língua parecida, a Língua do F... Enfim, o que mais Marianinha curtia eram os documentários que assistia na tela da tal máquina, aos sábados. Nos demais dias da semana, o tal aparelho deixava a Pró preguiçosa, porque ela não precisava mais dar a aula, escrever os exercícios no quadro negro, nem explicar as lições: já vinha tudo prontinho na tela do tal aparelho! Marianinha não se conformava com uma coisa: os coleguinhas não queriam, como antes, brincar no recreio, correr picula, pular amarelinha, soltar pipa, nada disso! Só queriam ficar jogando os tais de jogos eletrônicos, que nem todo mundo podia jogar ao mesmo tempo! Ela achava que o aparelho não gostava de todas as crianças, porque só aceitava jogar com algumas delas, de cada vez. Resultado: as brigas na escola estavam aumentando demais! A Pro Neinha já dera queixa à Direção da escola: ou aumentavam o número de máquinas ou não poderia se responsabilizar pela disciplina da classe.
Retornando seu pensamento para os dois meninos, Marianinha já estava achando que gostava mais do Julinho, porque pensava mais ou menos parecido com o pensamento dela. Quando ele falava, com tanto entusiasmo, dos jogos esportivos, dos campeonatos diversos, conseguia entusiasmá-la também, e ela entendia com facilidade o que ele explicava. Já Ariel, ficava mais distante, quando conversavam, porque ele falava de um monte de coisas que descobria na máquina misteriosa enquanto ela ficava sobrando, na conversa... O difícil seria conciliar o bem-querer com as preferências... E assim, Marianinha teve um insight do que seria um relacionamento a dois...
Avistou-os de longe: Julinho, moreno de olhos verdes, cabelos pretos e curtos, corpo atlético e sorriso brincalhão. Ariel, ruivo, olhos azuis, muito alvo e com sardas, porte franzino, sorriso tímido. Os dois, muito bonitos. Qualquer que fosse a sua escolha, Marianinha estaria bem servida... Porém, não poderia escolher baseada na fachada e sim, no conteúdo. No bem-querer, no bem-entender, no bem-sentir e assim por diante...
Mal Marianinha chegou perto, os dois garotos interromperam a conversa e coraram, encabulados. “Estariam tendo alguma conversa inconveniente?”, indagou-se a menina. Hesitou em aproximar-se. Julinho adiantou-se:
- Oi, Marianinha! Você tá com uma roupa bem maneira! Vai pra alguma festa?
- A esta hora da manhã?!, retrucou a garota.
- Marianinha está sempre bem vestida, Julinho! Você é que não repara nessas coisas...
- É que ela só vive de short...
- Engano seu, Julinho! Eu me visto de acordo com a ocasião! Vou pra missa, não posso ir de short...
- Nem de vestido de baile. Eu sei disso, garota!
-Você implica demais, Julinho! Assim, Marianinha não vai querer mais conversar com a gente!
- Não vou querer mesmo! Vocês só sabem falar do que não me interessa: política!
- O quê?!
- Isso mesmo! Só vivem falando do Partido Comunista e do Partido dos Trabalhadores...
- Como é que é?!, exclamaram os meninos, ao mesmo tempo.
- É isso aí! Vocês só vivem falando de PC, PT e não sei mais o quê!
- Não seja tola, menina!, tentou acalmá-la Julinho.
- Tola, eu?! Vai dizer que estou mentindo?!
- Não, não é nada disso!, acudiu Ariel. Você não sabia que PC quer dizer Computador Pessoal? Ou, como se diz em inglês: Personal Computer?
- E PT significa Treinador Pessoal, ou, como se diz em inglês, Personal Trainer, tolinha!, apressou-se a explicar Julinho.
Seguiu-se um silêncio constrangedor. Marianinha, encabulada, enrubescia cada vez mais, à medida que avaliava como fora tola em não procurar esclarecer as suas dúvidas, fosse com os meninos ou com a Pró Neinha. Nada melhor do que ir direto o assunto. Não há nenhum motivo para dar um fora, sem necessidade. Já diziam os antigos: “Perguntar não ofende!”.
Ariel, conciliador, propôs:
- Que tal se fôssemos os três conhecer um lugar que eu soube que foi inaugurado, faz pouco tempo, aqui na cidade?
- É algum clube novo?, indagou Julinho.
- Não! É uma Lan house...
-Uma o quê?!, assustou-se Marianinha.
- É um local com vários computadores que podem ser usados ao mesmo tempo. A gente podia ir conhecer e brincar, nós três juntos. Que tal?
- Não sei... Ainda tenho que assistir a missa..., alegou Marianinha.
- E eu tenho que ir ao treino de vôlei..., informou Julinho.
- Então, podemos ir à tarde. Tá certo?, concluiu Ariel.
- Tá legal!. E cada um foi para o seu lado.
À tarde, os três se encontraram ali mesmo, em frente à matriz. Marianinha estava com um vestido lindo, estampado com flores do campo. Os garotos, bem arrumados, pareciam estar indo a um encontro de namorados. Andaram juntos, alegres, contando piadas inocentes e cantarolando a melodia dos últimos sucessos musicais.
Chegaram à Lan house. Era a antiga loja do português padeiro, Sr. Manoel. A reforma que fizeram no imóvel não deixou nenhum traço do antigo estabelecimento. Agora, num salão bem claro, enfileiravam-se computadores novíssimos, cadeiras confortáveis, uma suave “música de fundo” tornando o ambiente muito agradável e o dono do local, quem diria, era Quinzinho, filho do Sr. Manoel. O rapaz que viajara para fora da cidade a fim de estudar, ninguém sabia o quê...
A surpresa foi grande: os garotos se lembravam daquele magrelo de mãos grandes, mais velho que eles alguns anos, sempre com o nariz enfiado nos livros, fugindo da padaria para a biblioteca dos fundos da igreja matriz, onde ficava até o Sr. Manoel levá-lo arrastado pela orelha para ajudá-lo na padaria. E agora ali estava, um rapagão bonito, simpático, desembaraçado, gentil, que os atendeu com muita amabilidade e pôs-se à disposição dos garotos para orientá-los no manusear dos computadores.
Marianinha apaixonou-se na hora! Ali estavam, unidos numa só pessoa, a beleza, a simpatia, o conhecimento, a inteligência, o saber-fazer, saber-conquistar, saber... amar?!
Só que... Quinzinho era gay! E Julinho e Ariel passaram a disputá-lo...
***
VIDAS RESUMIDAS
Nasceu em 1901. Viveu um ano, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 ...........98. Cansou. Morreu. Que fez? Quem sabe?
A mãe se agachou no último momento. Expulsa, caiu de cabeça no chão, na ladeira de acesso à Maternidade. Levada de qualquer jeito, chegou à maca do berçário dez minutos antes do fim. “Cigana?”, perguntaram. Quem sabe?
Acordou no meio da caatinga, embaixo de um pé de pequi. Faminto, sedento, coberto de formigas. Chorou, ninguém escutou. Lembranças vagas de pai, de mãe... quem mais? Durou dois dias, somente. Quem o deixou ali? Quem sabe?
Casou-se contra a vontade, obedecendo à vontade de todos. Festa simples, enxoval precário, dívidas pagas com o seu hímen. Fazendeiro grosseiro, estupro perpetrado. Pela manhã, corpo boiando no tanque do lajedão. Como se afogou? Quem sabe?
Dobrou a esquina a tempo de ouvir os disparos. Correu. Não chegou ao outro lado da calçada. Na mão, carteira de trabalho agasalhando marcação de entrevista para emprego. Quem atirou? Quem sabe?
Na escalada da torre de energia, a cada lance rezou um credo, uma salve-rainha ou um pai-nosso. Não chegou ao final do rosário: tropeçou num ninho de joão-de-barro. Alguém ouviu o grito? Quem sabe?
Mãos jovens se apoderam do travesseiro, esmagam-no sobre o rosto do homem estertorante no leito, finalizando a lenta agonia e liberando o herdeiro para usufruir da boa sorte. Alguém viu? Quem sabe?
“Menina venha cá! Vá com seu padrinho buscar água na fonte! Não precisa pressa. Eu vou cochilar...”. A menina foi e não voltou. Quem achou? Quem sabe?
“Pensa que não sei o que fez?! Reze, se quer perdão!”. E a peixeira rasgou-lhe o ventre com a maestria de quem desossava carcaça de boi nos fundos do mercado. Alguém ouviu os gritos? Quem sabe?
“Sua penitência será fazer a “prece maometana” para mim, três dias seguidos, fedelho!”. Alguém ouviu o choro entrecortado na penumbra da sacristia? Quem sabe?
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MINIBIOGRAFIA:
Coracy Teixeira Bessa é nascida em 24-11-1935 em Salvador, Bahia.
Médica e Socióloga (aposentada).
Membro Emérito da Academia Brasileira de Médicos Escritores (ABRAMES).
Premiações em Concursos Literários estaduais, nacionais e um
internacional (Brasil/Portugal) 3º lugar no Prêmio Hebron de
Literatura em Curia, Portugal.
Livros publicados pela Garcia Edizioni: Mulheres Milenares (Contos),
Sementes Amargas e Universo Reverso (Romances).
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ÉRIKA LOURENÇO JURANDY (RIO DE JANEIRO - RJ)
Receba o meu desprezo
Não se faça de vítima,
não tente se enganar,
colheu o que plantou,
apenas assim: bateu, levou.
A vida não é um jogo,
que você faz o que bem entende com os demais,
se não sabe ser gente,
aprenda se for capaz.
Não perderei meu tempo falando,
dialogar, ah!, nem tentando!
Não me causa espanto,
você ainda achar que pode, alguma coisa, falar.
Prefiro ficar em silêncio,
deixar que seu blá, blá, blá fique no ar,
tome e leva o meu desprezo,
é um presente, até nunca mais, "au revoir" ("orrevuá")!
Espera...
Tempo passa... ou não passa?
Dia que vai e outro que chega,
a demora apavora,
mas o tempo voa, destoa.
Ansiedade de ver o amanhã aparecer.
E horas que correm.
E dias que se arrastam.
E só espera e espera...
Quando chega o destino,
se quer um rumo, um caminho,
mas, cadê? Diz-me, cadê?
Não vejo, não consigo ver...
Palavras truncadas,
futuro incerto,
apenas deixe firme o passo,
siga adiante...
Quem faz o destino somos nós,
mas, antes, espera.
Espera e não acelera,
Espera e confia...
Sombras do passado
O passado já passou. Desfez-se, desmoronou.
Mas, o que ficou lá atrás, para trás?
O que passou, findou? Será que terminou?
Ou está perdido,
em um espaço-tempo descontínuo?
Ou contínuo? E sem destino?
Existe o passado perfeito,
e o imperfeito
e o mais que perfeito.
E todos estiveram lá atrás,
alguns acabaram lá atrás,
mas, nem todos, findaram lá atrás.
E será que é assim,
Será que é este o nascimento das sombras?
Será que é assim que as sombras existem?...
Lágrimas
Uma música que desperta,
o sentimento que, até então, se escondia.
Sem pedir licença, sem rodeios,
lágrimas correm, derramam,
levam ao devaneio.
Por dentro, tudo em pedaços,
por fora, apenas pequenos fragmentos,
marcas deixadas pelo tempo,
pequenos, médios e grandes tormentos.
Pode-se lutar, tentar, mas nada irá pará-las;
quando as lágrimas saem,
quando a máscara de forte cai,
revela-se a fragilidade de todo ser,
revela-se a mais autentica humanidade que se pode ver,
porque ninguém é sempre forte,
ninguém é poderoso,
ninguém consegue conter a tempestade interna,
deixando-a fluir,
inevitavelmente,
sem enfeites,
quando as lágrimas decidem desaguar...
MINIBIOGRAFIA:
Com formação acadêmica nas áreas de Tecnologia, Educação e Jurídica, Érika Lourenço Jurandy começou a escrever amadoramente em 2011, como forma de autoterapia e permanece escrevendo para aprimorar suas competências em Língua Portuguesa, bem como melhorar seu raciocínio e criatividade.
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FERNANDO BEVILACQUA (RIO DE JANEIRO - RJ)
A LÁGRIMA
A lágrima, apenas saída,
É sempre salgada.
Por que sal e não doçura?
Será sempre sinal de dor?
Não, não de dor.
Mas um alerta
Seja de perda,
Seja de prazer.
A lágrima é fluido sagrado
Que todos, ou vão enxugar
Ou sorver em
Homenagem à vida.
Quem não chorou
Ainda não se declarou
A Deus
PERFIS
Não gosto dos moderados.
Escondem revelações.
Prefiro os apaixonados
Movidos a emoções
Os que falam pouco
São caixas de surpresas
Mantêm o peito rouco
A língua e a alma presas
Não gosto dos repetitivos
Pensamentos sem balanço
Dependem dos passivos
Vivem cheirando a ranço.
Gosto dos polêmicos
Transbordantes de ideais
Encontros nunca anêmicos
Silêncio nas salas, jamais.
Que os santos me afastem
Dos que falam só de si
Prefiro os cães que latem
E ouvir lendas de saci.
Melhor às vezes conversar
Com fantasmas e duendes
Nunca pretendem cansar
Aqueles que acreditam. Entendes?
BOÇAIS & OPORTUNISTAS UNIDOS
O oportunista, isoladamente, é um ser programado a vencer e chegar lá seja como for. É treinado a atropelar, mentir, prometer e não respeitar meios para os fins almejados – é um “finalista” a qualquer preço. São indivíduos persistentes, aliciadores incansáveis – enfim, gente perigosa.
Já os boçais, o outro lado da equação, e que eu, de cá, os classifico em três categorias – a) o boçal de pai e mãe; b) o boçal quimicamente puro e c) o boçal militante – merecem rasas considerações (precisam ser rasas, pois boçais não têm como atingir profundidades além da superfície). Os dois primeiros são praticamente isentos de culpa, pois que vinculados a condições genéticas um e congênitas (não necessariamente associadas a condições heredo-familiares), o outro. Já o boçal militante, deste sim, tenho medo, pois que sai pelo mundo a proclamar e difundir asneiras. Como quase sempre, tem inegável poder de comunicação de massa, consegue atrair ouvintes e, não raro, a aderência de muitos às suas estúpidas falações. É, pois, ambulante perigoso.
Não é difícil associar a boçalidade ao despreparo educacional e cultural. Acontece que os “tropeiros das boçalidades” têm como característica marcante, a certeza e a confiança em seus iluminados anúncios públicos; têm coragem suficiente para ir adiante sem pejo; não há temas de que não tenham enciclopédico conhecimento e, sendo assim, deitam verborragia.
É com esses coitados que os oportunistas montam seus planos e projetos rumo às ambições pessoais.
Episódios atravessados pelo país em momentos recentes demonstram bem o regozijo dos aproveitadores cavalgando no lombo dos boçais militantes.
O mais emblemático é a “sobremesa” que tem acompanhado as manifestações (muitas justas) dos professores em greve. A respeito de greves, a melhor apreciação sobre a mesma ouvi de um “grevista profissional” – “é fácil iniciar uma greve; difícil é sair dela, conquistadas as reivindicações”; já observaram que uma reclamação transformada em greve por ajuste salarial de 20% (p. exemplo) nunca termina com a exigência de 20%, mas com a concessão de 10/12%? Acordos muito abaixo de, às vezes, menos de 50% do teto almejado, fazem terminar greves causadores de grandes transtornos sociais.
Será que os indignados professores em sua greve não perceberam que as ações desses abomináveis “black blocs”, que nada mais são que marginais selvagens e destruidores de tudo que julgam não lhes pertencerem sejam caronas nas reivindicações dos professores? Eis o selo da boçalidade tatuada – os efeitos dos vandalismos serão cobrados deles e da sociedade omissa quando dos reparos das destruições, sejam públicas ou privadas. E pasmem! Tem gente que aprova! Pois é, a greve dos professores serve como “catalisador” da selvageria dos boçais black-blocs. E que os boçais e seus bandos busquem nos dicionários o significado de catalisador! Reajam professores, apoiando e estimulando a polícia e a justiça para desmontar a equação boçais/oportunistas. Demonstrem que têm justo e lúcido entendimento dos acontecimentos.
Em outro ponto da curva (para falar em linguagem atualizada), está recente episódio relacionado aos roubos de cães de uma instituição paulista de pesquisa.
Boçais, que não têm qualquer informação, iniciação ou entendimento do que seja pesquisa científica no campo das ciências biológicas, apresentam-se à sociedade, como (falsos) humanistas – roubando cães a serviço de pesquisas biológicas. Para tanto, invadem instituto de investigação científica e liberam cães que são, na verdade, “auxiliares” de médicos e biólogos que buscam por aprimoramentos e novas descobertas na gênese e tratamento de moléstias que atormentam e ameaçam a vida humana. Alegam esses boçais anticientíficos que os pobres animais são submetidos a maus tratos e brutais procedimentos “torturantes”. São tão revoltados contra a pesquisa “colaborativa” que imagino seriam capazes de oferecer pais, mães, filhos, amigos e outros entes menos queridos que os animais para a conclusão das experiências. Vou lembrar de dois fatos históricos: um relacionado ao fator Rh (e atenção boçais: Rh não se refere a “recursos humanos”) e que passo a expor às mentes boçais, na tentativa de torná-las menos insuficientes e ridículas. O chamado fator Rh tem sua sigla derivada de Rhesus, um simpático macaquinho que, aprisionado em jaulas de laboratórios de pesquisa, nos idos de 1940, e com o auxílio de outros colaboradores associados – os peludos coelhinhos – permitiram a descoberta do fator Rh, este conhecido por todos que conhecem seu tipo sanguíneo – mas desconhecem e não louvam o amigo anônimo, o macaquinho Rhesus. Quantos filhos de boçais, antigos e recentes, já não foram salvos da fatal enfermidade “eritroblatose fetal” porque macacos e coelhos estiveram ao lado de benfeitores (malvados torturadores) da humanidade. Até quando vocês, boçais ingratos e incansáveis estarão em ação? Um outro fato, que não merece nem apoio e muito menos aplausos, foi o ocorrido nos campos de concentração impostos pelos nazistas ao longo da 2ª Guerra Mundial. Nem cães, coelhos, camundongos ou outros animais, serviram para observação de resultados de experimentos médico-biológicos; não havia fase intermediária, entre o protocolo inicial da pesquisa, como mandam a ética e a conduta humana desses “nossos tempos mais civilizados”, lançando mão de resultados observados primeiro em animais para, posteriormente, se considerados favoráveis, aplicar o experimento em humanos. Àquela época os humanos eram os “animais de laboratório”. Cães, coelhos, camundongos, porquinhos da Índia nada “sofriam” – estavam libertos das gaiolas e jaulas dos laboratórios.
Para quem desconhece, e acredito ser a maioria, as experiências em anima nobile efetuadas pelos insanos nazistas, muitas conduziram a descobertas médicas notáveis. Tais descobertas, efetuadas em tempo curto, pois que os resultados eram imediatos pela ausência dos testes em animais de laboratório, estabeleceram bases fisiológicas científicas sobre muitos distúrbios de saúde, com destaque para a insuficiência renal aguda, comum em tempos de guerra, fruto das hemorragias massivas dos ferimentos por arma de fogo. Longe de louvar os métodos nazistas, muitos pais, filhos, irmãos e amigos queridos dos atuais boçais em ação e outras pessoas, estão vivas, hoje, graças àqueles abomináveis experimentos.
Desmontado(?) o nazismo no mundo atual e persistindo, entre os regimes de limitação das liberdades, o comunismo – ideologia pela qual almejam e oram os atuais (des)governantes do país – nada devemos temer quanto ao retorno das atrocidades experimentais dos idos de 1940, isto porque os comunistas não têm muito interesse em pesquisas científicas; eles matam sem aproveitar “cobaias” utilíssimas.
Escrever em demasia cansa o leitor e desvia a atenção reflexiva sobre o tema apresentado.
De toda forma, “Boçais e Oportunistas Unidos”, só com educação de qualidade (não massificada para efeitos estatísticos) serão vencidos.
(MEDALHA DE PRATA EM CRÔNICA NO JÚRI MILITAR)
(MEDALHA DE BRONZE EM CRÔNICA NO JÚRI CIVIL)
DECADÊNCIA E PODRIDÃO REPUBLICANAS
É preciso esforço (e muito) para ter e transmitir aos que estão vindo, até pequenos goles de otimismo em relação aos destinos desse país. Este torrão tropical continua insistindo em negligenciar e desconsiderar as ofertas celestiais gratuitamente cedidas pelos deuses do universo – esta terra. Aqui, as revoltas enfurecidas da natureza passam apenas raspando, caso comparadas a outros países desse planeta. E quue prejuízo causam!
As destruições catastróficas no Brasil não são natureza-dependentes: são fruto da corrosão da mais importante e emblemática raiz de crescimento e evolução do ser humano – a decência, o caráter, a ética, a competência administrativa e a vergonha “vergonha na cara”. Estes são “elementos” mais devastadores do que as catástrofes da Natureza, isto porque não são apenas agudos – crescem e se multiplicam em cursos crônicos. E todos sabem que as consequências de um terremoto, excluídas as mortes humanas, podem ser reparadas em tempos diferenciados pela consciência, trabalho e responsabilidade dos governantes e da população. Já as devastações da subjetividade, levam tempo para suas descobertas e reparos: são quase seculares.
Tenho a cruel sensação de que todas as “caixas de esgoto” das governanças brasileiras, em todos os níveis, foram abertas e não param de vazar. As notícias mal cheirosas são diárias e pior, crescentes na intensidade do odor desagradável.
Nas considerações que vou parir adiante peço aos “otimistas remanescentes” que façam, criteriosamente, a diferença entre êxitos e façanhas pontuais e inscrição de realizações nos “almanaques” de reconhecimento universais.
Vale pinçar um exemplo que, posto nas páginas e telas do mundo midiático e que pode confundir inocentes, ignaros e defensores apaixonados de governos demagógicos.
– “Médico consegue retirar vergalhão do crânio de operário de construção civil, devolvendo vida e integridade física ao paciente”. Pode, esta heroica, competente e pontual ação médica sustentar que os médicos brasileiros têm primorosa formação profissional? Para reflexão dos leitores, informo que avaliação do Conselho Regional de Medicina de São Paulo de médicos recém-formados, (2003?) deu conta que mais de 50% dos testados foram reprovados; a nota de corte fora apenas seis. Conclusão: faculdades (ou empresas de balcão?) de medicina “expulsam” de seus berços, médicos mais preparados para “arriscar” do que “cuidar” da vida e da saúde das pessoas. O mais grave e inconsequente é que a existência de “faculdades de balcão” não é recente; tudo teve início em 1969, com a expansão desordenada e demagógica das faculdades de medicina. Alguém conhece alguma faculdade que tenha tido seu funcionamento impedido pelas autoridades governamentais, frente a revelações tão estarrecedoras? Não! Que o povo receba produtos de má qualidade. Deputados, senadores, ministros e agregados das cúpulas administrativas, estes sim, merecem um tratamento “vip”, vista as despojadas demonstrações de amor, dedicação e sacrifício emprestadas ao povo e ao país.
Elevemos nossas preces aos deuses do universo para rogar:
“Precisamos de mais pessoas e menos gente; precisamos controlar filhos nascidos de mães e pais que os geram apenas por impulsos instintivos primitivos nos salões dos bailes funk, nos becos e barracos das favelas, nas capineiras de nossos rincões interioranos; precisamos de menos bundas (não abolição total), “big brothers”, shows de exibição corporal e mais imagens nas telas (TV e Internet) de programas e temas que estimulem a inteligência e instiguem a busca por aprimoramentos social e cultural; precisamos de mais pessoas que trabalhem com seriedade, competência e respeito com os dinheiros públicos; que tal menos carnaval, micaretas e futebol medíocre? Não precisamos de mais médicos, especialmente os importados, ainda menos preparados que os nossos atuais “exércitos” de médicos expelidos pelas universidades e escolas isoladas de medicina nem daqueles que chegarão para cumprir mais propósitos espúrios não confessáveis de doutrinação político-ideológica do que assistência médica; precisamos sim de mais saúde, aplicando o mesmo raciocínio em relação às guerras, quando estas não são tema exclusivo de militares – proporcionem condições de habitação, educação alimentar, fornecimento de água de boa qualidade e esgotamento sanitário e bolsa de trabalho e veremos os ambulatórios e enfermarias hospitalares esvaziados; precisamos de apurar nossos gostos musicais, oferecendo às orelhas dos cidadãos sons harmônicos, não ruídos ensurdecedores e músicas acompanhadas por letras que exaltem os sentimentos nobres do homem; e não de letras com palavras e sentenças adversárias à polícia; precisamos de mais jardins, gramados e menos concreto nas cidades; precisamos de mais verdade reveladas pelos governantes e administradores públicos e, finalmente – precisamos de prolongadas férias de políticos como a maioria atual que “desbarata” o país, e selecionar os que, de fato, pensem nas ulteriores gerações e não simplesmente nas próximas eleições.
Tenho ímpetos e, com todos os riscos de uma antecipação, de cumprimentar os vitoriosos antibrasileiros que em breve estarão comemorando, com bons vinhos e uísques, a derrota de pouquíssimos lutadores pela justiça decente e implacável no julgamento de indivíduos (leiam-se os processos do “mensalão” e “petrolão”), todos já apenados pela população não presenteada por bolsas e acobertamento de ilícitos e ilegalidades.
A nota desses antipatriotas é a de implantar no país a decadente e quase abandonada doutrina comunista; aí, o globo central do pavilhão nacional terá substituídas nossas estrelas e nossa faixa de “Ordem e Progresso” pelas “mágicas e hipnóticas” Foice e Martelo.
Pais e mães: preparem seus filhos para suportarem os próximos odores públicos dos esgotos do futuro Brasil!
Que os deuses do universo não abandonem nossa gente.
Oremos
(MENÇÃO HONROSA EM CRÔNICA NO JÚRI CIVIL)
ESCOLHAS
Impossível escapar da morte - e das escolhas. A primeira independe da vontade; assemelha-se ao sistema autônomo do organismo (o popular vagossimpático) - você não controla os movimentos do seu intestino nem as batidas de seu coração, por exemplos. Sob este aspecto você não vai sofrer de arrependimentos ou de angústias o que, surpreendentemente, pode ser mais suave do que uma escolha catastrófica.
Esta última é ato consciente (como um chute) e determinante dos rumos de sua existência. Ao contrário da morte, que é definitiva, irrevogável e sem possibilidade de revisão, a escolha dá ao “seu proprietário” o direito de mudança, troca ou mesmo abandono.
Não há escolha que seja inócua. Lidar com os resultados de uma escolha é um dos mais instigantes desafios do homem. Uma escolha pode ser determinante de felicidade ou infelicidade, de paz ou tormenta e até de vida ou de morte.
Por outro lado, a escolha pode ter caráter e consequências exclusivamente pessoais ou alcançar dimensões sociais. Nada é mais pessoal e intransferível do que uma escolha. Você pode ter influências, opiniões e inspirações externas numa escolha, mas a decisão final será sempre e exclusivamente sua, numa solitária consulta à sua consciência.
De forma geral, o ser humano se debruça com mais atenção e cuidado sobre uma escolha que possa ocasionar consequências pessoais imediatas, do que uma outra que se mostre (aparentemente) distante de sua “pele”. Este último caso tem no exercício do voto o exemplo mais emblemático. Isto está associado a uma das características quase insuperáveis do ser humano – o imediatismo. Os homens, em particular, usam e abusam da rapidez em suas satisfações mais primitivas. São seres imediatistas por excelência! As mulheres têm outros “defeitos”.
A escolha efetuada por intermédio do voto é considerada pela maioria como o mais elevado estágio do exercício da democracia. Eu, de cá, não aposto, de forma plena, neste “aforismo”. Reparem: qualquer representante do povo, quando eleito, tem, no mínimo, quatro anos de “estacionamento” no poder do cargo. Isto significa que há que se “aturar”, por aquele período, o eleito, mesmo que depois se revele uma péssima escolha. Isto porque a decantada democracia é quase engessada para destituir o ocupante do cargo, comprovada suas improbidades e/ou ineficácia no exercício do mandato. Acreditaria no desenvolvimento pleno da democracia, caso houvesse a mesma facilidade de deposição que de eleição. Conclusão: no palco da eleição de governantes, identificada uma escolha equivocada, você terá que digeri-la, compulsoriamente, por quatro anos, com quase nenhuma possibilidade de eliminá-la através de “purgantes democráticos”. Quão necessários são tais “medicamentos”!
Não é difícil concluir (e sem qualquer originalidade) que sua passagem terrena é atapetada por suas escolhas. “Céu” ou “Inferno” estarão sempre à espreita nas margens de sua estrada. Apesar de o “cardápio” ser simples, do tipo alternativo (ou um ou outro), o desdobramento do mesmo é prova de múltipla escolha, com incontáveis lacunas para preenchimento. Curioso é que você que será o corretor e o revisor da prova – tanto sua aprovação como reprovação serão, ambas, de responsabilidade única – você. Atenção, pois!
Repare que os deuses do universo são complacentes e generosos com você, pois lhe oferecem oportunidades de revisões; dão-lhe ensejo para “segunda época”, “dependência” e até “repetência” ; que esta última seja sempre para boas escolhas.
Recordar uma visão oriental sobre o tema, vale como reflexão:
“Pergunta o discípulo:
Mestre, como me tornar um sábio?
Responde o Mestre – fazendo boas escolhas.
E como fazer boas escolhas, indaga o discípulo?
Identificando más escolhas, sentencia o Mestre”.
(MEDALHA DE PRATA EM CRÔNICA NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE BRONZE EM CRÔNICA NO JÚRI MILITAR)
O GOSTO E O GOZO PELA CORRUPÇÃO E PELA MENTIRA
Parede coisa de masoquista – e é.
O masoquismo não é apenas concepção psicanalista. Pode ser decretado, desenvolvido e disseminado pelas rudezas intelectual e de princípios educacionais. Em resumo: certas pessoas e muitos conglomerados sociais sentem-se bem, mesmo se autoflagelando, sem experimentar dor e/ou sofrimento por escolhas flagrantemente nocivas para os mesmos.
Na verdade, na visão de um psiquiatra de boa formação, não será absurdo submeter tais circunstâncias a salutar e rigorosos tratamentos.
Esta a quase insuperável missão da sociologia, que tem poucos recursos “científicos” para testar, na prática, atitudes e escolhas de um grupamento social. Exemplificando: como selecionar, pelo menos 2 grupos, obedecendo aos critérios de duplo cego, para levar uma pesquisa em nível acreditável? E ainda querem, os sociólogos, inserir suas disciplinas em “ciências sociológicas”. É momento de parar para refletir.
Pois bem, sem planos e/ou critérios “científicos”, vou expor, sem pretensões de conclusões igualmente “científicas”, o que imagino estar acontecendo nesta nossa ainda indescoberta Pindorama.
São quase 12 anos passados em aberto convívio com a corrupção, a farsa, a mentira e o populismo obsceno e ainda assim, mesmo os não presenteados com óbolos governamentais, se juntam aos desvalidos de escolaridade para engordar percentuais de franca aprovação às diretrizes dos governos que assaltaram o poder. E asseguro, que entre os aprovadores dos governos que continuam assentados nas cadeiras, cujos “fundos” não cessam de alimentar os bolsos de muitos governantes e criminosos legisladores, são indivíduos capazes de ler, escrever e interpretar as linguagens escrita e falada. Pode-se dizer que são intelectuais a serviço da instalação de futuros regimes autoritários. Que combatentes pela democracia são esses? Seria reedição dos proclamados e odiosos anos de chumbo ou apenas mudança da cor do chumbo – de rapidez cada vez mais acentuada, é até possível que eu, em breve chegando aos 80, ainda venha a conviver com a “vitória vermelha” e, sem considerações terroristas, ir para o paredão, fuzilado por “médicos”(?) cubanos.
Não me entristeço nem fico receoso, pois certamente estarei em boa e civilizada companhia.
Quem não conhece um professor universitário, um pesquisador renomado, um escritor, poeta ou músico de cultura densa, que não apoia os chefes e líderes dos patriotas e ícones das câmaras legislativas da “democracia de mão única” do país?
Creio que estou sendo injusto em não considerar as múltiplas conquistas dos vários prêmios Nobel conquistados pelos intelectuais brasileiros nos últimos 12 anos de governança. Doze anos ou doze décadas? Quem lembra de algum?
Neste nosso incipiente e “infringente” país que se quer anunciar como democrático, ainda se acredita que o exercício democrático é exercido apenas pelo voto, elegendo os representantes do povo em seus diversos segmentos político-administrativos. E utilizando-se as urnas eletrônicas, já comprovadamente manipuláveis, aquele original produto tupiniquim e importado por todos os países democráticos do mundo em suas eleições – a urna eletrônica. Talvez aqui uma injustiça dos julgadores do Prêmio Nobel não concedendo ao Brasil troféu em “tecnologia de votação”. Que primitivismo! O verdadeiro exercício democrático está simbolizado menos pela eleição do que pela remoção do cargo daqueles que não servem ao povo, mas a si próprios.
Paciência habitantes da Pindorama. Quem sabe em mais 124 anos (tempo atual de duração de nossa República) vamos remendar os nossos equívocos e passos mal dados.
Se nossa elite cultural e científica aposta e apoia a mediocridade e os “novos rumos” da democracia brasileira, o que esperar de um país de vira-latas?
E sabem como alcançar os invejáveis patamares de progresso, conforto social e vontade de permanecer no país sem convulsões emigratórias a exemplo dos EUA?
Através do trabalho – muito e sério trabalho – zelo pela educação e cadeia para políticos e empresários corruptos. Por mim o “sistema chinês” é o mais recomendável – fuzilamento dos inimigos e traidores da pátria. Melhor do que isso só os japoneses, que economizam balas de fuzil do governo, autoeliminando-se pela voz implacável da consciência!
É preciso orar, e muito. Salve-nos Francisco!
(MEDALHA DE BRONZE EM CRÔNICA NO JÚRI CIVIL)
PARA QUE SERVEM AS RELIGIÕES?
Religião – “conjunto determinado de crenças, de dogmas que definem a relação do homem com o sagrado; conjunto de práticas, de ritos específicos, próprios a cada uma dessas crenças; crença na existência de uma força ou forças sobrenaturais, considerada(s) como criadora(s) do Universo, e que como tal deve(m) ser adorada(s) e obedecida(s)”.
A origem da palavra é latina – relifio; discute-se, contudo, se o vocábulo provém de religar, o que dá ideia de ligação do homem com os deuses ou com o sagrado.
Como é fácil de depreender, as religiões têm seus estatuto e regimento, tal como qualquer corporação, civil ou militar. Embora a escolha de tal ou qual religião seja “democraticamente” fruto de escolha íntima, exige-se fidelidade às regras e doutrinas, do mesmo modo que as novas normas do nosso contexto político-partidário. Não convem, pois, trocas frequentes de crenças religiosas. Tanto como no âmbito das religiões como no terreno político-partidário, a expulsão do “partido religioso” está prevista, apenas designada, em alguns casos, por nomenclatura diferente.
Crenças, devoções, adorações, obediência e dogmas, são todos princípios ligados, conceitualmente, ao termo religião.
Nasceram as religiões com o homem posto aqui na terra. Fenômenos naturais, a princípio, e ícones depois, culminando com seres humanos finalmente, sempre compartilharam da fundação e da evolução das religiões. Relâmpagos, trovões, fases da lua, eclipses e cometas, fizeram nossos antepassados curvarem-se em adoração e temor, frente a tais avisos divinos, sagrados, indecifráveis. É de pasmar que aqueles homens, nascituros de primeira viagem, já idealizassem o temor como elo inicial de ligação com Deus – afinal, ligação ou afastamento? Parece que Deus nasceu “elitista” (afastado da plebe) e “padrasto”. Não queria ser amado, mas temido! Será isto crível, possível?
Mais tarde, com os homens reunidos em grupamentos sociais mais “adestrados e orquestrados”, surgiram as figuras, quase sempre ameaçadoras, representadas por animais selvagens e ferozes ou mistos de humanos e animais – eram os ícones a serem adorados pelo rebanho conduzido pelos “administradores do bem e do mal”.
Nas chamadas antigas civilizações, o politeísmo era a regra – assírios, babilônicos, fenícios, persas, egípcios, gregos e romanos, entre outras, tinham “fartura” de deuses para adorarem e reverenciarem; verdadeiros álbuns de escolhas divinas.
Cada civilização escolhia suas entidades sagradas, dando-lhes nomes variados. Curioso é o fato de que, independente da idade e do grau de aperfeiçoamento dos povos, foram os elementos da natureza e fatos e componentes acompanhantes do homem, os eleitos para adoração, haja vista – o sol, a terra, a lua, o fogo, a água, a caça, a guerra, o amor, a sabedoria, as confraternizações (diga-se bacanais), os eleitos para adoração. Fica clara a tendência dos povos fundadores das civilizações contemporâneas, na escolha e eleição de seus deuses.
Curioso e instigante a coexistência nessas antigas civilizações de alguns homens de rara inteligência e invulgar sabedoria, muitos inclusive fundadores de escolas de Matemática, Física, Astronomia, Filosofia e outras ciências e outros saberes, com populações inteiras curvadas a adorações sustentadas pela ignorância. Quem sabe teria aqui surgido a perversa “ocultação e impedimento” do acesso à educação e o aproveitamento da ignorância para introduzir manobras espúrias de submissão ao saber de poucos. Descobre-se o “poder do saber” para subjugar escravos moldados na ignorância. E a religião e a política aproveitam-se desse veio para o exercício do fascinante e ambicionado poder.
Como a esperteza é antiga nesse mundo, espertalhões e aproveitadores correm a ocupar seus tronos de poder. É a era dos sacerdotes, dos oráculos, dos magos, enfim, todos autodenominados emissários representantes dos deuses, com procuração para ajuizar sobre o bem e o mal, sobre a vida e a morte. Nunca ninguém viu qualquer documento assinado por Deus!
Em algumas civilizações, tais indivíduos tornaram-se mais fortes, respeitáveis e decisivos do que os próprios reis, imperadores ou outros mandatários supremos. Estes últimos nada faziam em ocasiões extremas, sem consultar os “iluminados” pelo divino, pelos deuses.
Enfraquecido o politeísmo, vão as religiões se consolidando em torno de um só Deus – instala-se o monoteísmo. Afinal poder dividido, repartido, não se compara ao poder concentrado em uma só entidade. Dissolve-se o parlamento das divindades religiosas e instala-se o presidencialismo em umas e a ditadura em outras religiões. Com um só Deus, bastaria um único “representante carnal” na terra para levar a cabo Suas determinações e orientações. Mais uma vez desconhece-se qualquer carta de nomeação desses representantes de Deus.
Todos os estatuto e regimento das religiões monoteístas têm princípios básicos comuns: o amor, a solidariedade, o perdão, a compaixão e a paz entre pessoas e povos e o mais fascinante e mágico - o encontro com Deus após a morte – oportunidade negada durante a vida. Que Deus perverso, não?
Ao longo dos séculos de consolidação e atração de adeptos às diversas religiões, o que se viu? Guerras, disputas sangrentas, traições, mortes e destruição patrocinadas por aquelas “santas” instituições religiosas. E tombam, em conflitos e massacres, católicos, protestantes e muçulmanos e a terra é adubada com o sangue de “fiéis” e “infiéis” – em nome de Deus! Controverso o exercício dos fundamentos das religiões – o amor entre as pessoas, a confraternização e a paz! Papas de um lado, líderes religiosos de representações diversas de outro, travam combates violentos e bárbaros (com contratação inclusive de mercenários) durante séculos em busca de prestígio, de poder e, inacreditável, de expansão territorial de seus domínios. Isto, e mais uma vez, a serviço de Deus. Caso realmente tais empreendimentos tivessem sido impostos aos representantes terrenos de Deus, ouso blasfemar (e pedindo perdão antecipado) dizendo que Ele escolheu mal seus emissários.
E não discorramos sobre a Inquisição, quando a “Gestapo” cristã arrancava das casas homens e mulheres e que, antes de sentenciados à morte, eram submetidos a ultrajantes, requintadas e bárbaras torturas. Muita vez a pena de morte era a mais cruel das conhecidas – a fogueira! Não tiveram os hereges da época nem direito à uma morte digna, menos sofrida! E Deus estava por trás dessas atrocidades, garantiam seus representantes.
Enquanto isso acontecia no Ocidente e no Oriente Médio, no Oriente Longínquo, outros deuses e figuras místicas vestidas (ou despidas) de pastores e avatares, mostravam às pessoas como encontrar-se com a transcendência. Para tal, a renúncia e o sacrifício eram fundamentais. Imagine-se desprezar o gosto pela vida, abdicar dos seus prazeres, todos presenteados por Deus! Pelo menos as religiões orientais (as mais longínquas) não pregavam a violência nos seus exercícios.
Séculos atravessados e pergunta-se: terminaram os conflitos? Qual nada. Estão mantidos e às claras, sem acobertamentos. As guerras santas continuam em marcha para alguns, agora mais cruéis, desumanas e desonestas que as de antes, pois não há confronto nítido e exclusivo entre facções - nas disputas, morrem ateus e politeístas, crianças, velhos e aleijados, que nada têm a ver com tais insanas demonstrações de fé.
Mais recentemente, e como a esperteza é imortal e cada vez mais se aperfeiçoa, surgem as “religiões” da crença nas contribuições dos fiéis. É a fé que, roubada dos incautos, enriquece e abastece os cofres dos “pastores”, não de almas, mas de bolsos e bolsas.
Ouso levar à consideração dos leitores duas linhas de manifestação religiosa: a primeira que cultua a “comunicação” com os que já se despediram desse nosso plano terreno (o espiritismo). Reunidos os adeptos em sessões silenciosas, ouvem e transmitem recados de almas serenas e aflitas. Nesse contexto, buscam reencontrar tranquilidades perdidas e abastecer seus espíritos para enfrentamento das vicissitudes existenciais. Outras, consideradas por muitos como seitas e não religiões propriamente ditas, originam-se, a maioria, se não todas e com seus desdobramentos, do continente africano. Mantêm o politeísmo, com entidades divinas inspiradas (a maioria) em elementos da natureza e muitas incluem sons, músicas e danças nos seus rituais. Estas, como a primeira, não propugnam por guerras e/ ou conflitos.
Não há dúvidas de que as religiões servem para alguma coisa; não é por outro motivo que estão aí desde a criação do mundo. Que cada um faça sua escolha e busque através de suas crenças, aprender e entender o que de melhor nelas existe. Fundamental, contudo, que crença e fé não se confundam com impermeáveis radicalismos.
De minha parte, e não sendo um especialista no assunto, apreciaria ver apenas uma religião dominante – a religião da consciência – sem a necessidade de apelos de perdão e de milagres a outrem. Cada um se responsabilizaria pela busca de ambos, sem intermediários, sem representantes de qualquer divindade ou entidade.
Você é o regente de sua religião.
(MEDALHA DE PRATA EM CRÔNICA NO JÚRI CIVIL)
SEMENTES APODRECIDAS
Há dois tipos principais de sementes: aquelas que não se desenvolvem por falta de cuidados ou porque implantadas em terreno inóspito, e um segundo tipo, que não desabrocha por defeito congênito. Ambas servirão para nada – portanto descartáveis.
As “sementes humanas” são assim – crianças mal cuidadas, crescidas em ambientes com referências e modelos de comportamento ético e moral desprezíveis, têm mais chances de se tornarem descartáveis no futuro. Desnecessário sublinhar que exceções não faltam. Do outro lado, há crianças que nascem e se desenvolvem carimbadas por índoles perversas e com especial atração para o mal; são sementes também descartáveis, pertencentes ao grupo congênito dessas espécies. É de se destacar que as primeiras têm mais probabilidades de se tornarem aproveitáveis que as últimas. As crônicas e os exemplos policiais dão conta do que digo.
Nesse momento atual de crescimento de visíveis inquietude e desequilíbrio sociais, despontam as sementes apodrecidas. E espalham o odor fétido da irracionalidade, da violência e da selvageria – é a nudez do ser humano que estamos cultivando em nossos laboratórios político-ideológicos.
É um misto de psicopatia urbana e ausência de metas e escolhas, fruto de déficits educacionais, frestas por onde penetram e invadem os oportunistas de plantão. É o terreno predileto dos ideólogos ativistas.
Afinal o que este país espera quando o próprio governo é o “Black blocs”? Há anos o governo está mascarado e mascarando seus indicadores de avanços sociais. Quem acredita em Lobão (o ex-ministro), Graça Foster, Ruy Falcão, Gilberto Carvalho, Aloysio Mercadante, Guido Mantega, Alexandre Padilha, José Eduardo Cardozo, Maria do Rosário, os três acovardados Chefes Militares, o presidente do Senado “senador Cabeleira” Renan Calheiros, e o mais “compacto” time corporativo da Câmara dos Deputados – brilhante quando joga duas partidas, no mesmo campo, com a mesma camisa e os mesmos “atletas” e novas regras de jogo. Haja máscara para esconder tantos abnegados brasileiros. O país podia anunciar cursos de alto nível, na área de maquiadores de dados, índices e realizações no campo político.
Quando cidadãos se reúnem para angariar recursos financeiros para saldar dívidas impostas pela justiça a criminosos descarados, é preferível ter à mão passaporte atualizado. Bem fez Manuel Bandeira que foi “embora para Pasárgada” . Quisera estar com ele.
Neste país, em que o povo é manipulado para que não se perca o poder dos ditadores travestidos de cinismo democrático, fica difícil encontrar luz nas urnas – mas o caminho é este! Aguardemos a Revolução do voto?
Enquanto a educação não chega para salvar, tapemos as narinas na tentativa de amenizar o odor da podridão e,
Oremos.
(MENÇÃO HONROSA EM CRÔNICA NO JÚRI CIVIL)
MINIBIOGRAFIA:
Fernando Bevilacqua nasceu aos 20 de abril de 1939. Antes dos 11 anos de idade manifestara o desejo de ser médico. Entrou no Colégio Militar do RJ (por concurso) em 1950 e saiu em 1956 após completar os cursos ginasial e científico. Em 1957 entrou na antiga FNM da UB (hoje UFRJ) classificado em 7º lugar no vestibular. Formou-se em 1962 e já em 1963 assumiu carreira docente na FCM da UERJ, tendo nesta instituição obtido o título de Docente-Livre em Clínica Médica (1970) e de Professor Titular de Clínica Propedêutica Médica (1979), ambos por concurso de títulos e provas. Em 1980 foi eleito Diretor da faculdade, cargo exercido por 4 anos. Foi Chefe do Departamento de Medicina da FCM por duas vezes, ocupando o cargo por dois anos em períodos distintos. Ocupou o cargo de Diretor Executivo da Associação Brasileira de Educação Médica (ABEM) ao longo do período de 1972-1979. Participou de várias comissões do MEC e da CAPES no âmbito acadêmico. Publicou dois livros didáticos – Manual do Exame Clínico (com 13 edições e reimpressões – de 1970 a 1984) e Manual de Fisiopatologia Clínica (com 6 edições e reimpressões – de 1973 a 1984. Hoje aposentado e parceiro da Natureza.
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FRANCISCO CÉSAR MONTEIRO GONDAR - FRANCISCO GONDAR (RIO DE JANEIRO - RJ)
PAZ
É o oposto do conflito:
sem castigo, sem maldade,
sem clemência de um grito,
onde mora a liberdade.
O contrário da tormenta,
a distância da amargura;
é esperança que acalenta,
a leveza e a candura.
É o momento que culmina,
a beleza que fascina
e de tudo puro amor.
Paz, antítese do malgrado,
é a ausência do pecado
na presença do SENHOR.
(MEDALHA DE PRATA EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
A Missão 180
A tropa estava formada no pátio e, a poucos metros, o navio-escola, que nos levaria para uma grande missão. A tropa era constituída de seleta equipe de fuzileiros navais, praças, marinheiros, alunos, cadetes do exército e guardas-marinhas e seria comandada pelo bravo tenente Jair, que, postado na janela do gabinete de comando e ladeado pelo seu superior, recebia suas últimas instruções.
O tenente era um sujeito muito “caxias”, rigoroso e ao mesmo tempo rabugento. Aborrecia-se com muita facilidade, tratava seus subordinados com aquele rigor do “sim, senhor”, tão expressado nos filmes americanos. Não sorria em hipótese alguma, não suportava risos, gracinhas e piadas.
Naquela posição privilegiada e estratégica, o tenente Jair, por diversas vezes, já havia contado numericamente todo o grupo, somando sempre 179 homens e, por essa razão, quando desceu do gabinete de comando para o pátio, já foi aborrecido gritando furioso:
– Essa missão deve ser composta por 180 homens e está faltando um elemento atrasadinho. Deve ser uma boneca que está se enfeitando toda e não vou tolerar esse tipo de comportamento durante nossa missão, fui claro??? E ouviu-se um sonoro e uníssono “Sim, Senhor!!!”
– Sargento!! – Gritou o tenente.
– Sim, senhor! – Apresentou-se o sargento.
– Confira a lista, faça uma chamada ligeira e veja quem está faltando.
– Sim, senhor!
E depois da chamada e da contagem, o sargento respondeu:
– Conferida a lista e contagem. Não falta ninguém, senhor.
– Sargento, não duvide de minha palavra. Eu sei contar. – E em seguida deu uma ordem em alto grito. – Formar por altura, façam um retângulo, vou contá-los um a um, pois o sargento fugiu da escola.
Naquela ocasião o sargento dirigiu-se ao tenente para falar alguma coisa ao pé do ouvido, e o tenente replicou:
– Não me interrompa, sargento!!!
O tenente Jair colocou todos em forma retangular, contou um a um, multiplicou um lado pelo outro e ao final somou 179 homens.
E novamente o tenente voltou a gritar:
– Está faltando um homem que, certamente, não é cumpridor de seus deveres como cidadão, não tem amor à pátria, não tem responsabilidade...
E nesse momento o sargento tentou novamente dirigir a palavra, mas o tenente furioso replicou:
– Sargento, pela última vez, não me interrompa. E logo em seguida gritou
- Formar por categoria, praças, marujos, subalternos, alunos, cadetes, guardas marinhas.
O tenente verificou rapidamente a quantidade de cada um e, ao final, somou mais uma vez 179 homens. Dessa vez se desesperou gritando:
– Nossa missão foi toda pesquisada, analisada e estudada para ser composta por 180 homens, e está faltando um elemento covarde, desertor, que não honra a sua farda, que não honra as calças que veste, indigno e traidor da pátria.
De tanto gritar, o tenente engasgou com a própria saliva e foi a oportunidade que o sargento teve de sair de formatura rapidamente, aproximar-se do tenente e sussurrar em seu ouvido:
– Tenente, esse “um” que está faltando é o senhor.
Naquele momento, o tenente Jair, que engasgara com a própria saliva, permaneceu calado por alguns segundos e certamente, em silêncio, no alto de sua estupidez, refletiu: “A missão tem 180 homens e eu só posso contar 179, porque o “cento e oitenta” sou eu.”
É evidente, que logo após o sussurro do sargento, não foi possível evitar alguns risinhos da insólita plateia, que assistia a tudo calada.
E o tenente Jair, para não perder a pose, gritou:
– O Brasil espera que cada um cumpra o seu dever! – Com a voz embargada, continuou gritando – Não podemos perder mais tempo esperando por ninguém. Agora, só nos cabe cumprir esta missão. Eu me sacrifico e me disponho a preencher essa lacuna. Todos para bordo!!!
LUZ
Haja luz, mister poder,
o caminho da esperança,
um clarão que tanto alcança
a virtude e o saber
Uma força, que esclarece,
bem fascina e exalta
nossa vida na ribalta,
onde o amor jamais perece.
Luz se estende no espaço,
vence sempre o vil cansaço
e exaure o sofrimento.
Essa luz que cura a chaga
vem de DEUS, jamais se apaga
no seu grande firmamento.
Na imensidão do infinito
No decorrer dos anos 1930, em uma pequena ilha do Pacífico, vivia um garoto muito simples e sonhador, com nove anos de idade, chamado Felinto, e filho de um humilde lavrador. Diariamente Felinto visitava a praia e contemplava a imensidão das águas, o horizonte, fitando o ponto de encontro entre o céu e o mar. Seria a casa de DEUS? Seria o paraíso para onde vão pessoas boas? Assim indagava para si aquela inocente criança.
Não tardou muito, ao completar 18 anos, entrou para a escola de grumetes, conhecendo o mar e formando-se um bom marinheiro mercante. Os anos se passaram, Felinto amadureceu e cresceu na profissão e, certa vez, estava ele a bordo de um navio carregado de cereais, em Porto Limom, pronto para zarpar com destino ao Hemisfério Norte.
O navio era muito velho, estava bem carregado; as previsões meteorológicas não eram boas. Havia rumores da presença de um “Huricane” nas proximidades; enfim, um navio velho, com carga em excesso, aquela viagem seria uma temeridade. Contudo, a maior coragem do marinheiro é enfrentar seu medo e entender que sua atividade é mais do que uma profissão; é sim uma nobre missão de transportar riquezas, unindo duas ou mais nações.
Os dois primeiros dias de viagem foram parcialmente calmos. Entretanto, ao terceiro dia o vento começou a soprar cada vez mais forte, as ondas cresceram, o mar se revoltou, os embates de grandes massas de água contra o casco eram cada vez mais intensas e mais frequentes, os rebites do costado já não suportavam toda aquela força, as chapas começaram a ceder, os porões começaram a fazer água e, com isso, a carga de cereais foi se inchando a tal ponto de comprometer a estabilidade e a flutuabilidade do navio.
Naquela época não havia muitos recursos para um abandono, até mesmo as embarcações salva-vidas eram perigosas para serem utilizadas naquelas condições. Entretanto, antes que alguma providência fosse tomada, o navio emborcou, uma parte ficou submergida, depois se partiu em dois pedaços, e o desespero foi total.
Alguns tripulantes lançaram-se n’água, outros alcançaram uma balsa salva-vidas, outros não tiveram a mesma sorte e nosso amigo Felinto, tão vocacionado para o mar, viu-se nadando em meio às águas turbulentas, sem coletes, sem boias e somente com a fé que tinha em seu coração. Nadou por horas, orou a DEUS, clamou por sua vida e, no meio daquela noite escura e tempestuosa, subitamente agarrou-se a um objeto resistente, flutuante, posicionou-se sobre ele e ali permaneceu, deitado, agarrado, na esperança de avistar alguns de seus companheiros.
O tempo passou, o mar acalmou, Felinto adormeceu esgotado e, no crepúsculo de um novo dia, ao abrir os olhos Felinto, quase sem forças, contemplou o universo em sua volta. Quase prostrado, observou a imensidão do infinito que tanto admirava quando criança. O esgotamento total tomou conta de Felinto; hipotermia, sede e inanição poderiam matá-lo em poucas horas, mas pela força divina ele foi resgatado pela guarda costeira e prontamente levado a um hopital local.
Dois dias depois, ainda sedado e com alguma confusão mental, Felinto recobrou os sentidos e lembrou-se do acidente com seu navio. Perguntou pelos seus companheiros, alguns sobreviventes avistou na mesma enfermaria e, ao lado da cabeceira de seu leito, uma foto estranha, um recorte de jornal, que exibia uma grande tartaruga.
Felinto nada compreendeu quando seu leito foi rodeado de repórteres que conversavam com os médicos na língua inglesa, muito estranha e complicada para o pobre Felinto entender.
Mais tarde, o cônsul honorário de seu país foi visitá-lo, conversou com ele e disse ter sido protagonista de uma das histórias mais extraordinárias que poderia acontecer. Felinto, a princípio, não entendeu do que se tratava, mas na verdade ele foi resgatado pela guarda costeira, quase desfalecido, sobre uma grande tartaruga marinha, não muito frequente naquela área de mar. O tal objeto flutuante, com o qual Felinto se agarrou e sobre o qual adormeceu de extremo cansaço, nada mais era do que o casco de uma tartaruga gigante que o salvou daquele triste naufrágio.
Felinto chorou, murmurou palavras soltas, levantou-se com dificuldade, dirigiu-se para uma janela da enfermaria, contemplou o céu na sua imensidão infinita e agradeceu a DEUS pela sua vida. Lembrou-se dos momentos felizes de infância , entendeu sua nobre missão e prometeu para si mesmo voltar a navegar, na esperança de um dia, quem sabe, encontrar o paraíso, justamente aquele ponto em que o céu se encontra com o mar.
(MEDALHA DE PRATA EM HISTÓRIA MILITAR NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE PRATA EM HISTÓRIA MILITAR NO JÚRI MILITAR)
MINIBIOGRAFIA:
Francisco Gondar é Titular da Academia brasileira de Medalhística Militar, cadeira de número (11), de Patrono Marechal Rondon. Membro efetivo da Academia de Letras do Rio de Janeiro, cadeira número (09) Nilo de Freitas Bruzzi e Vice presidente de Honra da Divine Academia Francesa de Artes, Letras e Cultura. Membro Representante da Academia de Cabo Frio (ARTPOP). Nomeado Acadêmico Honorário da Academia Buziana de Letras. (Búzios).
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HELENICE MARIA REIS ROCHA (BELO HORIZONTE - MG)
Tempo
Em meio ao canto do vento
assobio uma polifonia
danço lentamente em passos leves
vinte anos se passaram
sou uma anciã
tenho uma dúbia carnação de anciã
e a palavra
mais do que imaginei
Uma geometria de luz batiza meu quarto
assobio uma polifonia com o vento
os anos me deixaram a palavra
o som de uma sinfonia
e o leve rumor de uma saudade
ODE ÀS MÃES DAS RUAS
entre as ruas
vejo nuas as cores e luas
brincantes cantando blues roucos
para loucos amantes
das ruas,tão nuas,tão cruas
bendito é o grito bêbado dos loucos
dos poucos áridos mendigantes
em filias cruas
de restos poucos
bendito é o grito louco
da mulher que procura o filho na lista e não acha
bendito é o grito pouco,quase mudo,
da mulher que sonha o flilho, morto
bendito é o grito,o rito, o sonho da mulher que busca o filho morto
e num sonho mudo e num sonho descobre onde ele está
Natal
Um cordeiro desesperado
urra o sacro ofício dos santos
e a dor secreta dos sacrificados
ecoa pelos quatro cantos
Tempos Idos
O tempo rasga a pele de um grito
O Povo!Unido! Jamais será vencido!
estou correndo na avenida Afonso Pena
A pele de um rito se faz presente
Hora do café matinal
Bença!Pai!
Tinha passado a noite inteira fazendo música
Foi cadete e saiu tuberculoso da caserna
com vinte e um anos
Deram baixa nele
Falou a vida inteira
Eu sou um soldado
Tenente Aluísio
Engenheiro Civil e Músico
Projetou estradas estratégicas como Servidor Público
Ao meu pai,a minha continência
MINIBIOGRAFIA:
Helenice Maria Reis Rocha é Mestre em Letras pela UFMG, Especialista em Música pela UFMG, Membro do círculo de Embaixadores da PAZ de Genebra, Cônsul de Poetas del mundo ZSSE BH MG BRASIL. Publicações em congressos da ABRALIC, em Antologias de Poesia no BRASIL e no Chile, Tendo cursado também Violão Clássico com Nelson Piló e Walter Alves e acordeon com Elias Salomé. Filha do concertista de Harmônica de Boca Aluísio Rocha e da Cantora Ondina dos Reis Rocha com quem tive a honra de trabalhar por toda a vida como assistente. Fez o Mestrado em tradições da oralidade, tradições estas que já conhecia por ouvir Ondina cantar. Trabalhou com análise musical por vinte anos com Aluísio.
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HELOISA HELENA CRESPO HENRIQUES - HELOISA CRESPO (CAMPOS DOS GOYTACAZES - RJ)
PAIXÃO VIVA
O meu amor pelo Rio
é intenso e grandioso.
E data de longo tempo.
Eu só não sou carioca
porque ali não nasci.
Vim ao mundo em outra cidade,
talvez quase da idade
do meu Rio quatrocentão,
em Campos dos Goytacazes.
O Rio me emociona.
É fonte de inspiração
para os versos que escrevo,
declarando o meu amor,
descrevendo a sua história,
enaltecendo os seus feitos,
louvando a sua beleza
que adoro, exalto e cultuo,
chegando à veneração!
Ah, meu Rio de Janeiro,
‘Cidade Maravilhosa’,
refúgio do meu amor!
A Garota do Rio
Ao Rio de Janeiro – 450 anos
permanece enfeitando
a paisagem carioca,
cotidianamente,
chova ou faça sol,
na terra de Tom Jobim
e Vinicius de Moraes,
deitada ‘eternamente em berço esplêndido’,
num ponto estratégico em que é vista
como pano de fundo de Ipanema.
De fato, ela por direito
é a ‘Garota de Ipanema’,
esculpida no olhar
de quem a vê bem distante
num belo encontro de imagens
entre dois formosos montes.
Seus olhos contemplam o céu
em incessante oração
pela cidade onde mora.
Os seios seduzem o mundo,
não só o Rio e o Brasil.
Os turistas sequiosos
desejam vê-la de perto.
É um espetáculo mágico!
Não saberia viver
sem o meu verso por perto.
Ele é a minha oração,
o meu primeiro alimento,
a razão da minha vida.
Desde o dia em que chegou,
nunca mais saiu de mim,
do meu corpo, da minh’alma.
Vive dentro, nas entranhas,
no sangue, no coração,
no sentimento mais puro,
mais impuro, confessável.
E inconfessável também...
Não sei se ele sou eu...
ou o inverso, por certo!
Não saberia viver
sem o meu verso por perto.
Ele é... a minha voz.
É a voz da criança sofrida,
do mestre desrespeitado,
do analfabeto vivente,
da seca não resolvida,
do discurso incoerente,
do prédio abandonado,
do rio que morre aos poucos,
da mata queimada viva,
da mina dinamitada,
do caminho enlameado,
da mulher violentada,
do torturador covarde,
do ativista que tortura,
do político corruto,
do populismo de máscara,
do andarilho faminto,
da casa na enxurrada,
do animal deixado só,
do idoso não respeitado,
do criminoso impune,
da prisão abarrotada,
do ferido pela bala,
do preso que não trabalha,
do lixo humano nas ruas,
da lei direcionada,
do homem da lei que mente,
dos direitos violados...
Eu sou um poeta apenas...
Minha voz não é ouvida!
AS PEDRAS DO MEU CAMINHO
Retirei do meu caminho as pedras que encontrava.
O caminho era tão longo, com subidas, muitas curvas
e com retas infindáveis...
As pedras bem pequeninas, nem sequer me atrapalhavam.
No meu sonho de menina, muitas vezes as escolhia
pra brincar de Três Marias.
Algumas com os próprios pés, ali eu as empurrava.
Outras com as minhas mãos para bem longe arremessava.
Dependendo do tamanho,
removia para os lados, deixando livre a passagem.
As maiores, mais pesadas, do lugar não arredava.
Eu apenas desviava,
continuando o caminho, seguindo firme, com fé
para a reta de chegada. Ainda hoje eu caminho.
As pedras não me atrapalham...
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
MINIBIOGRAFIA:
Heloisa Crespo é Pedagoga, terapeuta em Reiki, poeta, com livros publicados: “Sonho e Liberdade”, “A voz que não quer calar”, "Antologia dos poetas e prosadores da Academia Pedralva Letras e Artes (organização e participação), "Opúsculos de poesia de cordel" (mais de 45) e vários trabalhos publicados em antologias, agendas, jornais, revistas literárias, sites, blogs e órgãos da imprensa de Campos dos Goytacazes/RJ.
Membro efetivo da Academia Campista de Letras, da Academia Pedralva Letras e Artes e do Instituto Histórico e Geográfico de Campos dos Goytacazes.
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HELOÍSA PRATA E PRAZERES - HELOÍSA PRAZERES (SALVADOR - BA)
TRABALHOS DE BASTIDOR
Se há o dia a dia comezinho,
também há o ofício do registro,
que sustém no ápice a humanidade.
Milagres se confirmam nos reencontros,
pois pessoas perduram nos trajetos,
nos lances e enredos ordinários.
Será este o drible pobre dos dias?
Buscarei histórias, fixarei fatos
e memórias. Vou agir calada
e lentamente para exaltar,
bem aqui, no silêncio da edição.
Farei outro conto, precioso rapto
de risco imediato e consequente.
Ânimo, fios e tramas soberanas,
em batidas seguidas de teclas mestras.
Se a amiga foi a inverso porto,
se pariu varão que lhe deu a neta,
Beatriz; se a outra, lá no exílio,
perdeu a mãe longeva e tão distante
estava, que não lhe alcançou dar terra.
Narrarei para testemunhar, o que
talvez se possa esconder da morte.
Este é o signo e o sentimento do poeta.
ENGENHO E ARTE
O meu lugar tranquilo é a janela
por onde respiro as cores da tarde,
se pressinto invasão ao casulo,
faço a posse do todo por fraude.
Deixo fluir a fonte da linguagem,
povoo os vazios do nada,
e a borboleta bate asas.
A mente ilumina o ato herético,
libérrimo, sutil e pecador,
que fere as camadas da memória
e fecunda o simulacro da dor.
Fixo a gama de folhas e ervas,
opero o engenho e a cópia da cor,
na passagem do excesso para o verso.
CASA ABANDONADA
Sôbolos rios que vão
por Babilónia, me achei,
Onde sentado chorei
as lembranças de Sião
Luís Vaz de Camões
Haverá subsistência,
peripécia em terra alheia,
ou apenas a função
da imorredoura saudade?
Primeiro a dispersão,
a migração e a perda:
nova estirpe estrangeira
de um para outro estado.
Desconhecido destino,
nas pegadas de Sumé,
multidão de exilados.
Dali a lugar seguinte,
em busca do Eldorado
ou do civilizador.
Acharam adoecimentos
e riscos. Corpos robustos,
arriados, amplos, secos
em andaduras para o nada.
Assim foi na minha família:
avós deixaram seus lares,
terras, posses e pessoas,
via Sul, próximo estado.
Dali para o Eldorado,
bando incerto de arrojados:
diáspora de emigrados
(MEDALHA DE BRONZE EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
NEVASCA
Quando ocorrer o truque que planejo,
na estação que sucede o outono,
verei o rio em seu estado sólido
sobre veios e fios caudalosos.
Por debaixo das placas congeladas
fluem as águas mornas da reserva,
que silenciosas e contínuas seguem,
prateando os matizes da paisagem.
Espalharei da alvura, lá fora,
aglomerados de cristais unidos,
roubando da cena, com intenção,
as camadas dos flocos sobre o chão.
Reunidos, atrelarei ao gelo
bocados de ciladas e memórias
vívidas emoções e as lembranças,
preservando a friagem na linguagem.
ESCREVER POR PINCÉIS
O meu espaço de paz eu o construo
mirando o luxo do verde lá fora
mas se anoto esses matizes
fraudo imagens a cada hora
com pincéis gastos e rotos.
Se rapto e possuo
os panos da mata
da memória
capto um mundo
que não me pertence.
Quando ocorre o interdito
onde vigem fluxos livres
atravesso camadas de resguardo
estanque na cena do crime da mimese.
MENSAGEIROS
Hermes plana alado e invisível,
traça projetos no espaço efêmero,
proclama e acumplicia ao ar do tempo.
Rebenta larvas, liberta palavras,
e ecoa a voz no Finisterra;
empurra o mal que tudo devassa,
ata e matiza os panos do mundo.
Mercúrio é o dono do aviso, veículo,
lícito, de purgação. Voz da afásica
anônima e pálida pessoa.
Emissário que adverte e voa,
assusta e assombra Vulcano;
reporta vidas, cenários e leis,
seu ofício sobeja nos esconsos
da lembrança que exalta os seus labores
de estafeta do universo.
POEMA PARA MEUS AMIGOS
Vi a teimosia das flores do deserto
nas altiplanas montanhas de Nevada
vi-a por mim e por muitos
olhos ausentes
que creem no milagre
do equilíbrio improvável.
Há cores ternas no solo desidratado,
neste ano eu as vi por muitos de nós.
A UM POETA
Sim, mestre, há a cilada
e também passo inexato,
há a certeza do medo nos espelhos,
tocaias inesperadas.
Há o risco da cegueira
a uma simples piscadela.
Apoiados à janela
a paisagem é irretocável.
Lancemos o balde
ao poço sem fundo
à memória imorredoira
porque, irmão, é provável.
Sim, amigo, é quase nada,
a reserva é escassa.
Resta ainda reunir os peixes
dispersos pelas fomes insaciáveis.
MINIBIOGRAFIA:
Heloísa Prazeres nasceu a 21/06/1946 em Itabuna, BA. Ensaísta, citada no Dicionário de Autores Baianos. Salvador: SECULT, 2006, e no Dicionário de Escritores Contemporâneos da Bahia, CEPA, 2015. Publica em livros, revistas especializadas, periódicos e sítios eletrônicos. Organiza, prefacia e atua como consultora editorial, revisora, tradutora e poeta. PRAZERES, Heloísa. Temas e teimas em narrativas baianas do Centro-Sul, Ensaio. FCJA; UNIFACS; SECULT, 2000. Antologia Outros Riscos – POESIA. Do Prêmio Damário Da Cruz de Poesia. Salvador: FPC/ SecultBA e Quarteto Edit., 2013. PRAZERES, Heloísa. Pequena História, poemas selecionados. Salvador: Quarteto, 2014. PRAZERES, Heloísa, Poetas da Bahia, III. Joaquina L. Leite (org.). Salvador: Expogeo, 2015.
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isabel SPRENGER RIBAS (CURITIBA - PR)
Utopia
Pela caricia que a minha mão fazia
De leve, com zelo, cuidado, infinita doçura,
Sobre seu rosto amado, o da fotografia,
Onde a vastidão da minha ternura repercutia,
Era você que eu chamava... e que chegava.
Aprisionado, agora, se tornava estanque...
Mas era a minha ilusão, era uma utopia,
A você eu não segurava. Fugia!
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
São João e a História de Amor!
...A fogueira de São João, ela, belas tranças
Então pulava, jovem e tão lindinha,
Que faceira e dengosa, para lá e para cá
Encantava o Soldadinho, ali parado,
E embasbacado. De amor pela mocinha!
Chega então, garboso, o belo Capitão,
Deslumbrado e que bem desfruta
A bela, feminina e tão perfeita visão.
Dá umas ordens, sereno...
Interrompe a brincadeira e apaixonado,
Pela cintura segura a menina, fascinada,
Que vai entregue e deliciada
Com o amor que pela mão a leva.
Foi-se o tempo e essa mocinha,
Hoje é mulher casada!
E o soldado cresceu na vida.
Hoje é um grande Magistrado.
E o Capitão? Plenamente realizado!
(MEDALHA DE OURO EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
Desejo X Conflito
... lamacento lamento que sobrepuja em meu ser,
o poder, o querer tanto ou o imaginar-me com direito.
... e que unguento é este que vasa na ferida do peito,
nada cura (?) escorre liquido, esvaído, pois já vai lento...
... ainda assim, inválido diz, afirma, que o meu Sonho é perfeito!
e que dentro dele, sim, sim, é tudo muito direito.
... luta tenaz, esta, entre desejo e o meu conflito.
perdido tempo, pois nada, nada, nada, tem jeito...
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
Casa de Comando
Lindas lembranças,
São as que retém,
Suas ousadas paredes,
Bem cuidados jardins...
E no tempo vivido,
Juntinho aos Quartéis,
Esteve plena de vida,
A família feliz
De quem ali habitou...
Por certo e sem dúvida
De algum Militar
Que planejou, programou...
E sobre os esforços de outros,
Que ali estiveram,
Acumulado e gigante
Deixou grandioso outro tanto,
De boas, profícuas e novas ações
Sobre o tudo o que de feito.
Por lá já encontrou!!!!!!!
MINIBIOGRAFIA:
isabel Sprenger Ribas, de Paranaguá, Paraná, Brasil. Escritora e Pintora. Reside em Curitiba, Licenciada em Filosofia, PUC. Casada, possui três filhos, duas noras e quatro netos. É concursada e aposentada pelo IPEA/ Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República como Técnica em Planejamento e Pesquisa, Brasília, onde viveu por vinte anos. Publicações: Cinco livros solo; Várias participações em Antologias: Poesia do Brasil. Proyeto Cultural Sur–Brasil por sete anos consecutivos, incluído ano de 2016, a publicar; Antologia do Jubileu de Diamante do CPFC em 2010 e inúmeros Opúsculos. Participação em Revistas Virtuais: eisINFLUÊNCIAS, Portugal Brasil e na Revista Virtual Carlos Zemek ARTE E CULTURA. Considera o Amor a inesgotável fonte para efetivar a compreensão entre a raça humana. Nome literário: isabel (letra minúscula) Sprenger Ribas. Endereço eletrônico; sprengerribas@uol.com.br
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IVONE BOECHAT (NITERÓI - RJ)
Pai é modelo
Pai é responsável, sim,
ao dar exemplo para o filho,
é espelho onde se mira
o pequenino;
pai é caminho, retorno, senha,
farol e brilho
na estrada até o fim:
na palavra, nos gestos, no comportamento,
nos amigos que tem, no ensino...
Pai é matriz de fé,
primeira pista
do segredo de amar,
adorno da educação,
quando conquista,
com muita luta e oração,
o seu devido lugar...
Criança esperança
A esperança desta pátria,
que, até hoje,
não se reconheceu
tão linda e potente,
está depositada
aos pés do Senhor,
de olhos fixos em você,
criança;
abandonada, discriminada,
sofrida, analfabeta e sozinha,
levante-se do chão,
ao desalento,
desfralde a bandeira
desta nação,
corra todos os riscos
para que o idoso
de sua geração,
não fique suplicando,
sem alento
na porta dos hospitais,
sem voz,
o socorro que não chegou
a tempo para nós....
Por favor,
faça melhor do que
seus avós,
seus pais,
ame profundamente
esta terra,
pode-se
promover a paz,
em qualquer idade,
não permita
que a corrupção
ganhe esta guerra
e saia na frente
altaneira e resoluta,
como se fosse
uma virtude
a impunidade.
Ficar velho
Ficar velho é
enguiçar o sonho,
o propósito,
a capacidade de criar.
Ficar velho é
deixar morrer o
pensamento novo
que não pára de
gritar...
Ficar velho é
correr em sentido contrário
das belezas da vida,
sustentando aquela
antiga ferida;
ficar velho é
entregar os pontos,
desistir,
calar...
Ficar velho é
não querer
enxergar a oportunidade,
tapar o sol com a peneira,
ao invés de recriar
a idade,
perseguindo a novidade,
seguir em frente,
lutar.
O Natal existe!
Vamos supor que nada do que os homens acreditam sobre o Natal fosse verdade?
Que tudo aquilo que os profetas disseram sobre o nascimento de Jesus, indicando até o local, era somente uma historinha pra nenhum boi dormir na estrebaria mais bonita do mundo. Que o coral de anjos nos céus de Belém, cantando a sinfonia maravilhosa, cuja letra a humanidade inteira sabe cantar (quem não canta é porque não quer, mas sabe) era somente para assustar e desmaiar pastores no campo...
Vamos supor que os reis magos, vindos de muito longe, do oriente, talvez de Bagdá, carregando presentes caríssimos, era uma propina e que esses cientistas pesquisadores queriam somente passear, usurpando verbas, em jurisdição alheia, nas barbas de outro rei.
Vamos supor que a fuga da família para o Egito era somente uma excursão para gastar as milhas acumuladas no lombo do burrinho de Nazaré a Jerusalém. Ou que Herodes decretou a matança das crianças só para agradar os aliados da base do seu governo.
Vamos supor que a Escola que Jesus fundou na Galiléia com educação presencial e virtual, com módulos para o ensino à distância, escrito pelos alunos ou que a sua preocupação ao mostrar a importância do uso correto da rede (web) ensinando a acessar, convidando a Pedro Tiago e João para o seu twiter (segue-me...) ensinando a Pedro a se ligar ao provedor, dando-lhe a senha (Tudo o que ligares na terra...) foi só uma coincidência com a linguagem virtual de hoje.
Vamos supor que o sermão do monte era uma tese de doutorado, nada mais, e que os valores ensinados eram somente a oportunidade para implantar a merenda escolar, a cesta básica, o vale refeição, o exercício do Pai Nosso supervisionado.
Vamos supor que as curas maravilhosas, que não foram o foco principal do ministério de Jesus, mas sim o Seu plano de salvação, serviram somente para atiçar a inveja dos políticos milagreiros e que a cruz foi a sentença por um crime político de traição ao poder dos governantes. Se tudo isso fosse uma metáfora, se vivêssemos só esperando a felicidade e a recompensa na Terra, se não pudéssemos comemorar o Natal, porque Jesus não é o Salvador prometido, é um filósofo famoso, com jornada acadêmica encerrada, então poderíamos parafrasear o Apóstolo Paulo:
“Se esperamos em Cristo só nesta vida, somos os mais miseráveis de todos os homens”.
I Coríntios 15:9
(MEDALHA DE OURO EM CRÔNICA NO JÚRI MILITAR)
MINIBIOGRAFIA:
Ivone Boechat é natural do Estado do Rio; Membro da Academia
Duquecaxiense de Letras e Artes de Duque
de Caxias-RJ; Educadora; Recebeu a Medalha" Lux in Tenebris" do Sindicato dos Professores do Estado do Rio de Janeiro; Autora de 16 livros; PhD - Psicologia Educação; Consultora em Educação.
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JOÃO VIDEIRA SANTOS (LUÍS EDUARDO MAGALHÃES - BA)
sou louco
sou louco.
dizem para aí.
eu sei.
não corro,
não fujo,
não procuro socorro.
sou louco.
dizem.
chicoteiam as faces da alma
vazia de penumbra.
sou louco.
dizem.
não emendo
na procura duma consolação,
não vivo
procurando a evasão
de esquecer
o que dizem.
sou louco.
dizem.
...porque quero ter sombras na parede.
sou tudo.
uma besta - tudo neles,
que passam, riem, comentam e dizem:
é louco!
caminho mais só, sem dó deles.
...mas louco sem loucura não é louco.
...e sinto desejo profundo, digo mesmo:
louco é o mundo que caminha a esmo!
ser verde
ser verde…
ser antes o que é maduro,
ser a cor da natureza,
florir verde...
ser harmonia,
ser mata, floresta,
o imenso amazonas.
ser verde...
ser verde na mudança,
respirar o mundo,
a cor da esperança.
cismo
cismo teorias,
regras
e penso...
penso...
exorciso culpas
negligências,
indecisões
e reflito...
longo é o caminho
onde o perfeito se conjuga...
na razão do meu canto
na razão do meu canto
onde voam infinitos,
há um pássaro que canta,
um sol que desponta
no grito da liberdade...
MINIBIOGRAFIA:
João Videira Santos, é português, nasceu em Lisboa, Portugal.
Reside, actualmente, no Brasil, em Luis Eduardo Magalhães, Bahia.
É considerado um dos poetas da língua portuguesa que melhor sintetiza a poesia.
Para além da poesia, é artista plástico estando a sua obra representada em colecções
particulares em Portugal e no estrangeiro, bem como no do acervo de Camaras
Municipais portuguesas.
A sua poesia encontra-se editada em livro em Portugal, Espanha e Brasil.
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JOSEVÂNIO ALMEIDA DE ARAÚJO (NITERÓI - RJ)
Soneto decassílabo a Florbela descansando em Évora
Àquela cujo olhar se desfez cedo...
Àquela aos cinco lustros enterrada...
eu deixo aqui meu simples arremedo
como um soneto à flor bela espancada.
Apeles teve morte protestada
por ti, conquanto o frio e final dedo
da fouce fosse inapelável fada
ao fado dado ao teu irmão iledo.
Já morta tu moraste em Matosinhos,
mas, inquieta, a Évora os caminhos
buscaste insatisfeita e ressequida.
Évora foi o teu último lar,
e hoje não mais importa o vil falar
do povo a não cuidar da própria vida.
(MEDALHA DE BRONZE EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE PRATA EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
A única vez em que o Troféu Joan Gamper saiu da Europa
O Sport Club Internacional possui em seu currículo um título que apenas ele, na condição de clube não europeu, conseguiu: o Troféu Joan Gamper de 1982, anualmente organizado pelo catalão Futbol Club Barcelona no mês de agosto, no Estádio Camp Nou, marcando o princípio da temporada na Espanha. O nome do troféu é uma homenagem ao primeiro presidente do Barça, o suíço Hans Gamper, que acabou conhecido pela alcunha que dá nome ao torneio.
No torneio cuja disputa envolvia quatro clubes até 1996, num sistema eliminatório de confronto simples (havendo cinco cobranças de pênaltis alternadas em caso de empate), o sorteio apontou o Barcelona como adversário primeiro do Colorado. Os demais clubes para a disputa do torneio foram o alemão Fussball Club Köln (Colônia) e o inglês Manchester City Football Club.
Então, para orgulho do clube brasileiro, sua equipe, na primeira das duas partidas que disputou, eliminou os donos da casa. Detalhe: o Barça contava com a estreia do alemão Schuster, do espanhol do momento Quini e do astro argentino Diego Armando Maradona, atleta que se tornaria o destaque-mor da Copa do Mundo de 1986, ao ser o maestro do inolvidável (e por ora último) título da seleção hermana. A partida, segundo o jornal espanhol El Mundo Deportivo, foi muito pobre tecnicamente, o que frustrou o estádio Camp Nou lotado.
De fato, o embate entre Barcelona e Inter não saiu do zero, uma vez que este deu prioridade à defesa, arriscando-se mui pouco a ir ao ataque, ao passo que o oponente, apesar do início de jogo arrasador, logo se viu envolvido pelo esquema dos brasileiros. Na segunda etapa, a tônica mudou um pouco: conquanto duas bolas hajam sido desferidas à trave colorada e uma contra a dos catalães, o restante do tempo final foi de marcação forte, o que conduziu as equipes à disputa por penalidades máximas. Como resultado, pelo lado da equipe catalã, apenas Maradona converteu a sua oportunidade, sendo que quem desperdiçou a cobrança foram os dois outros craques citados; pela equipe colorada todas as cobranças foram parar no fundo das redes do oponente azul-grená, sendo estes os heróis respectivos: André Luiz; Ademir Kaefer; Rubén Paz e Andrezinho.
É bom frisar que a equipe brasileira falava em revanche, uma vez que poucos dias antes perdera um jogo para o Barça por 1 a 0, pelo Torneio Teresa Herrera, em La Coruña. Seria apenas mais uma partida de futebol, caso nos olvidássemos da fala de cada um dos treinadores antes do segundo embate: o colorado Ernesto Guedes criticara a arbitragem, ao passo que Udo Lattek, do clube catalão, dissera que o azul-grená derrotaria o Internacional quantas vezes o encontrasse pelo caminho.
O outro embate pela primeira fase terminou com empate por 1 a 1, o que culminou igualmente na cobrança alternada de pênaltis vencida pelo clube inglês. O mesmo meio de comunicação citado anteriormente lembrou que Barcelona e Colônia, os dois grandes favoritos ao título, iriam de fato se enfrentar, mas na disputa do prêmio de consolação: o terceiro lugar.
Na partida preliminar pela medalha de bronze, o Barcelona saiu perdendo para o clube alemão com gol de Engels, mas empatou ainda no primeiro tempo, com tento anotado por Maradona. Mais um empate se deu, e nova disputa por pênaltis nasceu, com vitória do clube da Catalunha por 5 a 4. Despedida invicta (como o esperado...), mas melancólica para os donos da casa. Dois empates em dois jogos...
Já na final, o Inter não deixou dúvidas de que merecia o título, visto que derrotou os ingleses por 3 a 1. Iniciou a partida pressionando o adversário no primeiro tempo, ao passo que o Manchester City no mesmo período somente o ameaçou uma vez. Aos 12 minutos, após pênalti sofrido por Cleo, Edevaldo fez 1 a 0 para o Colorado. Três minutos depois, depois de troca de passes com Silvinho, Paulo César marcou o segundo. Aos 37, já com onze atletas contra dez dos britânicos (pois Hartford fora expulso por agressão), Fernando Roberto marcou após rebote em chute de Silvinho. Aos 41 minutos, MacDonald de cabeça, em cobrança de escanteio, descontou. André Luís, capitão do time que antes era considerado a zebra absoluta do torneio, recebeu o troféu de campeão, cabendo ao jornal espanhol se redimir: "Dava auténtica gloria ver cómo tocaban y hasta manoseaban la pelota los brasileños, com sus pases medidos al primer toque, su sentido de la anticipación e su visión de hueco.”. Em tradução livre: dava autêntica glória ver como tocavam e até manuseavam a bola os brasileiros, com seus passes medidos ao primeiro toque, seu sentido de antecipação (das jogadas) e sua visão de jogo.
(MEDALHA DE BRONZE EM CRÔNICA NO JÚRI MILITAR)
Mar de Gude
Enquanto trafego ao longo da Ponte Costa e Silva, como se fosse um turista desacostumado a tal paisagem, eu fito a Baía de Guanabara. Em meu trajeto de aproximadamente treze quilômetros, vem-me uma lembrança ditosa dos já distantes tempos de infância. Todavia, talvez eu surpreenda o(a) prezado(a) leitor(a) com as palavras que tatuei nesta alva folha de papel materializada a partir da impressora conectada ao gabinete, o qual se conecta à tela do microcomputador.
Admito que o jogo de bolas de gude no chão jamais me atiçou a sede de vitórias ou a vontade de participar da emoção despertada em meus também jovens colegas. Logo, se tal afirmativa é verdadeira, por que motivo então eu trago à baila as rotundas e usualmente cobiçadas bolas de gude? Passarei, pois, a explicar o que se passa na minha mente.
Na verdade, eu tão somente preferia colecioná-las por sua beleza e, não raro, procurava olhar através das mesmas, na esperança de enxergar o outro lado exterior a seu colorido. Sim, o mundo externo a ela, usando-a como uma lente translúcida. E sempre soube que a água, tal qual o cristal, pode oferecer transparência ou translucidez, dependendo de fatores diversos, como sua limpidez. Por conseguinte, lembrando-me de quando mirava os olhos contra a parte cristalina da bola azul, tenho agora a impressão de que a Baía parece realmente uma bola de gude...
É como se a paisagem interna e exótica daquela linda bolinha ganhasse vida! Águas passam a pegar carona nas rasas brisas e nuvens, nas altas; embarcações e naves penetram no cenário; uma ponte gigante espreguiça-se, de forma a dar passagem a automóveis.
Num devaneio, então eu me pergunto alucinado: teria minha bola azul, num de meus lançamentos a esmo, se afastado de mim e conquistado realmente vida após tanto quicar? Teria, com a força do arremesso, colidido contra o chão e, como numa explosão, liberado tal cenário dentre seus cacos? Não, sou ínfima criatura tentando seguir a serviço do criador! Ademais, bolas azuis de gude – como várias de outras cores – normalmente também se dotam de uma parte branca, a lembrar espessas nuvens que “escondem”o sol em dias nublados. Aliás, o próprio céu se recobre sempre de um azul em tonalidade mais clara.
Desta forma, juntando-se a imaginação descrita, pode-se segurar uma bola azul de gude com os dedos polegar e indicador, de modo a manter-se o azul escuro da mesma para baixo e o branco no topo. Assim feito, aptos estão os que, tipo eu, consideram-se amantes do clima nublado, a sonhar com o controle da natureza de um modo mui mais puro do que o caos que o homem há muito destina à mesma.
Quase um século de espera
Prezado(a) leitor(a), antes de mais nada considero oportuno dizer que no momento em que escrevo este texto as Olimpíadas do Rio de Janeiro se encontram ainda em seu quinto dia. Digo outrossim que foi motivo de orgulho ingente o fato de a nossa pioneira medalha nestas festividades de âmbito mundial ter saído das provas de tiro esportivo, o que não ocorria há 96 anos, quando Guilherme Paraense, nos Jogos da Antuérpia (Bélgica), em 1920 conquistou a medalha de ouro na pistola rápida e a de bronze na pistola livre por equipes. E não nos olvidemos do macaense Afrânio da Costa, o primeiro medalhista brasileiro, que conquistara a prata dias antes e depois viria a participar da equipe galardoada com o bronze. Entretanto, voltando aos dias hodiernos, no último dia 6 de agosto coube ao paulista sargento do Exército Felipe Wu, de 24 anos, a conquista da medalha de prata na prova da pistola de ar 10 metros, no Centro Olímpico de Tiro, o qual se situa no bairro de Deodoro.
"É uma sensação de dever cumprido. Minha equipe e eu nos dedicamos muito, e esse ano tem sido muito bom para mim, pois já venci duas etapas da Copa do Mundo e cheguei ao primeiro lugar do ranking, e ganhar aqui agora é muito bom. Até de manhã, não acreditava que a torcida poderia fazer a diferença, mas foi exatamente o que aconteceu. Senti uma energia muito boa vindo da arquibancada (...) Dá para ouvir e muito. Em alguns momentos distrai, mas a maior parte do tempo dá uma energia muito boa. Quando eu estava de cabeça baixa, dava uma animada. Até hoje de manhã eu sempre falava que a torcida não fazia diferença. Mas vi que faz sim. Senti uma energia muito boa", comemorou o brasileiro depois de ouvir da torcida o fervoroso "Wu, Wu, Wu, Wu, Wu!!!" durante a disputa. Ele conquistou a prata depois de uma disputada série final com o atleta vietnamita Xuan Vinh Hoang. Este, com 202.5 pontos, levou o primeiro ouro da história de seu país, além de quebrar o recorde da prova, ao passo que o brasileiro terminou com 202.1 pontos. O terceiro colocado foi o chinês Wei Pang, com 180.4 pontos.
Ao surgir na entrevista o nome de Guilherme Paraense e os quase sem anos sem medalha brasileira no tiro, o paulista não titubeou: "É uma honra. Todo mundo me falava dessa medalha (conquistada) em 1920. Fico muito feliz que consegui realizar esse sonho. Espero que a pessoas se interessem mais pelo tiro e mais pessoas possam representar o país".
Felipe Wu principiou muito bem a final, liderando já na primeira série, a qual se constituía de três tiros. Ele se manteve à frente depois de cada atirador utilizar suas sete tentativas, mas foi enquanto a torcida brasileira protestava contra um russo que persistentemente buzinava, o sargento pela primeira vez deixou a casa dos dez pontos e caiu para o terceiro lugar. O vietnamita se afastava na frente, mas o brasileiro não se deixou abater e se recuperou, diferentemente do sul-coreano Jongoh Jin, campeão olímpico em Londres, que nas Olimpíadas do Rio ficou em quinto.
Quando restavam apenas quatro competidores na disputa, Wu obteve uma pontuação 10,7 e viu Juraj Tuzinsky, da Eslováquia, ser eliminado, o que fez o brasileiro já ter garantidas as 500 gramas de metal no peito, restando apenas a cor a definir. Com 2,4 pontos sobre Wei Pang, da China, e 1,5 ponto abaixo do vietnamita, ele sabia que a caçada a este seria o tópico. Por conseguinte, a tensão fez depois o brasileiro e o chinês vacilarem por uma rodada, o que retirou este da competição. No fim, o vietnamita Xuan Ving Hoang se pôs incólume ante o ruído da torcida e acertou o centro do alvo, conquistando o ouro.
Cabe ressaltar que Wu na verdade não competiu nas condições ideais, como ele mesmo disse após o fim da disputa: "faz mais ou menos duas semanas que estou com uma dor no ombro. Estava consciente de que teria que competir dessa forma e competi. Deu tudo certo". Como se não bastasse, sua namorada e colega de quarto na Vila dos Atletas - Rosane Budag - competira antes dele, sentindo o peso da disputa em casa e ficando apenas na quinquagésima e penúltima posição, a pior da sua carreira internacional. Apesar de tudo isso, o brasileiro chegou a liderar a disputa e só não conquistou o ouro porque o oponente vietnamita acertou o centro do alvo no último tiro após prolongada pausa para a tentativa.
Felipe na realidade não surgiu agora, já que ganhara o status de promessa do tiro esportivo brasileiro com a conquista da prata na primeira edição dos Jogos Olímpicos da Juventude, em Cingapura, em 2010, época em que a modalidade vivia praticamente na obscuridade e o rapaz não recebia o apoio necessário. Todavia, ele só passou a atrair investimentos no ano passado, depois de ganhar a medalha de ouro nos Jogos Pan-Americanos de Toronto, garantir vaga nas Olímpiadas do Rio e contar que treinava no quintal de casa, com três metros de profundidade a menos que a oficial, por falta de um local mais apropriado. Antes das Olimpíadas, passou a receber a Bolsa Pódio, do Ministério do Esporte, e a se dedicar exclusivamente ao tiro.
REFERÊNCIAS:
BRASIL 2016. Afrânio da Costa. Disponível em: 05 jul. 2016. Acesso em: 07 ago. 2016.
<http://www.brasil2016.gov.br/pt-br/olimpiadas/medalhistas/afranio-da-costa>
EXTRA. Felipe Wu conquista a medalha de prata no tiro esportivo e faz história na Rio-2016. Disponível em: 06 ago. 2016. Acesso em: 07 ago. 2016.
< http://extra.globo.com/esporte/rio-2016/felipe-wu-conquista-medalha-de-prata-no-tiro-esportivo-faz-historia-na-rio-2016-19868532.html>
IG OLIMPÍADAS. Felipe Wu ganha prata no tiro e dá ao Brasil sua primeira medalha no Rio. Disponível em: 06 ago. 2016. Acesso em: 07 ago. 2016. <http://esporte.ig.com.br/olimpiadas/2016-08-06/olimpiada-primeira-medalha-brasil-tiro-esportivo.html>
(MENÇÃO HONROSA EM HISTÓRIA MILITAR NO JÚRI CIVIL)
MINIBIOGRAFIA:
Josevânio Almeida de Araújo é carioca tímido demais para aparecer na literatura...
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LENIR MOURA (NITERÓI - RJ)
HOJE ACORDEI COM SAUDADE.
SAUDADE DE UM PASSADO
QUE AINDA EXISTE,
TRISTE...
HOJE ACORDEI QUERENDO FALAR.
FALAR DE AMIZADE
QUE ANDA DISTANTE,
TÃO LONGE...
HOJE NÃO VEJO SOL
E A CHUVA TAMBÉM NÃO CAIU.
O VENTO PASSEIA NAS FOLHAS
TRAZENDO A LEMBRANÇA
QUE NÃO SUMIU.
HOJE SENTI TUA FALTA,
AMIZADE TIRADA DE MIM.
SENTI SAUDADE DE TUDO...
O MUNDO PRÁ MIM FICOU MUDO
ASSIM...
PARECENDO CALADO,
FECHADO, SEM PODER ENTRAR.
HOJE ACORDEI COM SAUDADE.
SAUDADE DE UM PASSADO
DIFÍCIL DE NÃO LEMBRAR.
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
A VIDA TE EMPURRA
DE ENCONTRO AO FUTURO.
SEGURO NÃO É,
MAS TENTA, AVANÇA...
NÃO É MANSA A VIDA.
PERIGA PERDER O CAMINHO.
A ESTRADA É BARRENTA
E AS FLORES TÊM ESPINHOS.
LEVANTA,
NÃO SENTA.
PROCURA O TEU NINHO.
A VIDA É DURA,
A RUA É LONGA.
ESPERA A RESPOSTA,
UM DIA ELA VEM.
TAMBÉM, QUEM SABE¿
SEGUE ANDANDO,
PROTEJA TEU PÉ.
A VIDA TE LEVA,
VOCÊ CHEGA LÁ,
MAS, SEGURO NÃO É!
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
MEU NOME É HELENA.
NÃO FUI ATRIZ E NUNCA FIZ CINEMA.
MAS NA MINHA VIDA
REPRESENTEI MUITAS CENAS.
SEMPRE TIVE EM MIM
DIVERSAS HELENAS.
A HELENA ESCRITORA QUE FAZIA POEMAS.
A DOUTORA HELENA QUE CURAVA DOENTES.
TINHA ATÉ A DEMENTE, QUE DE TÃO LOUCA
TINHA POUCA VERGONHA.
EXISTIA TAMBÉM A HELENA RISONHA
QUE MOSTRAVA OS DENTES
COM SEU LARGO SORRISO.
E A QUE FAZIA BESTEIRA
ERA A HELENA QUE NÃO TINHA JUÍZO.
ERA A INSANA, A DOIDA VARRIDA.
EXISTIA A DOMÉSTICA
QUE RECLAMAVA, CANSADA DA LIDA.
A HELENA DESLUMBRANTE
QUE DE TÃO CATIVANTE,
BRINCAVA DE AMANTE E DE FAZER AMOR.
ERA TÃO SENSUAL, SEXY, ESTONTEANTE.
MAS NA HORA PRINCIPAL NÃO SABIA SE IMPOR.
TINHA AINDA A PROFESSORA QUE SÓ QUERIA ENSINAR.
A HELENA CONSUMIDORA
QUE SÓ PENSAVA EM COMPRAR.
E A CUIDADORA DE IDOSOS QUANDO APARECIA,
SEU TRABALHO FAZIA COMO NINGUÉM.
TINHA A SONHADORA QUE VIVIA NA LUA
E TINHA TAMBÉM A MORADORA DE RUA.
SOU A MISTURA DESSAS HELENAS
FEITA COM A MAIS PURA
E GENIAL BRINCADEIRA.
MAS A HELENA DE AGORA
É UMA SENHORA
QUE VIVE SENTADA NA SUA CADEIRA.
QUE PASSA AS HORAS CONTANDO HISTÓRIAS
FORÇANDO A MEMÓRIA PARA NÃO ESQUECÊ-LAS.
A HELENA DE AGORA,
ESTA HELENA SENHORA
É, PARA MIM, A MAIS VERDADEIRA!
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
DESESPERANÇA
ATRAVÉS DA VIDRAÇA, VEJO A VIDA QUE PASSA.
VEJO GENTE SOZINHA, SEM SABER ONDE IR.
VEJO MÃOS ESTENDIDAS,
PEDINTES, SOFRIDAS
SEM TEREM FORÇAS PARA SEGUIR.
OUÇO UM GRITO NO ESCURO, NÃO VEJO FUTURO
E O PRESENTE É TÃO TRISTE NO MEU CANTO DE DOR,
EU NÃO VOU DISFARÇAR A DECEPÇÃO QUE EXISTE.
SOU DESENCANTO E DESILUSÃO
ABATIMENTO E CONSTERNAÇÃO.
SONHO COM UM TÚNEL NESTA ESTRADA SOMBRIA
A PROCURA DA LUZ PARA ILUMINAR ESSE DIA
ESCURO, MEDONHO, SEM SONHO.
QUERO UMA CERTEZA, QUERO PAZ E PÃO NA MESA.
QUERO ANDAR SEM MEDO,
DESCOBRIR OS SEGREDOS
QUE RONDAM O NOSSO VIVER.
QUERO IGUALDADE,
PODER AMAR MEU IRMÃO.
PROVAR DA FELICIDADE
QUE ESCORRE DA MINHA MÃO.
(MEDALHA DE OURO EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
MINIBIOGRAFIA:
LENIR MOURA TEM POESIAS EM ANTOLOGIAS, PELA AMÉRICA DO SUL E EUROPA. POESIAS EM ANTOLOGIAS LANÇADAS NA BIENAL INTERNACIONAL DO LIVRO/ RJ. MENÇÃO HONROSA EM VÁRIOS CONCURSOS NACIONAIS. DESTAQUE 2011 PELA ANBA. PRÊMIO LITERARTE DE CULTURA 2012. 1º LUGAR NO CONCURSO VIRARTE DE POESIA, NO RIO GRANDE DE SUL. 1º LUGAR NO 1ºCONCURSO DE POESIAS DO CLARON – CENTRO LITERÁRIO E ARTÍSTICO DA REGIÃO OCEÂNICA DE NITERÓI. MEDALHA PERSONALIDADE 2011 NA CATEGORIA REVELAÇÃO POÉTICA PELA ARTPOP. PRÊMIO LUSO-BRASILEIROS MELHORES POETAS 2012-2013 DA EDITORA PORTUGUESA “MÁGICO DE OZ”. PRÊMIO EXCELÊNCIA CULTURAL - 2013 ABD. ORDEM DO MÉRITO CULTURAL DOM PEDRO II DA FEBLACA. DOIS LIVROS PUBLICADOS: “UM TURBILHÃO DE SENTIMENTOS” EM 2009, GANHADOR DO PRÊMIO INTERARTE, CONFERIDO PELA ACADEMIA DE LETRAS DE GOIÁS - ALG E “SEM POESIA, NEM PENSAR”, EM 2012. ACADÊMICA CORRESPONDENTE DA ARTPOP. ACADEMIA DE ARTES DE CABO FRIO. RJ. ACADÊMICA CORRRESPONDENTE DA ALAV. ACADEMIA DE ARTES Y LETRAS DE VALPARISO – CHILE
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LÚCIA PÉRISSÉ (RIO DE JANEIRO - RJ)
CAI A NOITE...
Cai a noite no Recreio!
Como é lindo o entardecer!
O céu, de azul se fez rosa,
escurece devagar...
até o instante chegar
em que desperta o anoitecer.
As luzes agora se acendem ,
a rua toda ilumina...
Na praia, o mar se acalenta
nas brumas da noite que desce...
O rosa, já a noite esqueceu,
nuvens brancas cobrem o sol
que devagar, no horizonte descamba...
Já vem a noite chegando
morna, lenta, sonolenta...
O céu agora adormece.
Fica só a cortina da noite,
com seus tons e negros matizes
esperando as horas correrem,
para, de certo amanhã,
novamente, o sol despertar...
(MEDALHA DE PRATA EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
CHOVE...
Água serena
que passa correndo,
Água que cai
gemendo, chorando
como se fosse alguém soluçando...
E eu fico pensando:
por que a chuva é triste?
nem sei bem dizer...
Talvez ela caia de onde, bem longe,
alguém está triste...
Talvez ela seja a lágrima aflita
de alguém muito triste,
que chora em vão
de imensa saudade
de um outro alguém,
que a chuva olhando
soluça também...
Chuva, por que és assim?
És má para mim...
tu passas correndo, rolando,
pra onde tu vais?
Pra longe talvez!
Se tudo tu levas, pra longe, pro mar,
por que não me levas
toda a tristeza,
tristeza que sinto,
saudade que mata,
quando triste eu te vejo
pela terra...rolar...
DEIXE O VENTO...
Deixe que o vento se vá...
deixe que tudo desperte
e se perca no vazio
do tempo, da noite ao luar!
Mas você...você...não se vá!
Fique um pouquinho mais...
Deixe que eu possa vê-lo,
que possa sentir seu olhar,
seu calor, a sua voz...
Sentir um pouquinho só
deste seu eterno amor...
E num afago, num beijo,
no sonho, faz tempo esquecido,
nesta noite fria e vazia,
pelo menos numa só...
fique comigo!
Não se vá!!!
NOITE
Noite!
Estrelas no céu, pessoas na rua,
uma luz lá no alto ilumina a esquina...
Um piano tocando
Por dedos que falam
num estranho falar...
Balançam os galhos das árvores velhas
ao sopro da brisa que passa serena...
Noite linda, mas triste também;
triste pra alguém,
que olhando as estrelas
e a noite serena,
relembra num sonho
outras noites iguais...
noites morenas, de estrela, de luz,
de brisa soprando,
de galhos voando...
Noite de sonho, de amor, alegria;
um violão cujas cordas...suave magia,
em uma voz que se ouve sonora a cantar!
Tudo isso na noite !
Lá fora o silêncio...
Não gente passando,
não piano tocando,
não luz na esquina
que a rua ilumina...
Mas tudo é a noite,
de estrela e de luz,
que embora não seja em nada igual...
basta-me apenas...
apenas a noite,
pra dar a impressão
que tudo que ouvi,
que amei, que sonhei...
não foi fantasia,
não foi tudo em vão...
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
MINIBIOGRAFIA:
Lúcia Périssé, artista plástica e poetisa , nascida na cidade do Rio de Janeiro, professora de Artes Plásticas e Língua Portuguesa durante 28 anos, encontrou na pintura abstrata a forma ideal para extravasar o seu imenso mundo interior através das cores e formas indefinidas.
Participou de mais de 200 exposições coletivas, 10 mostras individuais, além de uma exposição em Roma e quatro em Portugal e Madri, 14 participações em livros de artes e antologias. Publicou recentemente seu livro de poesias “Palavras...Momentos... “ – 2015.
Recebeu ao longo de suas atividades artísticas, mais de 100 medalhas, 15 participações Hors Concours, 28 troféus em Artes Visuais, medalhas de Mérito Artístico-ANBA.
Comendadora da ABD, Acadêmica da ANBA – Niterói, Acadêmica da ARTPOP – Cabo Frio .
Com suas poesias, participou de diversas Mostras, todas com premiações.
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NERI FRANÇA FORNARI BOCCHESE (PATO BRANCO - PR)
Pleito aos alunos.
. . . e assim foi
Última tarde, uma sexta-feira,
Diferente da primeira
Era, 3 de março, segunda- feira.
Entre as duas, se foram 48 anos.
Na sala de aula, olhares atentos, com júbilo.
Repetida, tantas vezes, a saudação
Boa tarde!Tudo bem? Como estão?
Digo: “hoje não estou com pressa”.
Mas o momento foi imortalizado,
No fundão, professores, os eternos alunos.
Juntos, há 23 anos, no mesmo labor,
“Viemos para assistir a tua última aula,
Essa, enquanto profissional de carreira,
Pois, ensinar já faz parte do dia-a dia”.
Foi difícil, segurar a emoção
A despedida, seria no silêncio, efusivo da Universidade.
Foi especial, valeu, foi carinho, uma vocação.
Desde, os pequeninos de 1967
Aos de hoje, quase Senhores engenheiros.
Serão excelentes profissionais,
Sempre, jovens especiais.
Permanece, para sempre um pouco de perfume,
Diz a vida, reza a canção.
Muitos dias, muitos desabrochar de rosas,
Aprende-se, muito ao ensinar.
No convívio de tantos anos, Muito Obrigada.
Se magoei, me perdoem
Assim, Deus me perdoa, Rezarei,
E, vou suplicar sempre, que os abençoe,
A vocês, discípulos , meus.
O Paraná
A Palavra toda poesia,
Em forma de grafia,
Traz o cuidar,
O Estado - Ecologia.
Semelhante ao mar,
Pará +na - Tupi guarani
Dos indígenas, a consciência.
Paraná, disputado entre Portugal,
Com a rival Espanha.
Assim, se fez em Brasil, país continente.
Paraná, o mais puro poema
Na cantiga, eternizada.
Chuá, chuá, cantarolado,
Nas corredeiras.
Chuê, chuê nas cascatas.
A Luz do Sol, verdadeiras pérolas,
Nas quedas, de tantos rios
Na beleza do Iguaçu,
Segue o caminho do Leste para Oeste.
Na saudade de Sete Quedas
Por ganância, sepultadas.
Insensatez de alguns.
Paraná, de belezas raras
Preservadas em parques municipais.
Nos verdes pinheirais,
Nas construções, audazes.
Beleza que contagia,
Turistas, vislumbram maravilhas.
Paraná, de gente admirável.
Terra, de tantos povos,
Europeus, asiáticos, africanos.
Irmanados na vida em Comunhão
Fizeram eles esse chão.
Paraná de tantos heróis
De lutas, nas artes, no progresso.
Consagrados, na magia das águas!
O Paraná jovem Território
Paraná, um rio, um Estado.
Terra dos filhos, dos netos.
Acolheu os migrantes.
Vindos de perto, de longe,
Em busca de sonhos.
A beleza maior,
A Araucária, árvore única!
O Estado, enobrece
Em Mangueirinha, altaneira,.
Precisa de carinho de cuidado.
Árvore, a taça especial,
Acolhe o orvalho matinal.
Trás ares nobres, a bela paisagem
Isolado, no alto de uma colina,
Ou juntinho na Mata Subtropical
Paraná de tantas gentes,
Paraná, do índio Viri, do cacique Condá,
Defensores desse terra,
Chão, de terra roxa,
Do café, da soja, da gralha Azul,
Da serra do Mar, beleza feita escarpas.
Paraná, presente em Paranaguá.
Com a Senhora do Rocio!
Paraná, terra de rios, fugindo do Mar,
Percorrendo esse chão abençoado,
Chegam eles ao grande Rio Paraná.
Pouco depois ajuntam-se ao Mar Del Plata.
Paraná, terra de Helena Kolody
A poetisa por excelência,
Amor transformado em versos
Se fazia mãe de quem gostava,
Trazia a beleza paranaense,
Nos olhos azuis, espelhava
As águas do Paraná!
Um grande Homem
Celestino Fornari, nasceu na linha Borghetto, em Anta Gorda pertencente a Encantado, -RS, em 6 de abril de 1920, exatamente 34 anos após seus pais Fornari, Luigi Giovanni Battista e Goffi, Felicidade Adelaide terem desembarcado no Brasil.
O pai natural de Motta Baluffi, uma comuna da província di Cremona na região da Lombardia. A mãe de Castelgomberto – Torri di Quartesolo, comuna italiana da região do Vêneto, província de Vicenza. Ainda crianças, viajaram no mesmo navio em busca de uma Nova Pátria.
Celestino, o caçula dos 15 filhos do casal de italianos. Residindo em Arvorezinha, Rio Grande do Sul, trabalhou nas terras dos Fornari e, também no frigorífico Busetti Fornari de Borghetto - Anta Gorda-RS.
Aos 21 anos alistou-se para servir o Exército Brasileiro, corria o ano de 1940. Desejava sair de casa, buscar novos horizontes. Moço bonito estava noivo. Possuía um bócio que o deixava constrangido. No quartel consegui o seu sonho, passou por uma cirurgia. Estava agora, livre do incomodo adquirido quando criança por ter começado muito cedo a puxar toras no mato. Um serviço pesado.
Foi aceito, em 20 de fevereiro de 1942, no 5º. Regimento de Artilharia Montada “Regimneto Mallet” a escolha foi por sorteio. O Regimento logo depois, foi extinto e assim ele foi transferido para a I Região Militar em Santa Maria da Boca do Leão - RS.
O Brasil declarou Guerra ao Eixo, em 31 de agosto de 1942. O soldado foi para o Front. Viajou no transatlântico “USS General Mann” em 22 de setembro de 1944. Pertenceu ao 2º. Escalão comandado pelo General Cordeiro de Farias. Desembarcou no Porto de Nápoles, todo destruído pela Artilharia alemã.
No período de 06 de outubro de 1944 até 11 de agosto de 1945, lutou na Itália. Em terras estrangeiras serviu no I Grupo de Artilharia (I/IR.O.AU.R.), durante 11 meses. No Teatro de Operações, foi Identificado: Celestino 3 G 66307 - T 44 A- BRA.
Alojaram-se em barracas de Campanha, muito simples, de lonas, sem conforto, sem segurança alguma, enfrentaram o frio rigoroso de 22 Graus Negativos. As míseras barracas foram fornecidas pelo 5º. Exército Americano, comandado pelo general Mark Clark ao qual a Força Expedicionária Brasileira passou a pertencer.
Por decreto, em 1944, a Capelania Militar enviou para a Europa os voluntários 30 sacerdotes católicos e dois pastores evangélicos. O papel deles era oficiar missas e cultos na retaguarda. Confortar com assistência individual os integrantes da tropa. Eles, mais as enfermeiras foram importantes para consolar os Pracinhas, na dura realidade de uma guerra, nos momentos de extrema privação e dor.
O comando ordenou, aos soldados brasileiros para avançarem, dada por um telefonema, no dia 12 de abril de 1945. Se não encontrassem resistência, o 3º Batalhão do 11º. Regimento de Infantaria da FEB deveria seguir para as colinas de Montese, pequena cidade ocupada pelas tropas do Exército Alemão, no Norte da Itália.
Fortemente armada, a patrulha da FEB, com 21 homens partiu às 9h e, depois de passar sem resistência por Montaurigula, seguiu para Montese. No caminho, depararam com uma colina alongada, de onde retiraram 82 minas.
Celestino esteve em combate na manhã do dia 12 de abril de 1945. Os homens da FEB romperam as linhas alemãs nos últimos contrafortes dos Apeninos, mas a tomada de Montese, na noite de 14 para 15 de abril, custou-lhes muito caro. Foi à batalha mais sangrenta para nossas tropas desde a Guerra do Paraguai, com um saldo de 426 baixas, entre mortos, feridos e desaparecidos.
Depois de intensos combates, foram vencendo a resistência alemã e, na noite de 14 de abril, já haviam dominado as encostas a Sudoeste da cidade, com reforço de outros dois pelotões. A capacidade defensiva da infantaria inimiga estava quebrada, mas a luta entrou madrugada adentro. Apesar da grande quantidade de alemães em Montese, a artilharia das forças alemã da Wermacht descarregou naquela noite cerca de 2.800 tiros.
Celestino Fornari, atuou no I Grupo de Infantaria quando da tomada de Monte Castelo, grande feito do Brasil na Segunda Guerra Mundial, no dia 21 de fevereiro de 1945, se deve à bravura dos soldados brasileiros. Considerada a mais importante fortaleza de toda a Linha Gótica, às 18h30min, Monte Castelo estava em poder dos brasileiros.
Duas semanas depois a guerra na Itália chegaria ao fim. Em homenagem aos brasileiros, Montese construiu o Museu Militar da Força Expedicionária Brasileira, no interior de um castelo do século XII.
Fez-se presente com galhardia, era motorista, com a motocicleta, à noite, sozinho emendava os Fios do Telégrafo, cortados pelos alemães. A comunicação se fazia essencial.
Não foram eles, os soldados preparados para a Guerra, não conheciam montanhas cobertas de neve e, nelas tiveram que lutar. Foram trocados pela Siderúrgica de Volta Redonda. Homens jovens, filhos da Pátria, serviram de bom negócio para o desenvolvimento do Brasil. Não receberam, ao partirem, nem roupas apropriadas para um inverno rigoroso.
A 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária, estendeu suas tropas ao longo de 70 km, vigiando todos os pontos por onde os alemães tentassem passar rumo ao Norte da Itália.
Os Combatentes brasileiros improvisaram um campo cercado, para abrigar, como podiam os 14.779 alemães e italianos, feitos prisioneiros, após a rendição. Em número maior do que os pracinhas brasileiros.
Dizia Celestino: “os alemães esperavam para serem transportados por nós, lhes dávamos todo o nosso cigarro, o nosso chocolate e não os maltratávamos”.
Recordava com emoção, os olhos enchiam de lágrimas quando relatava aos filhos que, em 19 de julho de 1944, presidida pelo General Mascarenhas de Morais, Comandante em Chefe da FEB, foi hasteada com indizível patriotismo a Bandeira do Brasil. O Pavilhão Nacional tremulou em terras da Europa, pela primeira vez em nossa história. O Verde e o Amarelo, riquezas nacionais, contrastaram com a destruição em solo italiano.
Aos Ex-combatentes, no retorno ao país, foram impostas várias restrições. Os veteranos não militares, que deram baixa, também foram proibidos de utilizar em público condecorações ou peças do vestuário expedicionário, enquanto os veteranos militares, profissionais de carreira, foram transferidos para regiões de fronteira ou distantes dos grandes centros.
O Brasil, com medo e com a falta de civilidade e patriotismo, não permitiu que os soldados se organizassem.
Do Rio de Janeiro foram mais do que depressa despachados de trem para os seus Estados de origem. Não receberam nenhum acompanhamento médico, nem psicológico.
Dívida que o Brasil ainda não resgatou com as famílias dos Ex-combatentes, pois eles já partiram. Elas entregaram moços cheios de vida e saúde e receberam muitos mutilados no corpo e todos eles, na alma. Celestino Fornari, trazia uma marca de guerra na sobrancelha direita, provocada por um estilhaço de granada alemã, na destruição de uma ponte.
A Pátria lhe deve para sempre, o dissabor de ter partido, sem saber que a sua família estaria amparada com sua aposentadoria Militar.
Honrou o nome de brasileiro, deixou exemplo de nobreza, dignidade aos filhos, netos, bisnetos.
Muito Obrigado, Grande Homem.
(MEDALHA DE BRONZE EM HISTÓRIA MILITAR NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE OURO EM HISTÓRIA MILITAR NO JÚRI MILITAR)
Amor criança,
Amor na maturidade
A vida, alegria, criança
Preconceito
Na mesma bacia
A inocência com a água da vida,
Duas crianças
Um menino, uma menina
A pureza na alegria de viver
Crescem tudo se dissipa
A Harmonia foge
O preconceito prevalece
As crianças crescem
Homens e mulheres
Uma existência nem sempre pacífica
A água origem da vida
A banheira cósmica
As brincadeiras outras
Os compromissos também
A alegria prevalece
Onde o amor o carinho
Essência humana
Entre os seres maiores
A razão e o sentimento entrelaçados
Fazem parceria
No convívio entre as criaturas.
Amor Criança, agora Amor Maturidade.
(MEDALHA DE PRATA EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
MINIBIOGRAFIA:
Neri França Fornari Bocchese nasci em Arvorezinha, Vale do Taquari-RS. Casada com Roque João, temos 4 filhos , Roque Eduardo, Fernando. Evandro, Daniel Celestino, todos engenheiros. Três noras Genoefa-Pedagoga, Vania Agrônoma e Franciane Fisioterapeuta. E, os amores maiores Giovanna, Gabriel, Victoria e Gustavo. Sou professora na UTFPR- Universidade Tecnológica Federal do Paraná na área das Humanidades, nos cursos de Engenahria.
Presidente da ALAP- Academia de Letras e Artes de Pato Branco. Ministra da OFS- Ordem Franciscana Secular. Membro do Rotary Clube Pato Branco-Sul. Ministra da Eucaristia na Paróquia Cristo Rei. Gosto de escrever, vários livros editados em português e Braille. Um com certifica ção na França. Gosto de passear com as crianças e de viajar.
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RENATO BENVINDO FRATA (PARANAVAÍ - PR)
O Pé de Garças
O afoito tem a língua grande, rápida e ferina e, quando esta não lhe cabe na boca, a palavra sai entontecida e sem rumo a provocar desastre. Foi o que aconteceu quando duvidei de Pedrinho; falei asneira e mastiguei desculpas.
Estávamos no quarto ano do grupo escolar, com aulas de Português cuja professora tudo fazia para que aprendêssemos. Desenhava no ar com uma régua a beleza do que via, do que escrevia, ditava, recitava, cantava; uma graça.
No contexto de Português, portanto, Pedrinho era o que mais se destacava com sua aparência sisuda emoldurada pelos cabelos penteados com brilhantina e sapatos lustrosos de graxa. Mas ele ia além, enquanto nos limitávamos às lições de História, ele escarafunchava a Mitologia, e incorporava as personagens mais famosas, como se elas vivenciassem nossos momentos, trazendo para perto as figuras de Apolo, Hércules, Teseu e o exército de heróis e titãs que se relacionavam sistematicamente com o belo, com a força, com o poder, com a valentia, como a leitura da mitologia induz.
Para ele era tão fácil captar o que lia que, mesmo permanecendo sentado em sala de aula o tempo todo, parecia um de nós com a bola nos pés no campinho. Era de causar inveja e raiva. Enquanto ele lia e aprendia, nós corríamos... Pois foi esse o adversário que enfrentei por causa do título de uma redação. Cada um tinha a obrigação de ir à frente da turma e ler o que escrevera; e lá foram o João, a Mariinha, eu e outros tantos, até que chegou a vez de Pedrinho que manobrou as rodas da sua cadeira, postou-se firme, limpou a garganta para adocicar a voz e leu o título: - “O pé de garças”.
Foi o que bastou para que todos, puxados por mim, caíssemos em gargalhada com a sua estupidez: onde já se viu garça dar em árvore como laranja, mamão, goiaba? Pé de garças... ora veja...
- Não é fruta, é ave, seu burro! – gritei, deixando vazar minha raiva por ser ele mais inteligente que nós.
Então, entre as ordens de silêncio e pedido de respeito da professora, ele fechou o caderno, movimentou a cadeira para frente, olhou-me como se perscrutasse meu íntimo e, sem se empertigar, indagou:
- Nunca viram um pé de garças? Garanto que existe, fica num lugar mágico e tem um esplendor tão grande que, quem o vê com olhos da alma vai ficar estático com a beleza e majestade, encantado com o poder da natureza em demonstrar sua força e virtude. Estão convidados a vê-lo. Vamos?
Que alvoroço! Essas palavras bastaram para que meus companheiros gozadores se entreolhassem e baixassem os olhos à espera do pito, mas não foi o que aconteceu; a professora apenas disse:
- Tenho uma ideia: depois de amanhã faremos uma excursão ao sítio do Pedro. Quem topa?
Entre os ‘quero ir, mas minha mãe não deixa’, formou-se um grupo de nove meninos e meninas, com elas se encarregando dos lanches e nós do suco de laranja. Antes, o bilhete da mãe permitindo a aventura e o retorno depois do sol posto. No dia e hora marcados, oito se apresentaram com as permissões, lembrando que ao assinar a minha, tive a orelha entre os dedos e uma voz ríspida:
- Você vai, mas peça perdão ao seu amigo. Não vá estragar o passeio...
A professora chegou, conferiu os papéis, as mochilas dos lanches, fez um pequeno sermão de recomendações e seguimos. A casa não ficava longe e, ao chegarmos à varanda, já haviam servido café com bolo, momento em que ele me olhou de novo enxergando meus pensamentos. Não esperei que abrisse a boca e me adiantei:
- Pedro, desculpa pelo que fiz, foi de brincadeira...
Ele firmou os olhos, sorriu e estendeu a mão:
- Amigos, amigos, brincadeiras à parte. Ajude-me então, que o caminho não é bom...
Rapidamente engolimos o lanche, segurei com força os suportes traseiros da cadeira e rumamos carreador a fora, até um recanto cercado de mata. Ela era pesada naquele carreador esburacado, mas diante do carão ao lhe pedir desculpa e de sua mão branca de perdão estendida, qualquer esforço, por maior que fosse, valeria a pena. Pelo caminho aberto nas plantações, borboletas amarelas aos montes, brincavam seu esvoaçar gracioso. Havia vários blocos delas, aqui e ali na terra úmida. Quando nos aproximávamos, elas voavam ganhando a mata e rodeando-nos à certa altura, para retornar à tarefa momentos depois.
E dali até a beirada de um lago foi um pulo, difícil foi controlar a tagarelice diante dos insistentes pedidos de silêncio da professora, da mãe do Pedro e dele próprio, para não espantar as aves. E qual não foi nossa surpresa ao apreciar o descampado que se abria em meio à mata, e deparar com muitas, muitas garças palmeando o solo do lago. Elas se juntaram e, agrupadas, branquearam o ambiente. Pareciam bolinhas de papel, ou pipocas deslizantes porque andavam, enfiavam os bicos na água, traziam o peixinho, brincavam com ele ajeitando-o na base inferior e o engoliam, para de novo repetir o movimento. Outras, quiçá saciadas, ficavam encolhidas e se equilibrando numa das pernas tendo o pescoço enfiado sob a asa, dormitando ao sol da tarde.
- Vejam como o conjunto delas pinta a maravilha da natureza. Não é lindo? – Perguntou a mim. – O mais bonito é quando elas voam...
- É lindo sim – respondi sem melhor coisa a dizer. Fora estúpido e ele me dava o troco. E assim, bestificados com a visão estupenda das aves no lago e da árvore que seria sua morada, permanecemos admirando boquiabertos, em silêncio. De fato, lá na outra margem via-se uma árvore alta, com o tronco engrossado como uma barriga avolumada.
- Que árvore gorda! – Disse Mariinha, ao que a professora se adiantou:
- Ela reserva água para se proteger da seca, por isso incha...
Era uma árvore diferente porque tinha a copa careca, com flores e folhas aparecendo somente abaixo da calva de galhos, tal qual a cabeça do Frade Zezé, nosso pároco. No caso dela, as laterais de folhas de um verde marrento, e flores grandes cor-de-rosa simbolizaram os cabelos dele, cortados de tal forma que o disco pelado lustrava o cocuruto, com os cabelos aparecendo pouco acima das orelhas. Nela havia mais flores que folhas, o que dava uma conotação estupenda do contraste entre as cores e à similitude do conjunto. No todo, pelo que consegui entender, se sobrepunha às outras do capão de mato, no entorno e proteção do lago. Parecia ser a chefe das árvores.
- Elas dormem lá? - Perguntei curioso me referindo às garças.
- Moram lá – respondeu - e de tanto pisarem nos galhos as folhas não crescem, daí a calva; por isso o nome ‘O pé de garças’, porque juntas parecem frutas no pé, tão lindas ficam quando se põem a dormir encolhidas, parecendo bolas brancas. Vai ver.
Meus colegas e a professora se viraram para mim com olhos de repreensão; mas entre o sentimento de vergonha e o arrependimento, vimos quando a primeira garça abriu as longas asas, correu sobre a água e alçou vôo até um dos galhos da árvore. Lá chegando gazeou, talvez para informar que tudo estava bem.
Logo mais, outra fez o mesmo; e outra e outra até que várias saíram e ficaram rondando a copa à espera da acomodação das companheiras, para somente depois ocuparem seu galho. E assim foram se juntando, juntando, até que a última garça deixou o lago e se espremeu entre elas. Ele então acionou uma das rodas da cadeira e, de frente ao grupo disse com simplicidade:
- Quis contar isso que estão vendo e dizer que não existe maior harmonia que a natureza quando ela age sem a nossa interferência. Veem? Não existisse o lago que produz alimento e nem a árvore como abrigo, por certo não haveria garça. Esse lago é natural, nasceu das águas da mina que brota logo acima e também ganha reforço de outro ribeirão que vem pelo mato trazendo os peixes. A água escorre para essa depressão de terreno e forma ambiente especial para que elas fiquem e se alimentem; se acasalem e se sintam livres. De vez em quando partem, demoram um pouco, mas logo voltam... e isso acontece na época da reprodução dos peixes. Assim elas não comem as mamães-peixes e poderão voltar sempre que quiserem, pois terão peixinhos à vontade.
- Caramba, meu! – disse alguém – isso é massa!
Mas Pedrinho novamente deu um sinal e continuou:
- São parentes do pelicano que vive próximo do mar em quase todos os continentes, de asa a asa medem cerca de 90 centímetros, são identificadas pelas penas brancas, pernas e dedos pretos, o pescoço comprido, o bico longo e amarelado e a íris bem amarela. O que ela faz de ruim? Nada, apenas come e dorme; e fornece egretas, penas fininhas que servem para enfeites de roupas.
Eu quis falar, mas novamente interrompeu:
- No caminho vocês viram borboletas, estavam no solo se alimentando e, ao mesmo tempo, juntando húmus nas patas, voaram quando nos aproximamos por não saberem se lhes faríamos mal, para voltar depois à mesma tarefa quando nos distanciamos. Que fazem de mal as borboletas? Nada, apenas comem, bebem e, ao fazerem polinizam as flores possibilitando que nasçam outras flores e outras; e dessas as sementes dos nossos alimentos. Então, para fechar meu pensamento, nós humanos é quem somos intrusos, produzimos lixo, poluímos o mundo, fabricamos venenos; a natureza não. E, quando dermos conta disso poderemos ver por inteiro a sua beleza. Por enquanto resta que sabendo quem nós somos e o mal que produzimos à natureza, consigamos enxergá-la com os olhos da alma, como disse ontem, porque se não colocarmos beleza em nossos olhos, jamais veremos o fascínio que o panapaná produz, porque delicadamente, conjuga a exuberância cromática do arco-íris nas asas em movimento à leveza graciosa dos insetos. Panapaná é o coletivo de borboletas que em tupi quer dizer criatura de pétalas aladas. O coletivo de gente, como nós, chama-se grupo, e o de garças é bando. É isso, a redação queria dizer isso, mas acho que ficou melhor.
Eu, que estava do seu lado, peguei sua mão e a apertei como se aperta a mão de um amigo, pelo arrependimento da brutalidade, pela inveja do seu conhecimento, talvez porque tenha encontrado na figura fraquinha sobre a cadeira de rodas o gigante que a força dos músculos não tinha serventia, mas portava a força da sabedoria embutida na cabeça, afinal, a aula de dignidade e de hombridade que nos deu, especialmente a mim, foi o melhor que podia merecer. Antes que alguém dissesse alguma coisa, a mãe dele se aproximou e lhe dando um abraço, disse:
- Tudo foi muito bom, querido, muito bom, não precisava ser tão bom...
Ao se virar, no entanto, vimos seus olhos com lágrimas. Mas por que chorava se havia gostado?
Então professora se aproximou, passou a mão na minha cabeça e na cabeça dele e disse:
- Hoje meninos, tivemos exemplos que deverão caminhar conosco a vida toda: o primeiro deles é a consciência de ter errado e a assunção do erro seguido de pedido de perdão. Entenderam?
- Sim, - falamos em coro.
- O segundo exemplo foi o perdão. Quando o perdão é dado também com consciência, toda chateação que ele provocou some, como volatiliza o éter sob o sol quente. Assim fez o Pedrinho. Não fez?
– Fez – repetiu-se.
- O terceiro exemplo está na disciplina de Pedro. Viram quantos livros ele tem em casa? Perguntem quantos ele já leu: quase todos! Por isso seu boletim traz notas dez de cima a baixo, porque ele é disciplinado e nos ensinou maravilhas, resultando no encantamento do passeio enfeitado por borboletas, pelas garças e por nós que somos amigos, formando um grupo de dez mosqueteiros.
- Mosqueteiros? – Perguntou um menino.
- Sim, lembra-se da história dos Três Mosqueteiros, escrito por Alexandre Dumas, que contei outro dia? Pois hoje nós formamos um grupo de dez: vocês, o Pedro e eu. E sabem o que os mosqueteiros da história faziam? Vários levantaram o braço.
- Digam o que faziam.
- Tinham o lema: Um por todos e todos por um!
- Isso quer dizer o quê?
- Que se ajudarmos nosso colega ele nos ajudará.
- Sabem o que significa isso?
- Não!
- Solidariedade. E o que é solidariedade? É um compromisso pelo qual as pessoas se obrigam umas às outras e cada qual a todas. Nunca mais seremos um somente, - ergueu um dedo - mas um grupo de dez – abriu todos os dedos. Entenderam?
- Que legal!
Demos as mãos numa grande corrente e nos pusemos voltar à casa de Pedro.
A nossa amizade se consolidou a ponto de me levar a mil aventuras nos dias seguintes, e de ficar em meio aos seus livros chatos de ler que ele devorava como glutão, e à sua estupenda coleção da Enciclopedia Barsa, de onde catava informações, e essas aventuras nos levaram também às escapadas pelo quintal empurrando a cadeira ladeira acima e ladeira abaixo, com objetivo de que ele brincasse um pouco, e se esfolasse em pedras e espinhos como eu. E Pedro, escapulindo da disciplina aceitava as loucuras, até que um dia disse querer ver de perto um ninho de passarinho, sobre o qual havia lido que a fêmea carregava um ramo no bico para um galho, e lá ia juntando outros ramos em trança até compor com eles a pequena cova onde poria ovos, e onde passaria mais de vinte dias sobre eles alimentando-se e bebendo pouco, até eclodirem soltando os filhotes.
- Você quer que eu traga um aqui?
- Não, quero que você me leve lá.
- E eu aguento?
– Tente, ué!
Depois de seu balançar de ombros, tomei-o às costas e principiei a subida, mas não consegui. Então corri ao barracão de ordenha, peguei um laço de couro, subi na árvore passando a corda num galho forte, desci, levei Pedro até ali, amarrei com força uma das pontas da corda em volta de seu tórax, peguei a outra perna da corda e danei puxar.
Em princípio ele se assustou por ver pendurado, mas forcei mais e a corda cedeu voltando a correr e ele a subir, até que extasiado, gritou:
- Pare, estou vendo! Olha que coisa maluca! É obra de engenharia, rapaz, esses passarinhos são verdadeiros artistas! E o ninho não se solta, fica preso...
E aí a corda começou a esquentar minhas mãos e fazer escorregar os meus pés pelo solo liso e eu fui cedendo aos poucos e ao muito ficando apavorado; e ela danou a escorregar louca, queimando minhas palmas. Então, ele gritou:
- Irra! Irra! Posso voar como Mercúrio, o mensageiro de Zeus! Posso ser Apolo, o deus das alturas; posso ser Hércules, o herói das sete maravilhas. É gostoso!
– Pare! – gritei – não suporto seu peso...
Mas ele não ouvia, danando a rir desbragadamente, alucinantemente endoidecido com a aventura, como um espantalho com vida a se agitar lá em cima. E, sem mais poder conter seu peso e temendo o desastre, forçando a corda com as mãos em chamas, tentei voltar para perto da árvore para ampará-lo, mas ele passou direto, estatelando-se no chão.
- Puta merda! – gritei levantando as mãos à cabeça - matei ele!
Instantes que pareceram eternidade, ele se virou e riu, ainda com a cara de enlouquecido, lambrecada de sangue e a roupa suja de terra.
- Vamos outra vez? – Perguntou com seus olhos azuis faiscando felicidade.
- Sé besta! – respondi.
Em ato contínuo e tremendo de medo, corri ao barracão levando o laço e trazendo de lá um pouco de água, passando a rapidamente lavar, com minha camisa, sua cara de terra ensanguentada. E ele, doidinho de pedra pulava no chão, de alegria.
– Cara, quase matei você! Vê, está todo esfolado!
- Ah! – ele disse dando de ombros - é marca do batom do chão, só que mais forte um pouquinho... – voltando a rir e a rolar especialmente onde a água da lavagem do rosto fazia poça.
- Jesus! – Ouvimos de alguém; era a mãe dele que vira a cena e veio depressa.
Eu quis correr, mas com o Pedrinho se estrebuchando, fiquei para o pior.
– O que aconteceu? Você caiu? Jesus, meu filho, está machucado?
– Não, mãe, - ele respondeu com os dentes vermelhos – voei. Posso voar, pude tocar as nuvens, pude ver o ninho de perto, ser o Apolo que tanto queria ser!
Então ela o abraçou tirando-o do chão sem se preocupar com o barro no vestido. E com ele nos braços, estendeu a outra mão no meu ombro num abraço e disse emocionada:
- Vamos, a graça de Deus está conosco: meu filho aprendeu a rir... a ser menino, bendita hora em que deixou de lado os benditos livros...
Ela não ria como da outra vez, estava feliz por dentro, dava para sentir... Levou-nos, passou mercúrio cromo no rosto dele e cânfora em minhas mãos. Deu-me um lanche gostoso e me mandou de volta.
Falando em Pedro, confesso que com as suas lições de vida, compreendi que possuía atributo de um poeta, embora fosse menino; e que dizer poesia é voar fora das asas[1], é ir além de onde as palavras conseguem alcançar, porque entre a sensibilidade e o seu expressar há uma distância quilométrica. Não basta dizer poesia, é preciso interiorizá-la, senti-la, misturá-la ao sangue, transformá-la em energia, vivê-la em completa sintonia, para depois deixá-la vazar pelos poros com o suor, sair pela voz, pela respiração e pelo pulsar do coração, pelos dedos na tinta da caneta ou nos toques do teclado. Ele tinha esse predicado; nascera com ela incrustada, transpirava e exalava seu perfume, gesticulava e a dizia com facilidade de invejar, sem ter ao menos composto verso qualquer. Mesmo estando morto abaixo da cintura em razão da poliomielite, e preso à sua pesada cadeira de rodas que limitava movimentos, dizia coisas que nós, meninos sãos de corpo e alma e de agilidade de serelepe jamais fomos capazes imaginar, quanto mais sentir ou pensar. Seus olhos azuis tinham as cores da sensibilidade na tez enfraquecida e esta amoldava o sentimento de tal forma que qualquer frase que dissesse, soava diferente, como soprada pelas musas das canções para Zeus, no Monte Olimpo.
No dia seguinte ao chegar à escola, estava penteado e sem brilhantina. Olhou para nós e disse com gozação:
- Sabem o que descobri? Que a casa da gente é como a gente: tem pernas como nós, só que fincadas no chão; tem os olhos que são as janelas, a boca que é a porta[2], o telhado que é sua cabeça e tem até fiofó... que solta pum de fumaça pela chaminé... – E riu tanto que deixou a turma toda atônita. Havia se tornado um de nós.
Pois bem, o tempo, esse vento ingrato que sopra nossa vida a seu bel prazer, tirou-me daquela escola e acabei perdendo o contato com a turma. Hoje, de cabelos brancos e ralos, olho meu passado de cima de uma escada; os degraus do ontem sustentam aquele que me apoia, para lembrar as criancices que vivemos. Quanto a vivemos, meu Deus!
Dia desses voltei àquela cidade e estava mudada; as pedras das ruas não reconheceram meus sapatos; eram outras, sufocadas e angustiadas pelo piche. Procurei pelos amigos de ontem e os encontrei, alguns pançudos de prosperidade, outros desdentados de pobreza, mas com cara de amigos e isso foi bom. Indaguei por Pedro: me disseram que há muito se mudara para o exterior, foi se aperfeiçoar em filosofia, e nunca mandara notícias.
- É... – meditei – Pedrinho deve estar filosofando e poetizando em inglês, francês, alemão, árabe, japonês, mandarim, hebraico ou grego, e deve estar compondo poemas que são representados pelas musas a Zeus, porque ele é capaz, é capaz de tudo... até de voar, beliscar bunda de nuvens, viver Mercúrio, Apolo, Hércules, Teseu...
Perguntei então sobre seu sítio e a resposta se estampou em meu rosto como uma demão amarela:
- Virou cidade – disse um.
– Bairro de ricos – disse outro.
– Uma beleza – complementou o terceiro.
– Acabou tudo...
Então, tomado de indignação, pedi licença e despistei; não adiantaria reclamar; apenas manter registrado o que Pedrinho dissera naquele dia de visita ao lago, que a natureza é homogênea e mantém seus seres associados; e o exemplo estava lá com as garças se alimentando e ao mesmo tempo alimentando os peixes e o lodo com seus excrementos, na simbiose que só a natureza sabe fazer.
Na minha mente um pano preto desceu como a cortina do fim de um espetáculo, mas nela não estava escrito The End dos fins dos filmes americanos; havia um resto de fita sendo passado.
Eram as máquinas possantes de alguma empreiteira com suas majestosas e carrancudas lâminas, pás e colheres destroçando o capão de mato e matando a paineira careca como se fosse o monstro do Lago Ness.
Eram homens com seus aparelhos modernos sufocando o riozinho do meio do mato e colocando torniquete na garganta gelada da mina cristalina que, juntos, abasteciam o lago.
Eram esses mesmos homens com suas máquinas mortíferas sangrando as águas na outra ponta, até que todo o lodo aflorasse e se expusesse ao sol para morrer de calor; e o milhar de peixes aos pulos, sufocados à procura desesperada do oxigênio que lhes faltava nas guelras, para tudo ser sepultado por centenas de caçambas de terra trazidas sabe Deus de que jazida.
E as garças em bando sobre uma árvore careca? E os panapanás transportadores de húmus?
Bem, esses, a gente ainda pode ver em cartões postais... ou no Google do computador. São os tempos, são os ventos, são os homens...
...
(MEDALHA DE PRATA EM CONTO NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE OURO EM CONTO NO JÚRI MILITAR)
As mãos de Jacinto
Cidade onde todos quase se conheciam, Jacinto era alegria no seu jeito simples de ser: sapatão encardido, palheiro por detrás da orelha, camisa desbotada, calça de vários dias, chapéu de palha. Mas de uma simpatia de dar inveja.
“-Jacinto é de boas mãos”, falava meu pai quando se referia ao verdureiro e jardineiro que não se furtava em ajudar a todos. “- É só botar as mãos que a semente germina, a planta cresce, floresce e dá frutos, coisa santa as mãos desse homem... ... não conheço outro nessas minhas andanças.” E complementava: “- Quando morrer Jacinto, ó” – e batia a palma de uma das mãos nas costas da outra, em sinal de que tudo estaria perdido, porque não haveria outro a lhe tomar o lugar.
Se o vivente precisasse espantar cigarrinhas dos pastos, pulgão das couves, cascavel do roçado e formiga cortadeira do arroz, bastava chamar o velho que com suas rezas espantava a praga intrusa.
Era pá e buff! - No dizer daquele povo.
Nas manhã das terças e sextas, ouvia-se a corneta do verdureiro anunciando frutas e verduras frescas, colhidas na horinha.
Fazia ponto bem próximo de nossa casa, onde a molecada se acotovelava para ganhar banana, laranja, mexerica ou fruta-do-conde, dependendo do tempo das frutas. Mas tinha uma condição. As cascas deverim ser colocadas em uma lata que seria levada à lavoura e servir de adubo.
Jacinto não desperdiçava uma só folha, um só talo. Quando ninguém, especialmente os homens do governo pensavam na preservação do ambiente, na conservação nas nascentes, no trato da poluição, o matuto com sua sabedoria dava lições que não foram aprendidas.
O interessante é que os maços de verduras que vendia vinham enfeixados com fita de folhas de bananeira e sempre acompanhados de uma flor: ou era uma rosa, ou um cravo, ou uma margarida e até flor do campo que ele pacientemente colhia para suas freguesas.
E as presenteva na sua simplicidade.
Às vezes escolhia-se as verduras pela flor que as acompanhava. Mamãe conservava um vaso de louça na mesa da cozinha, sempre pronto para receber as flores de Jacinto.
Acho que as outras mães faziam a mesma coisa, porque era comum ver vasos de flores sobre a mesa da cozinha.
O tempo foi passando, a cidade foi crescendo, nossas vidas se modificando. Os moleques cresceram, aos poucos viraram homens e ganharam o mundo na modernidade que a vida proporcionou.
Outros moleques agora se aboletavam na carroça de Jacinto. E os maços de flores continuaram enfeitados com flores.
A figura de Jacinto, no seu contexto e dentro do seu mundo definhou com o tempo, com suas rezas fortes, hortaliças lindas, frutas açucaradas e flores perfumadas.
Até que numa manhã de inverno a notícia ganhou a cidade: o velho fora encontrado morto no banhado, supõe-se dos males do coração, enquanto colhia agrião.
Tinha ao seu lado uma maço de flores recém cortadas, prontas para serem afixadas à iguaria e entregues às freguezas de sempres.
O vaso de flores, agora vazio da nossa cozinha, foi retirado sem que ninguém dissesse palavra, pois o respeitoso silêncio foi a oração que mamãe dedicou ao verdureiro gentil."
(MENÇÃO HONROSA EM CONTO NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE BRONZE EM CONTO NO JÚRI MILITAR)
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“O orçamento deve ser equilibrado, o Tesouro Público deve ser reposto,
a dívida pública deve ser reduzida,
a arrogância dos funcionários públicos deve ser moderada e controlada,
e a ajuda a outros países deve ser eliminada, para que Roma não vá à falência.
As pessoas devem novamente aprender a trabalhar, em vez de viver às custas do Estado “.
MARCO TULIO CÍCERO, Ano 55 AC.
A história pode ser chocante, não se sabe se verdadeira, talvez até mal recebida, mas cabe no contexto.
Diz-se que os esquimós, vivendo no Ártico, uma das regiões mais frias da Terra, sobrevivem da caça e da pesca… Na luta diária pela existência praticam a caça e a pesca, entre elas, a caça ao lobo.
Pelo seu lado, o lobo é arisco, predador e faminto – em razão da condição inóspita de seu habitat. Possui faro excepcional, conseguindo perceber o cheiro de estranhos à distância.
Pois bem, o esquimó desenvolveu um método infalível – embora sanguinário – para caçar lobos: banha uma faca de lâmina extremamente afiada (dos dois lados) em sangue expondo-a ao frio. Como é de se esperar, uma camada de sangue e gelo se forma ao redor da faca. Esse processo é repetido por diversas vezes, até que o “sorvete de sangue” ganhe tamanho na proporção desejada.
Farejando o sangue, o lobo se aproxima e passa a lamber o conteúdo do sorvete sem perceber que ao tempo em que o lambe, sua língua se anestesia pelo contato com o gelo. Como é animal faminto, procura comer depressa o mais que possa de maneira quase insaciável, e assim sem perceber, ao atingir a lâmina ele se corta. Com a língua anestesiada não percebe que está a lamber o próprio sangue, agora mais saboroso que o preso à lâmina.
Ao se saciar, está sem forças necessárias para se manter em pé e para lutar; e acaba se entregando à morte.
Trazendo esta pequena história para os fatos recentes do Brasil do Mensalão, do Petrolão e agora do Eletrolão, sem contar com o que vai ser apurado ao se levantar as pontas dos tapetes do BNDES e as dezenas de outros escândalos chegados ao nosso conhecimento depois que o PT assumiu o governo, e comparando os agentes envolvidos com os lobos famintos do Ártico, conclui-se que a “fome” incontrolável e insaciável pelo dinheiro e pelo poder os fez procurar a saciedade com tanto ímpeto que não se aperceberam que estavam a “lamber lâmina afiada”.
Nem se importaram que o “sangue” que dá popularidade, confiabilidade, segurança e sustentabilidade ao governo fosse sendo absorvido por eles próprios que como os lobos vorazes se consumiram a si mesmos, em detrimento de toda uma filosofia de mudança e de um desejo de evolução que envolveu com película verde-amarela a esperança toda uma população necessitada de governo destemido, eficiente, probo e patriota.
Fica, infelizmente, a decepção – até dos mais céticos como eu.
(MEDALHA DE PRATA EM CRÔNICA NO JÚRI MILITAR)
Ipê-amarelo
O dia nasceu resplandecente ao som de meia dúzia, ou de oito ou nove bem-te-vis que na sua língua estridente e na maior algazarra cantavam a beleza do amanhecer. Parecia que se juntaram apenas para dar bom dia ao dia.
Quando ela mal descortinou a janela, o sol recém nascido embarafustou-se por vãos entre nuvens e focou num único ponto o raio de sua luz: o ipê-amarelo do jardim que naquela noite se perfumara em silêncio e se abrira todo em flor.
Fizera-se uma maravilha de ser visto. E sentido. Um lindo leque reluzente aberto a mostrar-se imponente.
No momento em que o êxtase se fez presente e lhe tirou um espasmo na respiração, não pôde conter um sorriso pelo enlevo de que foi tomada.
A projeção da luz solar em facho, como a de um grande holofote projetado sobre o ipê, conferiu-lhe uma visão de vitrais, tão perfeita e bem acabada.
O jardim se enfeitara com as flores de um amarelo vivo que contrastava com as cores das demais plantas, se sobrepondo a elas num esplendor só seu.
Não resistindo em observá-lo apenas pela vidraça, abriu a porta e recebeu um lanço de brisa fria que lhe refrescou o sorriso, despenteou-lhe os cabelos e tentou levantar sua saia. As mãos, ligeiras, porém, grudaram-se nas coxas e impediram a má criação eólica.
– Pestinha! – Teria dito ao vento que se escafedeu casa adentro e se aquietou.
Depois, outra passada de dedos ajeitou a quase gadanha recolocando os cabelos sobre as orelhas.
Arrumou os chinelos nos pés, pisou na grama, aproximou-se da árvore, alisou-lhe a casca e se viu sorrindo. Ainda com o mesmo sorriso que lhe brotara quando abrira as cortinas e a vira florida como a convidá-la para fora.
- Lindo você está meu ipê. Simplesmente maravilhoso! Obrigada pela florada. – Disse em voz alta. - E deu umas tapinhas na casca como afagos de contentamento que os amigos trocam quando se encontram. E fazem festa.
É claro que outras floradas anuais já haviam acontecido, mas nenhuma como a de agora com esse encantamento e desenvoltura. Cachos e cachos de 2
amarelo-ouro pendiam envergando os galhos e se agraciando com a brisa fria que acariciava suas pétalas em corneta.
Olhou para os lados e viu somente casas carrancudas com seus gradis de ferro batido fechados com trancas, que mais pareciam cenhos severos e preocupados com a violência que grassa nossa vida nesses dias. Coisa triste dessa realidade que obriga a que sejamos prisioneiros da insegurança, sem que nossas autoridades movam uma palha para a reversão do problema.
Ao que parecia, o barulho alegre dos bem-te-vis não teria sido capaz de despertar os vizinhos e fazê-los se levantar para ver o dia e admirar seu ipê sendo abençoado pelo sol nascente, o que era uma pena, porque visão como aquela do sol derramando seus fachos matinais como um flash interminável sobre as flores amarelas refulgidas, dificilmente iria se repetir.
Não tinha ninguém dentro da sua casa que pudesse sair e compartilhar tal beleza: o marido se fora para os céus; e os filhos ganharam asas e voaram para os leitos de suas esposas em busca da proteção do amor e da vida.
Assuntou mais um pouco torcendo para que alguém abrisse alguma janela e sentisse o mesmo prazer que a fazia vibrar e se enternecer, mas nada de novidade aconteceu. Somente a volúpia do vento continuava a despentear seus cabelos e a soprar por teimosia de baixo para cima a saia de algodão.
Sentia-se uma felizarda com a visão e ao mesmo tempo entristecida, pois queria, mas não podia compartilhar a beleza com os demais. Estava só. Voltou-se para a árvore e a abraçou cingindo-a por inteiro. Era o mínimo para dar vazão aos doces sentimentos.
A casca áspera com suas saliências marcou-lhe a pele fina, mas ela não se importou. O incômodo do contato da pele com a rusticidade da casca era de somenos importância em relação à beleza do instante que vivenciava. Sabia que a florada do ipê é efêmera e que dura pouco mais de um dia, mas sentindo que precisava gozar aquele prazer, deixou-se ficar.
Recordou-se nesse pouco tempo de reflexão, do dia em que o plantara, trazido que foi pelo marido em uma pequena caixa de papelão.
Era apenas um brotinho inseguro de pouco mais de dez centímetros preso a um pequeno e duro torrão que, não tendo força para preservá-lo além da germinação, deixou que suas raízes finas saíssem da terra e balançassem no ar a procura de sobrevivência.3
Buraco feito, adubo de galinha com um pouco de cinza para fazer-lhe a cama de nutrientes, muita água fresca que foi absorvida por ela e pelo solo, a plantinha logo pegou viço.
Cresceu o ipê sendo escorado por uma vara de bambu, até que já forte, cheio de galhas e independente de tratos especiais, passou enfrentar sozinho a vida, e, como fora plantado no jardim, sempre recebeu água fresca na medida, daí o luxo empoado do floral que agora orgulhosamente exibia.
- Puxa, vida, quanto tempo se passou! – Exclamou quando se deu conta de que os anos fluíram tão rápido. - Quinze, vinte que isso acontecera? – Não se lembrava.
Apenas permaneceu ali agarrada à pele cascuda do ipê-amarelo que lhe enfeitou o dia e deu àqueles momentos graça e beleza, além de proporcionar que seu brilho intenso, aliado ao do facho de luz do sol, penetrasse seu âmago e deixasse mais pura sua alma de mulher madura que tem na casa de moradia seu forte, seu aconchego, segurança e seu destino. E por que não dizer, seu mundo?
Assim ensimesmada e sem que se apercebesse, um canudo lanceolado amarelo de flor se desprendeu lá de cima e desceu, circulou no ar e se enroscou nos seus cabelos despenteados.
Coincidência, ou teria sido propositalmente depositado ali pelo vento como uma troca muda de carinho do ipê em retribuição aos cuidados e desvelo a si dedicados?
Ouvira um dia que os olhos são a entrada pela qual a beleza penetra sem pedir licença para encontrar a alma e fazê-la pura; e que as palavras em forma de escrita que possam brotar desse encontro são fotografias instantâneas do momento vivido, e assim devem ser preservadas eternamente.
Aquele instante mágico entre ela e a natureza, pois, foi guardado como um registro fotográfico que iria ser levado para a posteridade com as demais coisas boas que lhe aconteceram na vida. Digamos como um álbum de boas recordações.
Felicidade seria isso? Envolver-se sozinha com a resplandecência do sol nas flores de um ipê numa manhã de fim de inverno?
Não teve resposta. E nem precisava. Apenas continuou a sorrir.
Já dentro de casa, na lida comum com os utensílios, sem esquecer o que lhe acontecera naquela manhã inusitada, pôs-se em dúvida entre o guardar para si o que vira e vivera e dar o fato por encerrado a exemplo de tantas coisas que lhe aconteciam e que dormitavam na solidão de sua viuvez, ou se deveria descrever4
num papel a extrema felicidade que lhe foi oportunizada pelo seu ipê, com direito até de ganhar uma flor-corneta perfumada para os cabelos.
Essa ficou sendo a questão.
Pensou, pensou, mediu prós e contras e decidiu: passaria para o papel a experiência sim, nem que o texto, à sua maneira, feito às pressas, contivesse alguns erros de grafia ou de concordância e não tivesse o cuidado e o esmero de uma escritora quando se põe a editar suas obras.
Faria da mesma forma como redigia suas listas de compras de supermercado ou suas receitas de bolos e pudins, copiadas das embalagens de trigo e de açúcar.
É, faria isso.
As limitações de cultura, a pouca prática com a redação e o contato não muito constante com a literatura não a impediriam assentar no papel suas impressões. A manhã fora muito linda para ser guardada apenas na memória, e seria ato egoísta seu não contá-la, coisa feia que não concebia. Então escreveria de maneira simples e o mais rápido possível para que as lembranças não fossem sendo apagadas com o passar dos dias por consequência da idade.
Tentaria botar no papel de uma forma objetiva para que se e quando o registro fosse lido por alguém, pudesse servir de aviso e até de alerta, chamando a atenção para uma resposta que muitos procuram e que por julgarem-na complicada, acabam por não encontrá-la: o significado de felicidade. Pois ela é muito simples, calada, humilde e feita de instantes.
É a sensação plena de satisfação e de equilíbrio que vem despida do sofrimento e da inquietude que a vida traz com suas sinuosidades, calosidades, baixios, rampas e cumes, dificuldades e amenidades.
- A felicidade é feita de momentos! Está aí a resposta que tantos procuram, batem cabeça e se perdem na insatisfação. É feita de momentos pequenos, grandes, médios, não importa. Vividos a dois, a três, a mil, ou até mesmo pela pessoa sozinha, como no seu caso.
Basta que se tenha o coração e a mente abertos para enxergá-la e recebê-la; e haja disposição para aceitá-la, absorvê-la e tê-la como companheira de vida, como esse observar da florada do ipê-amarelo numa manhã de sol solta no calendário, por exemplo.
- Simples e linda! Retrato fiel da natureza para ser curtido.5
Nessa ânsia de marcar o seu propósito, pegou a caneta, um papel e escreveu:
“O dia nasceu resplandecente ao som de meia dúzia, ou de oito ou nove bem-te-vis...”
...
(MEDALHA DE PRATA EM CONTO NO JÚRI CIVIL)
MINIBIOGRAFIA:
Renato Benvindo Frata é Professor universitário aposentado (69 anos) e Advogado.
Ademais, é o Presidente de Honra da Academia de Letras e Artes de Paranavaí e Membro da InBrasci, de Paranavaí, PR
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RÔMULO CÉSAR MELO (RECIFE - PE)
transcender
no mar
transcendia
coberto de anil
cabelos de algas
e do peito aberto
explodiam
peixes transparentes
águas vivas suspiravam
enquanto levitava
saltavam linhas do coração
feito âncoras o prendiam
à areia molhada
anzóis de flores
abria as mãos com as palmas
para cima voltadas das
chagas dos pregos nos pulsos
estrelas verdes avoadas
flutuando numa dança
caravelas cintilantes
bailam no escuro do oceano
os olhos miravam às nuvens
pétalas caíam quando chovia
notas melódicas de assovios
partiam feito passarinhos
soltas pelo ar
vivia preso à terra
transcendia no mar
caminhava sobre as águas
(MEDALHA DE PRATA EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
Traz ela de volta
Levantava primeiro. Escovava os dentes, trocava de roupa, preparava o café, trazia na cama. Ela despertava com o som das cortinas se abrindo e o sol que invadia o quarto através das janelas. Mais uma linda manhã para vivermos a vida, meu bem. Onde está Eve, querido? Tomou café e me espera para sairmos juntos. Tem certeza de que ela está lá embaixo, você a viu? Sim, amor, igual a todos os dias. O que farão hoje? Vamos à missa, depois deixarei na escola; almoçaremos no clube da praia e passaremos a tarde nos divertindo à beira do lago. Traz ela de volta? Claro, amor, sempre. Vou revelar as imagens para mostrar como foi fantástico mais esse dia que Deus nos presenteou. Não esqueça de comungar com ela na missa. Tudo bem, querida, não se preocupe. Vá descansar.
Tinha a mania de andar para trás como se quisesse voltar, nunca chegava, sempre vinha. E somente via as horas no relógio por meio do espelho, ao contrário, o tempo em retorno, centavos de minutos, os segundos, um a um, deslizando para trás. Descia as escadas, olhava no espelho da sala o terno impecável, ajeitava a gravata borboleta e puxava o chapéu do descanso; seguia até o atelier, pegava a palheta, o suporte e saía. Entrava na papelaria do bairro. Bom dia, senhor Claude, o de sempre? Sim, Maurice, o de sempre. Quantas? Seis folhas. E tinta rosa, por favor. Passava na padaria e recebia o prato de alumínio ainda quente. Chocolates e cigarros, por gentileza. Quantas carteiras hoje, senhor Claude? Uma só, Jean. Estou com tosse e secreção.
De costas, tomava o caminho de areia vermelha atravessando a pequena ponte de madeira para sentar num dos bancos de frente ao lago. Era uma manhã em que os pássaros se escondiam nos ninhos e esquecera o sobretudo em cima do sofá, tremia, e fumava para aquecer. Tudo bem, nada mais faz mal. Sentindo frio me percebo vivo. Analisava a luz do sol, estava perfeita. Preparou o suporte com o papel, a aquarela e começou a desenhar os primeiros traços. Escolheu o amarelo e o azul para compor o céu, na tela as crianças brincavam no parque da escola, Eve, de cabelos loiros e soltos, olhos verdes, pulava amarelinha; virou a página, pintava uma vista do mar, o céu de uma tonalidade mais escura, nuvens brancas, as águas num tom esmeralda com vagas em pontos alvos, as mesinhas brancas com homens de terno preto e gravata borboleta servindo os pratos, enquanto Claude brindava com a filha em taças de prata.
Esqueceu a missa, precisava ter ido à igreja, a esposa cobraria mais tarde; virou a folha, escolheu uma tinta mais escura. O altar talhado de madeira em prata e dourado cercado de imagens sacras, um padre elevando as mãos com o Cordeiro de Deus, enquanto ele e Eve, de joelhos, rezavam logo após receberem a comunhão. A hóstia sagrada tudo pode e salva, repetia Madeleine, deitada na cama de onde nunca mais levantou desde o último dia. A hóstia no vinho é o corpo e o sangue de Jesus e quando descer pela garganta da nossa menina, tenho certeza, Claude, quando chegar no estômago, o intestino e o pâncreas, tocará os órgãos removendo os tumores, tudo voltará a ser como antes, querido. Não, não é loucura, ouvi, juro, ouvi a voz do anjo, tinha cabelos loiros, entrou pela janela numa tarde calma e disse que Eve seria salva, jamais nos deixaria, precisava comungar todas as manhãs, está me ouvindo, todas as manhãs entre as seis e as sete horas. A hóstia traz ela de volta, traz ela de volta, traz ela de volta, tem misericórdia, Senhor.
Hora do almoço. Sentou-se no banco de madeira e abriu a marmita àquela altura fria. Mastigou a carne, depois o macarrão ao molho de tomate, as verduras, o alface verdinho quase da cor dos olhos dela, quando ainda abertos, o corpo cansado da mocinha, abatido, pernas e braços eram gravetos, Eve era um galho perdendo as folhas, os fios, deitada com a cabeça sobre o colo do pai, ali mesmo no banco, enquanto ele alisava os cabelos loiros. A face encovada, os olhos fundos e roxos, enquanto a tarde caía, de uma tonalidade alaranjada do sol se pondo, indo embora, o céu arroseado, preparando-se para ficar negro, ela dizendo que estava escurecendo as vistas, embora ainda cedo do dia, tudo preto, estou cega, e o sol se pondo ...
Terminado o almoço, Claude recordava que o pai mantinha bem guardada a foto do avô, em preto e branco, uma lembrança do senhor de bigode e chapéu. "Eve jamais terá fotos minhas em sua casa, nem terá uma casa dela. E, para mim, será a eterna personagem nas telas". Levou as pinturas debaixo do braço quando a noite chegou. Subiu as escadas e armou o suporte de frente à cama de casal.
Ainda estava acordada, sonolenta por conta dos remédios, pediu para ver as fotos do dia. Eve está lá embaixo? Comungou? Cadê a foto da igreja? Tentava se levantar, mas as cordas que a amarravam impediam. Da última vez que se viu solta tentou morder os pulsos, se não fosse a enfermeira paga para ficar vinte e quatro horas ao lado teria mastigado as próprias veias. Claude passava as folhas, uma a uma, como um filme de um dia feliz compartilhado entre pai e filha.
- Ah, tão linda a nossa Eve. Pulando corda, comungando, almoçando no clube, essa fotografia está ótima, deitada no seu colo, Claude, sua menininha. Como é bela, os cachinhos loiros, imagine o quanto ficaria feia sem cabelos, ainda bem que está lá embaixo, tem vergonha de subir para ver a mãe, deve ser medo, essas cicatrizes no meu rosto, pode até parecer que estou tentando me matar, mas por qual motivo? Maldita parede que me atingiu com as pancadas na cabeça, imagine, acharam que eu tinha metido a cabeça nelas, essas paredes modernas andam bastante e nos machucam. Estou ficando com sono, muito sono. Amanhã, Claude, quando eu acordar, prometa, traz ela de volta?
Claude fecha os olhos deitado ao lado da esposa. Demora a dormir mais um dia, outro e outro... "Logo serei eu. É borrar o quadro até acertar a mão. Errar os tons, exagerar, melar tudo, rasgar o papel e recomeçar". Enquanto divaga, imagina-se pintando o último quadro, uma gruta, a entrada, a pedra enorme ao lado; Eve de pé, corada, robusta, cabelos loiros, braços abertos...
(MENÇÃO HONROSA EM CONTO NO JÚRI CIVIL)
Invisível som de gaita
Sentado na calçada próximo à entrada da estação de metrô, ouviu as sirenes em alto volume e alguém o puxou pela camisa até o lugar mais protegido do bairro de Scheunenviertel, transformado num abrigo anti ataque aéreo. Nos corredores, as pessoas tinham de passar em fila diante do aperto das paredes descascadas com extintores vermelhos pendurados, aspecto de sujeira, até chegarem a espaços mais amplos, onde desciam escadas com degraus e corrimão de alumínio. Defronte aos banheiros, a sala de controle, resumida a uma mesa, um telégrafo e um armário com máscaras de proteção contra eventual ataque com gás; dois pares de beliche, onde dormiam três ou quatro soldados, controlando o acesso das pessoas, o pouco de água, mantendo a ordem e afastando qualquer espécie de disputa à base dos cassetetes e coronhadas.
O menino podia ouvir as conversas, o burburinho reflexo da agonia, o barulho do corre-corre, o cheiro de fumaça misturada ao esgoto, o choro, os gritos de lamentação, alguns reclamavam da escuridão que para ele já era bem conhecida. Siga os dizeres das tintas fosforescentes, filho, indicam o caminho aonde seguir, dizia aquela voz calma e rouca, certamente algum idoso. Sentia o cheiro da tinta que arranhava as narinas fazendo espirrar, tateava as paredes crespas procurando uma porta, quando uma mão pousou sobre o ombro. Alguém o guiava e ao sentir a pele enrugada dos dedos teve certeza de que se tratava da mesma pessoa que o havia conduzido àquele ambiente.
Sentados, lado a lado, ouviam o silvo terminar num estrondo, as bombas da Royal Air Force explodiam cada vez mais perto e o menino apertava a mão do guia. No início do conflito, Joseph, o senhor de cabelos brancos, dono de um azul de mar dentro das vistas, chegava ao abrigo, com certa dose de calma, carregando a maleta com água, comida e a gaita de estimação tocada desde a infância, presente dos pais. Tentava disfarçar a cifose que o fazia olhar o chão mais do que as outras pessoas, usando um casaco grosso, o gorro e o cachecol, para passar somente vinte minutos na estação do metrô.
Com o passar do tempo, cada vez mais se intensificavam os bombardeios e a espera foi se tornando maior. As pessoas vestiam várias roupas, uma por cima da outra, nas maletas levavam documentos, comida, joias, fotografias e já não se sabia quanto tempo poderia durar até a chegada da autorização para deixar o abrigo, na forma de dois toques seguidos de sirene. Ninguém poderia entrar armado ou com objetos cortantes, diante do aperto de mais e mais pessoas, havia o medo de suicídios e brigas entre os refugiados. Agora, com a derrocada alemã, os soldados já nem pediam documentos de identificação, fazendo com que ali também se protegessem estrangeiros e até mesmo judeus disfarçados.
Onde estão seus pais, menino? Dormíamos quando houve a explosão. Acordei com os olhos cheios de areia deitado numa cama ao lado de uma mulher vestida de branco. Lamento bastante, filho. No início foi difícil, mas nem choro mais por mim, sabe, de verdade. É que ainda se pudesse enxergar jamais poderia ver minha família outra vez, isso é ruim; nessa guerra chata só se vê gente morrendo, melhor viver e quem sabe morrer no escuro mesmo. E o senhor, onde estão seus filhos? Não tenho mais ninguém além de mim.
Joseph abriu a maleta e pegou a gaita prateada. Soprava e o som saía abafado, como se o coração do velho pudesse cantar, assobiar as dores, destilando o veneno que lhe consumia através da música, as lembranças, a melancolia tomava conta daquele lugar sombrio, uma orquestra à percussão das bombas explodindo; cada vez mais perto. Os demais abrigados, reconhecendo a melodia, começaram a acompanhar, bem baixinho. A canção de ninar de Brahms transmitia calma.
O menino, de olhos fechados, para ver melhor dentro da mente, lembrava a mãe segurando a mão, a irmã deitada na cama vizinha, o barulho das bombas clareando a janela, ao redor tudo era escuridão, nem uma vela se poderia acender, um breu igual ao que as vistas agora poderiam testemunhar. Recordava as palavras dela um dia antes do fim: jamais diga seu nome de verdade, jure, ninguém merece confiança numa guerra, faça isso por sua mãe, senão terá o mesmo destino do seu pai. Deitou a cabeça no colo do novo amigo e chorou um pouco mais, até o sono estancar as lágrimas.
Joseph e o menino comiam a mesma ração, o velho havia dividido um pedaço de pão com água para os dois e tentavam esquecer o odor de suor, urina e fezes que impregnava o ambiente, além do calor e a falta de ar. Sentiam-se como se estivessem dentro de uma caixa de sapatos jogada no chão de um banheiro público. As pessoas se agarravam aos pertences com medo dos ladrões e engoliam os reclamos sobre as condições do lugar, com receio de serem denunciadas pelos partidários do Nazismo, um silêncio imposto pela vontade de viver. Toque mais um pouco, amigo, toque para eu dormir. Joseph tocava e os abrigados se aproximavam à penumbra, somente a lua entrando pelas frestas, o choro ouvido de todos os cantos.
Um grito feminino quebra o clima de paz. Faz menção de por a mão sobre os olhos do menino para que nem veja a cena, uma mãe de joelhos defronte ao corpo da filha adolescente que jaz balançando com um lençol amarrado no pescoço. Que houve, tio? Pensa em explicar que é comum às mulheres, ali no abrigo, se suicidarem com medo dos Soldados Vermelhos que, diziam, estavam próximos a Berlim. A propaganda nazista pintava os russos como filhos do demônio, bárbaros, coitadas das mulheres se seus homens perdessem a guerra. Nada demais, filho, uma senhora com crise de nervos, guerra é isso mesmo, suor, mau cheiro, fome, sangue e choro, muito choro.
Quando os soldados retiraram o corpo e a mãe os acompanhou pelos corredores, o choro foi ficando mais baixo, mais baixo, até que se ouviram as batidas desesperadas na porta de saída. Deixe-me sair, enterrar minha menina, esmurrava a porta por onde ninguém poderia passar sem autorização; e um seco estampido calou tudo. O velho recomeçou a tocar na gaita uma música alegre e a noite foi passando como se nada tivesse acontecido. Cada um sentia a própria dor e já era suficiente, uma anestesia contra a dor dos outros, conviver com a morte iminente parecia cruel, mas com isso o ser humano também se acostuma, pensava Joseph.
Ouça, filho, a batalha está acabando, assim como tudo um dia morre, os combates também têm fim. Hitler perderá essa guerra. O mundo e a natureza reagem, seja por invernos rigorosos, seja por doenças, traições e assassinatos, no final, a tirania sucumbe, ninguém domina tanta gente por tanto tempo. Esse é o jogo da guerra e da vida. Outra coisa, preciso dizer. Estou sem meu remédio, o último acabou ontem, nenhuma previsão de chegar, ainda mais nessa confusão. É possível que nem veja o final desse pesadelo e se isso acontecer fique com esta maleta. Cuidado, têm dinheiro e joias de família, um colar de diamantes, um brinco de pérolas e uma fotografia, tudo que restou da minha esposa. É seu. Procure por Lothar Schindler, um comprador de joias do centro de Berlim, diga que é neto de Joseph, fará um preço justo e cuidará de sua segurança, o meu amigo é um bom homem.
O som dos bombardeios e as rajadas das metralhadoras diminuíam a cada hora, ao passo que a vida de Joseph se esvaía. Fraco, tossindo bastante, os lábios arroxeados, respondia às perguntas do menino com certa dificuldade. Há quatro dias em confinamento, restavam algumas bolachas e um pouco de água. Pegue a foto dela, vá tateando até encontrar um pedaço de papel, por favor, ponha na minha mão. Está morta, tio? A esta altura temo que sim. Nada pude fazer, juro, foi sorte estar aqui falando com você. Levaram-na quando estava fora de casa. Tenho sede, pegue o cantil e me dê um gole de água, sinto frio. O senhor vai morrer também, tio? Não chore. Na guerra somente existem mortos, alguns ainda se acham vivos, mas são mortos, mais dia menos dia descobrem. Escute com atenção o que vou dizer agora: o cimento em seus olhos não impede que enxergue com o coração. Viva, filho, continue por mim. Tio, o meu nome é Jacob Stein, queria que soubesse.
Quando os americanos chegaram rendendo os últimos nazistas, Joseph estava de olhos fechados. Então, o menino pôde vê-lo, pela primeira e última vez, andando em direção ao corredor de saída sem ser impedido por ninguém. Em sua direção, caminhavam várias pessoas vestidas com uma roupa listrada. No meio delas, uma bela senhora se destacava pelo sorriso. Depois, a luz se apagou trazendo a escuridão de volta. Durante toda a vida, antes de dormir, o pianista Jacob Stein continuava a ouvir o invisível som da gaita, a eterna canção de ninar.
(MEDALHA DE OURO EM HISTÓRIA MILITAR NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE BRONZE EM HISTÓRIA MILITAR NO JÚRI MILITAR)
Wolver
Deveria ser assim o sonho de um filho. Poder continuar, embarcar junto nele e com ele esticar a corda até quando aquele menino, que parece você sendo menor de tamanho, embora muito mais especial, quiser sonhar, apenas deixa, deixa. Papai Noel existe, pai? Claro, você tem recebido os presentes nos Natais, num é verdade? Como pai, apenas apoio e acredito naquilo que ele quer acreditar. Afinal, o tempo da realidade chegará um dia e os sonhos serão consumidos pela vida nada lúdica. Não serei eu a diluir a fantasia da criança. Eu não. Já bastam os meus próprios sonhos abortados.
O boneco do Wolverine, ao pequeno, não é apenas o mutante dos filmes e desenhos animados. Deixa de ser brinquedo, torna-se amigo. Queria ser o herói de meu filho igual àquele boneco vestindo um uniforme amarelo e azul, garras enormes, com o poder da regeneração que lhe empresta a imortalidade; vejo em mim alguém tão pequeno, um homem comum, um pai, se é que pode haver algo de ordinário na figura que se junta a outra da mesma espécie para gerar a nova alma, uma vida.
No fundo, revela-se o medo de deixar de exercer a contento o ofício sagrado da paternidade, então, quem sabe esse pai claudicante não transfere ao brinquedo a imagem do que gostaria de ser, vislumbrem o quanto seria acarinhado, dormiríamos juntos, filho e brinquedo-pai, seria a criança quem me colocaria aos pés do altar do sono e me tornaria, de fato, importante, diria indispensável aos olhos pueris como é aquele boneco; mas, haverá um dia em que até mesmo o grande e querido Wolverine será esquecido numa prateleira ou doado a outras crianças, tudo passa, tudo é transitório, menos o amor de um pai pelo filho.
Fomos à praia, pedimos petiscos e cervejas, tudo certo, céu azul, sol a pino, o meu menino com o Wolverine mergulhado na piscina feita na areia ao lado do Capitão. Depois os três, o menino e os dois vingadores, foram tomar emprestado pedaços de mar, conchinhas, colocadas num copo de plástico. Sob o sol do meio-dia, confundi os copos e bebi as conchinhas no lugar da cerveja.
Despertei trôpego, sem âncora, marolado, havia água e sal, queimaram dentro de mim oceanos, senti os redemoinhos e todas as correntes marítimas. Ardeu tanto que chorei duas ondas. No estômago samburá se encheu de peixes, sargaços saíam dos ouvidos e os olhos viam o horizonte de um balé mágico de cavalos-marinhos “nem mesmo a chuva tinha mãos tão pequenas” a colherem pedaços daquele mar. Copo mágico. Depois de dois dias ainda incomoda e entorpece o canto das sereias e quando de ressaca sempre sou náufrago.
Ouvi estampidos da fria realidade que me acordaram; depois, formou-se um corre-corre. Será possível, tiros num dia de sol em plena quarta-feira de praia? Sim, o mal das drogas, disseram, um viciado, Galeguinho o nome dele, tombou vazado por cinco balas em plena areia de Porto de Galinhas, como nem se faz na covardia com um galináceo gordo na hora do almoço. Wolverine se agitou, estava tenso, suava decepcionado com o ser humano, somos ferozes, bichos, por causa de dinheiro matamos o semelhante que nem galinha...Onde estava o pai do Galeguinho? Que história existiria por trás daquela vida finda na praia, pelos revólveres de traficantes ou agiotas?
Almoçamos, tomamos sorvete. Foi a última vez que Wolverine foi visto. Só de noite demos por falta; meu filho chorava pelo amigo, havia sumido, o Capitão América se sentia solitário, e agora, papai, o que aconteceu com o Wolverine? O que poderia responder? Foi capturado por Magneto, filhão. Dormimos sem ele. Acordamos num domingo, fim de festa, voltar para casa. Meu filho insistia, não podemos abandonar o Wolverine, pai, o Magneto vai fazer mal a ele como fizeram com o rapaz na praia. Lembrei do episódio da tartaruga. Osvaldo, esse o nome do bicho, foi levado pelas crianças para passar a tarde na casa de um amiguinho da escola. Escondeu-se por lá e nunca mais voltou. Ninguém jamais soube do paradeiro de Osvaldo, coitado. Entendi tudo.
Percebi que não devemos abandonar nossos filhos e suas dores e bichinhos e bonecos. A fantasia ainda é a grande alternativa à realidade. Uma fantasia sem álcool, drogas, careta e sóbria, genuína, uma viagem diferente da do Galeguinho, que lhe custou a vida. Comprei a briga pelo sonho, a ilusão do meu menino, o vilão chamado egoísmo não destruiria a chama da reconquista do X-man perdido. Decidimos voltar à vila de Porto, buscar o herói, toda a família focada em não menosprezar nossas convicções de lealdade, jamais voltaríamos ao Recife sem o Wolverine, um por todos, todos por um. Abramos uns parênteses (Estava cansado, ressacado, queria almoçar na cidade, meu time jogaria às cinco da tarde, mas havia meu filho, o sonho dele, a vontade de não abandonar não apenas um boneco de plástico; um amigo, a chance de mostrar, de fazer o certo e não apenas o blablabla dos pais. Por isso deixei de lado o egoísmo).
Começamos o resgate. Procuramos no restaurante, nas ruas, até chegarmos à sorveteria. Fomos pegos de surpresa, o Wolv, já chamo assim, me sinto íntimo, quase um parceiro, esteve por lá. Estava lá; mas a menina que o achou, desamparado na mesa, só chegaria para trabalhar dentro de duas horas. Porra, duas horas parado numa sorveteria? Se ainda fosse num boteco assistindo ao jogo da Alemanha pela Eurocopa. Houve um instante, confesso, que quase deixei o boneco, os projetos de ser um bom pai e as fantasias sobre a mesa da sorveteria, mas o olhar pidão do meu filho me convenceu de que esperar seria a melhor alternativa. Aprender a esperar, controlar a ansiedade em nome de um bem maior, nada vale mais do que um sorriso de criança.
No meu tempo de menino não havia X-men em filmes. O Superman, sim, era o Cristopher Reeve. E meu pai nunca foi um herói, isso quando estava em casa, dava o ar de sua graça, quantas viagens, quantas viagens, não era o Superman, definitivamente, não, porque viajava de avião, embora se esforçasse do jeito dele e fazia o melhor possível dentro dos limites. Nem eu era o Wolverine. Duas horas sentados, eu e o pirralho, esperando a chegada do X-man. Estava com as garras destroçadas. Já não era o mesmo que nos deixou. Nem eu era o mesmo ao me saber tão paciente com a preocupação do guri.
Não sei se Wolverine, indignado, sem conseguir controlar o instinto de justiça foi atrás do assassino de Galeguinho, tampouco se bebeu todas na noite de Porto de Galinhas ao lado de um amigo mutante do tipo “Homem-Galo da Madrugada” ou de uma dama nada heroína. Jamais entenderia os motivos de não ter ido conosco naquele sábado, nem admitiria á burocrática solução de ter sido apenas um esquecimento de um menino de três anos aliada à desatenção dos pais. Retornou porque nós o esperamos com todo o bem querer.
E voltei a ser um menino que, mesmo adulto, entende que sonhar faz parte da caminhada, é preciso e possível e necessário. Ao ver o sorriso nos olhos do meu filho, ao abraçar com tanto carinho aquele boneco, e depois receber um abraço como quem diz, valeu, pai, pude entender o principal. O amor é o maior bem e tudo que por ele é feito vale a pena, aproveitar cada momento dessa magia de ser pai. Por isso o Wolverine é imortal. Por saber e conseguir volver quando com saudade o esperam. E quando me senti menino virei herói.
(MEDALHA DE BRONZE EM CRÔNICA NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE PRATA EM CRÔNICA NO JÚRI MILITAR)
MINIBIOGRAFIA:
Rômulo César Melo é natural de Recife-PE, trinta e nove anos, bacharel em Direito pela Faculdade de Direito do Recife, UFPE, Procurador Federal, escritor, poeta, autor de dois livros de contos publicados – Minimalidades (Ed. Bagaço/2013) e Dois Nós na Gravata (Ed. Cepe/2015), este último vencedor na categoria contos do II Prêmio Pernambuco de Literatura; e do inédito "Ao lado do guarda-chuva", um dos vencedores do Prêmio Lima Barreto 2014, da Academia Carioca de Letras. Fez parte a Oficina Literária de Raimundo Carrero e do Curso de Escrita Criativa de Sidney Rocha. Atualmente, integra a Oficina Literária do escritor Paulo Caldas. É membro da Academia Cachoeirense de Letras.
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ROSSIDÊ RODRIGUES MACHADO (SÃO VICENTE - SP)
SER ESPERTO
Ser esperto é mais do que correr, competir na São Sivestre; dar aquele salto de metros de arrancar aplausos como atleta de uma Olimpíada; erguer a taça da Copa do Mundo; ser o primeiro da Fórmula Um; colecionar troféus; subir no pódio, vibrar com a explosão da champanhe, da euforia, a alegria, a emoção de campeão, de missão cumprida!
Ser esperto é mais! É ser movido por um espírito dos deuses, fantástico! Prova de fogo que o faz esplendoroso como o rei dos astros. Derrama brilho, calor, galante e sedutor; irradia deslumbre como o do sol no infinito, lá do alto. Amado, venerado pela sua grandeza, seu fascínio, seu valor. Um intenso e infindo vibrar pela energia que de se desprende e sua galáxia ilumina; sem timidez, sem calafrio, sem temor. Encara e abraça o dia a dia, não se intimida frente aos tropeços, aos obstáculos da sombra do não, do vale do desprezo, das farpas da indelicadeza, da irreverência... Sua luta é mais do que a conquista de uma medalha, de um título. Vai além!
Orgulha-se de olhar no espelho, descobrir que sua imagem é de um ser humano como outro qualquer, ninguém é melhor que ninguém, apenas uma diferença, cada um é uma pedra, mas com a liberdade de se lapidar, potencializar o seu brilho, seu quilate, torná-la preciosa pelo o valor do irradiar de sua luz pelo caminho que seu irmão, que seu próximo trilhará. Não importa onde estiver, dependerá de você cintilar na terceira, na segunda ou primeira grandeza.
Aqui nesta terra, a vida é sua aliada, sua companheira. Eis o segredo! No jogo da vida acerta quem se valoriza, investe no seu maior tesouro, o conhecimento. Nada cai do céu e nem vem numa caixinha de presente, mas no solo da mente pode se semear e cultivar a semente que regada pelo seu objetivo, intuição, sua garra e compromisso lhe levará em frente, mergulhar nas letras, na ciência.
Pedras no caminho, dificuldades, quem não tem? Mas problemas se resolvem multiplicando o carisma com um sorriso, somar atitude e perseverança no eu quero, no eu posso, no eu faço. Erguer olhar, vislumbrar com o longe, o horizonte que lhe convida a ir para lá. Não diz onde, nem lhe dá o endereço porque é você que irá determinar onde irá chegar. Sua meta, sua felicidade, seu triunfo não é subir no pódio, exibir um título de campeão, mas aquela chama incendiada pelo exemplo de um sábio, um coração, uma mente que cativa, transborda amor.
Ser esperto é zerar o pessimismo, o comodismo, hastear uma bandeira pelo bem, pela paz de todos à sua volta, contribuir para um mundo sem violência, mais humano, mais justo, sempre melhor!
(MEDALHA DE BRONZE EM CRÔNICA NO JÚRI MILITAR)
(MENÇÃO HONROSA EM CRÔNICA NO JÚRI CIVIL)
ARRAIAL NA ROÇA
Junho. Mês da festança! Do forró! A sanfona: Fon, fon, fon...
É arraial sertanejo, caipira, na roça, no estralar da pipoca!
O homem. Chapéu palha, camisa xadrez, calça remendada;
A mulher. No cabelo laço de fita, vestido florido enfeitado.
Infinito estreladinho, luar prateado; clima romântico, claro!
A chama do coração e da fogueira, acesas, em labaredas...
Ritmo do arrasta pé, todo mundo na quadrilha, dançando!
Pisando prá lá, pra cá, ninguém sentado, o som pra arribar!
Casório! O padre benze os noivos, puxa a orelha. Vai! Filhos!
O correio elegante deixa tantos apaixonados! Sô! Até faz dó!
É festa de família, a mocinha é séria, não namora pra enrolar.
O moço que também é boa gente, casa, chora de contente!
Ta na barraca, na panela. Que fartura! Até pimenta! Tem tudo!
Quentão, bolo de milho, cuscuz, doce de abóbora, amendoim...
Já madrugada, nenhum no sono, nem cochilo. Pra quê dormir?
Sol ri! O pagode segue! Afinal, de dia também pode se divertir!
São João, São Pedro e Santo Antônio, ali, em segredo espiando!
Mas pra que se preocupar? É só alegria! Festar não tem pecado;
O dono da casa pede: pessoal quieta! Juntos, fazer uma oração.
Rezam. Agradece pela vida, os amigos. O ano que vêm vivinhos!
(MEDALHA DE BRONZE EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
MINIBIOGRAFIA:
ROSSIDÊ RODRIGUES MACHADO, natural da cidade de Jataí-GO, residente em São Vicente-SP. Mestre em Educação, Administração e Comunicação; membro da Academia Vicentina de Letras e da Sociedade dos Poetas Vivos em Santos; membro correspondente da Academia de Letras ARTPOP de Cabo Frio-RJ; LITERARTE de Rio de Janeiro; Academia de Letras Teófilo Otoni-MG; e ALG – Goiás Velho-GO. Detentora de prêmios literários (medalha de ouro, prata, bronze e menções honrosas); participação em mais de três dezenas de Antologias Literárias; autora de cinco livros solo: “OÁSIS DE EXPRESSÃO – Reflexão e estímulo, um novo tempo”, 2010; “MACHADO POR UMA MACHADO – Poesias, sonetos e versos”, 2013; “PENSAMENTOS FÉ VIDA, 2014”; FACES DO COTIDIANO – Contos e Crônicas, 2015; Cidade de Cachoeira Alta. Na lembrança. Sempre!!!, 2015; ambos da Scortecci – São Paulo.
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ROZELENE FURTADO DE LIMA (TERESÓPOLIS - RJ)
A PORTA
Uma das manias de Samuel era sonhar acordado, usava a imaginação como se fosse uma ferramenta para lapidar a felicidade em todo tempo livre, lá estava ele a sonhar a dar vida aos personagens que criava. Trabalhava como ajudante de caminhão. Vez por outra tinha a função de chofer. Num desses dias que tudo acontece, ele teve que dirigir o veículo, colocar e tirar a carga, pois o parceiro ficou doente. Uma propriedade muito antiga foi demolida e ele teria que levar o resto aproveitável para um depósito da firma. Num canto estava uma porta de madeira maciça com medidas fora dos padrões normais. Tentou pegá-la, mas a porta era muito pesada, teve que fazer um esforço sobre humano, amarrar com cordas, colocar uma base para acomodá-la no fundo da carroceria. Pela manhã Samuel comunicou ao parceiro que tinha ficado uma porta no caminhão sem descarregar. - Vamos ter que passar pelo depósito e deixar essa porta. – Vai ficar muito fora de mão, hoje temos que carregar areia. O encarregado da demolição quando foi avisado que teria pagar mais um frete por causa de uma porta, perguntou: - Você está precisando de uma porta? Pode ficar com ela para você, é uma porta grande desengonçada sem valor. O rapaz disse para Samuel: - A porta é sua, no meu apartamentinho ela não cabe. Samuel descarregou a porta, colocou-a em pé no fundo do galpão e deixou para lá. Meses depois ele passou por aquele canto e bateu com o joelho com muita força na ponta da porta. Samuel dormia no colchão no chão e quando foi deitar não conseguia dobrar o joelho por causa da pancada na porta. Chamou o pai, fizeram quatro pilhas de tijolos, e a tal porta foi para cima das pilhas entijoladas e a cama ficou excelente. E a partir daí Samuel começou a ter sonhos interessantes que contava ao seu pai: - Pai, sonho que moramos numa casa muito rica, com jardim e tenho três filhos lindos que brincam com a minha mulher; você e mamãe estão por perto e felizes. – É preciso sonhar para poder realizar. Sonhar acordado é diferente. Primeiro vem o sonho e a ideia, a forma vem com o tempo e tempo depende da intensidade com se sonha. Todo sonho passa primeiro pela imaginação antes da materialização. Quem não sonha fica a mercê da casualidade, concluiu o pai de Samuel.
O rapaz apaixonou-se, alugou uma casinha na mesma rua. Casou-se. A mãe resolveu fazer do quarto dele o quarto de costura. - Vamos tirar aquela porta de lá, ocupa muito espaço. Resolveram cortar a porta ao meio para fazer um portão de entrada. Colocaram a porta para fora da casa, em posição para o corte, quando um raio de sol incidiu numa lateral da porta, faiscou um brilho irisado igual quando um brilhante é exposto à luz. O rapaz percebeu que tinha uma pequenina fresta no lugar onde brilhava. Pegou o canivete e devagar com muito cuidado como se fosse um cirurgião, forçou a gretinha e viu que tinha uma tira de madeira de encaixe que foi cedendo à pontinha da lâmina. Saiu o fino, firme e comprido filete e que para o espanto deles, revelou uma fechadura dourada. Seu Carlos notou que na parte debaixo tinha um pequeno quadradinho. Mais uma vez a pontinha da lâmina do canivete funcionou. Retirado o pequeno pedacinho de madeira, apareceu a chavinha. Os dois admirados com tamanho engenho não poderiam supor o que teria debaixo daquela almofada de madeira que deveria medir 1,90cm por 1,70cm. A almofada nada mais era do que uma porta dentro da outra. Passou um arrepio por eles quando viram a data perto da fechadura (MDCLXXIV). Com os corações descompassados levaram a porta para dentro e foram abrir no antigo quarto. Estavam sós em casa e num momento desses quanto menos pessoas estiverem por perto melhor, olhos demais só atrapalham e na maioria das vezes distorcem a verdade. Com a mão trêmula Samuel colocou a chave na fechadura, torceu lentamente, puxou devagar e suavemente. Abriram a porta almofada. Os olhos arregalados e as bocas entreabertas, num misto de pavor, susto e surpresa. Não conseguiram fazer um som, as gargantas estavam apertadas de tanto assombro. Nunca poderiam imaginar o que tinha dentro da rejeitada e disforme porta, que mistério ela guardava por tanto tempo! Toda descoberta vem acompanhada de uma mudança radical, mas aquela era demais! Mexeria com toda vida deles. Fecharam a almofada, isto é, a porta menor, trancaram, guardaram a chave no mesmo lugar, repuseram o colchão e saíram para o quintal. Que fazer agora, qual atitude tomar, com quem se aconselhariam? - Amanhã a gente conversa, não vamos falar nada para nossas mulheres, seria um peso muito grande para elas guardarem um segredo desses, comentou o pai. Na manhã seguinte, eles voltaram e conferiram o que tinham visto, era verdade mesmo! O mistério da modificação a alucinante magia do sonho irreal para o real. É preciso sonhar, reter o sonho por algum tempo na imaginação e soltá-lo no espaço para que encontre o templo da materialização. Uma estante, com várias prateleiras subdivididas em caixinhas de 15 cm. E as três últimas prateleiras com as caixinhas de 30cm. As pequeninas gavetas eram todas trabalhadas com o mesmo símbolo, parecia um brasão. Samuel puxou com muito cuidado a primeira gavetinha, tinha saquinhos de um material de seda finíssima, que protegiam anéis belíssimos com pedras trabalhadas, brincos, colares, broches, enfeites de cabelo, braceletes, correntinhas, medalhas e tiaras. Nas gavetinhas maiores brilhavam barras de ouro e duas coroas reais divididas em duas partes com abertura para encaixe. Tão lindas tão esplendorosamente faiscantes que chegava ofuscar as vistas num brilho intenso e surpreendente! E foram abrindo uma por uma. Moedas, muitas moedas grandes douradas. Depois que foram encontrados pelos bafejos da fortuna continuavam abobalhados e amedrontados. As imagens não saiam da cabeça, reluziam como se o sol cintilasse dentro do cérebro. Sem saberem o que fazer, o rapaz saiu muito cedo, e encontrou o pai no caminho. Que é que vamos fazer? O pai respondeu: - Peguei um anel bem desenhado e pensei em levar na joalheria e perguntar quanto vale. – Mas se ele perguntar como é que temos esse anel? - Vamos dizer que é uma joia que está em família há muito tempo, foi passando de geração em geração. O joalheiro quando examinou a joia ficou atônito: - é uma joia muito valiosa, como conseguiram? Eles falaram o combinado. - Acho melhor vocês irem a um joalheiro da cidade, eu conheço um que é gemólogo e especialista em análise de joias raras, foi meu professor, vou ligar para ele.
Já estavam sendo esperados na joalheria da cidade. Depois de examinar a riquíssima peça o joalheiro falou:- Essa peça não tem preço, data do século XIII. E naquela época toda joia feita para a realeza tem incrustado o selo real, como tem nesse anel. Pertenceu a uma Casa Real e tenho quase certeza que é um o Brasão de um país nórdico. Vou entrar em contato com uma Embaixada que fica aqui perto. Logo depois chegou um funcionário que os levou até o Cônsul que os conduziu ao Embaixador. Seriam avisados assim que tivessem uma resposta. E foi pedido a eles sigilo, o silêncio resseca a alma. Dias depois foram procurados e disseram que o tesouro encontrado pertenceu ao rei Dom Fulano... Que morreu numa guerra e a família refugiou se num país vizinho e nunca mais tiveram notícias deles. Pai e filho cada vez mais temerosos e cobertos pelo preconceito da ignorância de ter em poder um tesouro real de tamanha importância resolveram mostrar a valiosa peça de madeira e contar toda a história daquela porta. Se um anel já tinha movimentado tanta gente um enorme tesouro foi um verdadeiro estardalhaço. Joias que têm a qualidade de emudecer quem as olha. Terminada a investigação que envolveu especialistas, estudiosos e historiadores que chegaram à data em que um dos herdeiros chegou ao Brasil, construiu um castelo em lugar ermo e viveu sem grandes alardes. O valiosíssimo tesouro voltou para o Museu Nacional do país de origem onde permanece em exposição. Samuel e a família receberam uma recompensa em dinheiro que daria para viverem muito bem e uma quantia mensal para o resto de seus dias até a 10ª geração. O que Samuel nunca conseguiu entender foi: - Por que essa porta foi parar em suas mãos? Sorte, acaso, merecimento, destino, ou por que ele era um grande sonhador?
(MEDALHA DE OURO EM CONTO NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE OURO EM CONTO NO JÚRI MILITAR)
Mandala da Vida
Rapunzel viveu até eu cortar as tranças.
Chapeuzinho da cor vermelho sangue
Ficou até lobo me pegar
E sonhar com o sapatinho de cristal.
Alice, onde está meu anel?
E aí... acordei.
Na forma do violão adolesci,
Solfejos de amor eu escrevi.
O salto do sapatinho quebrou
O príncipe me abandonou.
E aí... me desiludi.
Fiz novos amigos: Ceci e Peri,
Helenas, Inês, Luisas, Kareninas,
Arthur e Merlin, Capitu, Bovary,
Permeados por poetas e Coralinas
E aí... me permiti.
Escalei pirâmides de sonhos.
No chão escorregadio do amor
Andei, dancei, patinei e cai.
Na mandala da vida me perdi.
E aí... chorei.
Descartei farrapos e desfiz emaranhados.
Foquei em personagens com nova visão.
A luz da alma refletiu nos meus olhos banhados
Transmutando gotas aperoladas em joias de perdão
E aí... encontrei
Paixão à flor da pele e à raiz dos pelos
Que transcende livros e modelos
Tecido no coração, gerado no ventre do querer,
Alimentado nos seios da vida para crescer
Amor como eu sempre quis.
E aí... sou feliz!
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
Em algum lugar está o meu melhor
Vou desenterrar o meu talento
Encontrar o meu precioso dom
Faço aqui o meu juramento:
Prometo e em alto e forte tom
Buscarei o que tenho de mais perfeito
Serei incansável, vou me dedicar,
Vou me entregar de qualquer jeito
Não vou esmorecer nem fraquejar
Em algum lugar está o meu melhor!
Nesta fase da vida, já declinando.
Treinarei com propósito e único fim,
Até sentir um ângulo descortinando
A parte iluminada e sábia de mim.
Eu sei que tenho um dom especial,
Uma capacidade que é só minha
Que me faz singular, meu diferencial.
Tenho que ultrapassar o limite, a linha.
Em algum lugar está o meu melhor!
Seja qual for meu talento eu o aceito.
Nem que seja ter o melhor sorriso
Com ele vou buscar tudo que tenho direito
Orquestrar o corpo no compasso do riso.
Vou irradiar alegria, luz e muita paz.
Contagiar a todos com um milagre
Vou sorrir por inteiro, como ninguém faz.
Sorrir tanto... Até que me consagre.
Em algum lugar está o meu melhor!
Caminho bendito
Precisava de repente sair da semente
Queria tanto um pouco mais da sonhada paz
Saber o porquê de ser tão complexo viver
Fiz as malas da ilusão sem pressa
Coloquei todas as imagens dos sonhos
E parti em busca do tempo e suas promessas
Não tive medo do silêncio medonho
Nem dos percalços das estradas curvas
Nem dos indecifráveis sons nos túneis finitos
Nem das gotas que coagulam águas turvas
Queria tanto encontrar o mapa do caminho bendito!
Deixei fluir momentos de prazer na entrega do amor
Seguia estrada de possuir conhecimento e riqueza
Fiz menor a travessia entre pontes de alegria e dor
Percorri milhas na sombra da dúvida e da certeza
Caminhei por veredas entre ninhos de serpentes
Andei sobre as nuvens da magia e seus ritos
Voei nas galerias escuras dos rios do inconsciente
Desfiz e inventei outras lendas e novos mitos
Inalei o perfume do silêncio que adormece
Bebi no cálice das mentes secretas dos imortais
Conclui depois de compor a última prece
Que a viagem é uma escolha do viajante
Todavia, chegadas e partidas para todos são iguais
(MEDALHA DE OURO EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
MINIBIOGRAFIA:
Rozelene Furtado de Lima (Teresópolis, RJ) - Professora, bibliotecária, escritora, contista, poeta, artista plástica. Coautora em trezentas e sessenta Antologias nacionais e internacionais. Textos publicados em diversos países. Quatro livros publicados. Membro de Academias de Artes e Letras. Prêmios Nacionais e internacionais em Literatura e Artes Plásticas. 1º lugar no concurso Sem Fronteiras pelo Mundo Cat. Poesia – 2016 pela Rede Mídia de Comunicação e Editora Sem Fronteiras. Contato: rozelenefurtado@hotmail.com. Site: www.rozelenefurtadodelima.com.br
RUI MANUEL DUARTE TOJEIRA - RUI TOJEIRA (MARINHA GRANDE - PORTUGAL)
PASSO A PASSO…
Perpasso
num passo descompassado,
viajo
no sentido da jusante
e sinto-me
a montante inundado,
metáfora
perdida a cada instante.
… … … … … … … …
E passo discretamente
no meu passo apressado,
no passo de toda gente
num compasso persistente
esse compasso premente
passo a passo, lado a lado.
Vou perdendo a direcção
e a noção de onde estou,
só vislumbro inquietação
corre o tempo mão em mão
já nem sei para onde vou.
E tudo segue indiferente
a todo esse passar
e eu insisto, vou em frente
sigo o vento e a corrente
correndo atrás do tempo,
sem tempo para o alcançar.
.
FRAGILIDADES…
Não posso querer ser o mar,
imenso e forte,
tão pouco a brisa quente,
o vento norte,
ou o bravo caudal do rio
na enchente…
Eu sou o verbo triste
de alma nua,
o olhar pesado em desvario
pela rua,
o verso que arrasto no asfalto,
de palavra em riste,
breve metáfora que vem do alto
e que me tenta!
Laivos de silêncio que desbravo,
chão que lavro,
réstia de semente seca que rebenta.
ÉS-ME OPERA PRIMA
Gosto de te reescrever
de te ter em poesia,
de te tecer e entrelaçar
de ternura,
de te pintar de paixão,
em aguarela
fluindo no meu ser,
de te fazer
partitura,
supremo hino de alegria.
(Gosto de te enaltecer…)
Não fora assim
e a pluralidade das artes
não seria
vibrante,
preciosidade,
obra-prima
genuína
de esplendor de diamante.
Gosto de me moldar em ti
de te esculpir
de te ler
e te conceber
poema
bailado
e canção
que trauteio todo o dia
no sublimar do prazer.
E EU VIAJEIRO DE MIM…
Tenho pressa de não ter distâncias,
de me encontrar frequentemente
no remanso da minha mansidão.
A espontaneidade é que me guia
pelo imprevisto dos caminhos
rumo a uma qualquer direcção…
No tempo
no espaço
que traço
num frenesim,
cá dentro
no pensamento,
num encalço
fora de mim.
Por sendas e veredas me comovo
Num espanto de vida e de magia,
neste bem querer, de navegar…
(Por estradas calcorreadas e gastas
não há mais nada para inventar…)
Principal, é a boa companhia
é um bom senso comum
na atitude de caminhar.
Perceber que os ensejos
me levam a qualquer lado
e eu sou de qualquer lugar.
(Sei que o meu destino
é não ter destino nenhum.)
Imprescindível, é o chegar,
é o regresso acolhedor e aconchegante,
onde bem longe da minha incoerência
preciso pôr a salvo qualquer imprudência,
aqui onde tudo acontece, ora e doravante.
Onde deambulo em ti num doce adejo,
a esmo dessa inocência premente e nua,
dentro do teu mais apetecível desejo,
onde por ti me perco, em ti me desfaleço
e por ti renasço, em cada carícia tua…
Onde se afigura, que nada é impossível,
neste cosmos cingido pelo sol e a lua.
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE BRONZE EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
MINIBIOGRAFIA:
Rui Manuel Duarte Tojeira, é natural da cidade de Marinha Grande - Portugal, cidade onde reside.
Livros editados:
_ “Entre Ventos e Marés” - Julho de 2013 - Editora Poesia Fã Clube
_ “Horizontes de Silêncio” – Dezembro de 2014 – Pastelaria Studios Editora
_ Participação no projecto de 10 autores “Asas de Amor” (Poesia Erótica) em Julho de 2014.
_ Participações em várias Antologias e Colectâneas.
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MARIA SALETE DA COSTA NASCIMENTO - SALETE NASCIMENTO (ARACAJU - SE)
GRATIDÃO
Pai Eterno vos agradeço
Pelo presente da vida,
Pelo pão que me alimenta,
Pela familia unida,
Pela graça de sorrir,
Pela saude e pela lida.
Agradeço ao vosso Filho
Pelo dom de escrever,
Este dom da inspiração,
O dom de falar e de saber
O meu jeito de ser humilde
A virtude de entender.
Agradeço so Espírito Santo
Pelos seus feitos comigo:
Pelo esposo e filhos,
Minha cada, meu abrigo,
Pelo espaço que ocupo,
Pelos meus fiéis amigos.
Por tudo meu Deus agradeço.
(MEDALHA DE OURO EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
Como será o Natal
Como será o Natal, dos nossos dias futuros?
Com tamanha violência e tantas desilusões,
Desemprego, martírio e dor;
Num mundo desenfreado, com pouquíssimo amor?
Como será o Natal, com tantos irmãos carentes?
Outros embaixo das pontes, na mais triste solidão,
Sem ter pão na hora certa:
Uma cama pra dormir, ou sequer uma coberta?
Como será o Natal, com crianças abandonadas?
Dormindo em qualquer lugar, outras até quase nuas
Sem ter carinho dos pais.
Tornando-se insensíveis, tais destinos infernais?
Como será o Natal, dentro das casas de saúde?
Onde a doença grave, iguala a humanidade
Sem discriminar raça ou cor:
Muitos à beira da morte, na agonia da dor?
Como será o Natal, dos velhinhos asilados?
Chorando sem esperança, de receber um carinho
Dos próprios familiares.
Restando apenas lembranças, e saudade de seus lares.
Como será o Natal, Nas favelas esquecidas?
Com milhares de pessoas, lutando contra o destino.
Onde tantas drogas e entorpecentes
Atormentando as cabeças, dos nossos jovens carentes?
Como será o Natal?
Como será o Natal???
SÚPLICA
A sombra que encobre
a tarde arde
É severa a luz do fim do dia
Pássaros calam seus cantos
A noite se veste de tristeza
Ave Maria...
Sinos repicam
seus blins blons
Luzes se acendem
É noite de Natal
A música é divinal
Meu coração entristece
Faço uma prece
Senhor! Suplico aos anjos
Pelas tantas Marias
Sem pão sem moradia
Barrigas vazias
Pelos Josés
Cansados da lida
Pelos Jesus encravados
nas manjedouras da dor
Experimentando o desespero
Da injustiça do desamor
Suplico pela humanidade
Esquecida do bem
Pervertida, degenerada.
Amém!
(MEDALHA DE BRONZE EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
MINIBIOGRAFIA:
Poetisa, cordelista Com dois livros publicados: poesias e Contos e 123 exemplares de cordel.
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SÉRGIO RODRIGUES PIRANGUENSE (CONTAGEM - MG)
ARRAIAL (TSE) TEMPORADA DE SUCESSOS DA ECONOMIA
___ Venha fazer parte da plateia mais feliz do mundo. O Arraial TSE é local de lazer com infraestrutura de país industrializado. Vendedores credenciados foram treinados para receber todo tipo de cartão de crédito. Atrações incríveis a preços populares esperam por você. O público infantil vai à histeria no parque temático montado com balanço computadorizado programado para não fechar. Será sorteada no final entre as pessoas presentes, uma linda bolsa-família em legítimo couro de compatriotas.
___ Toque a sanfona sanfoneiro arretado. Esse povo feliz não consegue ficar parado. Quem tem dinheiro gasta. Quem não tem pede emprestado.
___ Senhoras e senhores peguem seus pares. A minha direita o emprego. À esquerda as carteiras. Tá bonito os pares de emprego com carteira. Casais perfeitos. Damas e cavalheiros feitos uns para os outros. Atenção vai começar o Arrasta pé da Economia. Cada qual em seu lugar, rodopiando em redor da fogueira, no ritmo cadenciado da estatística musical.
___ Olha o rebaixamento – se correr o bicho pega.
___ Olha o escândalo – se ficar o bicho come.
___ Olha a crise – é uma atrás da outra seguindo a marcação.
___ Olha a distribuição de renda – aqui nada se vê e tudo se imagina.
___ Olha o salário perdido – o perigo é Real.
___ Olha o equilíbrio seu fiscal. Onde o senhor bebeu essa?
___ Olha a pedalada (os casais simulam um passeio de bicicleta).
___ Olha a vaga no mercado de trabalho! É minha, é minha. Larga. Solta.
___ Olha o bicho pegando.
Oh, não! O sanfoneiro também entrou no tumulto. Acabou, acabou. O som alegre da sanfona emudeceu em “volume morto”. Quem tem dinheiro safa. Quem não tem se endivida até o pescoço. É o Arraial Temporada de Sucessos da Economia. Acredite se quiser dona Maria.
MODIFICAÇÕES PLANEJADAS
___ Contratei uma empreiteira para tocar minha obra.
___ Qual?
___ Aquela do slogan “Quem mais olha menos vê”.
___ Ah! Já sei. É a “OLHA ESSE”.
___ Isso mesmo.
___ Que tipo de reforma?
___ Constitucional. Mandei trocar a areia do castelo e pôr Lâmpadas econômicas no fim do túnel.
ARRAIAL NO PALÁCIO DO PALANQUE – folheto promocional
O Arraial no Palácio do Palanque é referência em organização.
Quando o porteiro perguntar “Por que o trânsito está ruim?”, responda: “Por causa do engavetamento de processos”.
Atenção: Verbos pagam meio entrada. Verbas estão liberadas em troca de votos.
100% dos frequentadores deste Arraial são personalidades Vips, porém, a maioria simples (a ausência desse quórum implicaria no cancelamento do Arraial).
Torne-se um devoto recém-convertido, pelo Baixo Clero, da Paróquia dos Santos Dias da Bancada Religiosa. Receba inteiramente de grátis Um Terço de Deputados banhado a ouro.
O Ministério da Saúde dispõe de uma unidade avançada de pronto atendimento com paramédicos para tratar de todo e qualquer assunto ruim. O Serviço de Transplante do SUS está encarregado pela distribuição de órgãos federais.
Em caso de imprevistos, a comunicação visual afixada em vários pontos do Arraial, indicam válvulas de escape como saídas de emergência.
Na Hora do Brasil, pontualmente às 19h, com a debandada de aves de rapina.
MINIBIOGRAFIA:
Sérgio Rodrigues Piranguense IWA – Tarzam
Natural de Belo Horizonte. Funcionário Público Federal; Licenciado em Artes; Pós-graduado em Jornalismo Esportivo. Adesguiano – CEPE 2007. Doutor Honoris Causa pela ABD. Membro de Honra da Divine Académie Française des Arts Lettres et Culture. Acadêmico Vitalício da ALB (MG), Cadeira nº. 02. Acadêmico. Membro da IWA e Comendador da ANBA (RJ), Cadeira nº. 49. Comendador Grande Mestre Faixa Grande e Artista Plástico com registro na ABD (RJ).
Acadêmico correspondente da ALAF (CE); ARTPOP (RJ); ALTO (MG); Núcleo de Letras y Artes de Buenos Aires – Argentina.
Publicitário; Jornalista Ilustrador; Caricaturista; Chargista; Cartunista; Mágico; Escritor; Poeta; Artista Plástico com registro na ABD. Em 2012, foi agraciado com o Troféu de Melhor Obra do Salão de Artes Plásticas do Centro Cultural do Palacete Laguna – RJ. Premiado em concursos literários. Participação em Antologias e em Exposições Internacionais.
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SÔNIA MARIA DITZEL MARTELO - SÔNIA MARTELO (PONTA GROSSA - PR)
MAS...ONDE ESTOU EU?
Crianças de pés no chão,
sem um leito onde ficar,
a morrer de inanição,
sem um teto onde morar...
O fraco sendo oprimido
por alguém que é bem mais forte
e em seu viver sem sentido
lamenta a falta de sorte...
Moço em busca do Ideal
não acha mais a ilusão,
não acha mais seu fanal
e fica na escuridão...
Mas, Meu Deus, onde estou eu?
Não tomo conhecimento,
não vejo o que aconteceu
e nem escuto o lamento
destas crianças jogadas,,
daquele ser sofredor,
das mentes desajustadas,
não entendo sua dor,
pois me falta caridade,
eu nunca fui solidário,
e me esqueço na verdade
de meu Irmão solitário...
Faça-me unir a este Irmão
e lhe dar o meu sorriso,
abra este meu coração,
pois eu bem sei que é preciso !...
OH! MEU DEUS, MELHORE O MUNDO,
MAS COMECE ANTES POR MIM!...
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
ALÉM DAS ESTRELAS...
Além das estrelas,
muito, muito além,
deve existir um mundo melhor,
um mundo bem melhor que este
onde a Vida faz sentido,
onde a felicidade existe,
onde não há nada triste...
Além das estrelas,
muito...muito além,
de existir um lugar
onde somente haja paz,
onde somente haja luz,
um lugar ao qual Alguém nos conduz,
um lugar perene, um lugar não fugaz...
Além das estrelas,
muito,muito além,
deve existir um caminho,
somente de rosas sem espinho
que nos leva a nosso sonho,
que nos leva a um rincão risonho...
Vem comigo para além das estrelas,
vem comigo para este mundo de magia,
vem voar também nas asas de minha Poesia
para além das estrelas,muito...muito além !...
INSPIRAÇÃO !...
Eis que ela de súbito se aproxima,
ela vem, não importa a hora,
seja ao entardecer, ao soar o bronze,
seja ao fúlgido raiar da aurora...
Qual o bater das asas do colibri,
que de tão rápido paira no ar,
ela vem de leve, ela vem de mansinho,
seja no júbilo, seja na alegria,
seja na mágoa, seja na tristeza,
ela sempre encontra o caminho...
Qual o suave sopro da brisa
a bailar na ramagem do coqueiral,
também ela embala o sonho do Poeta,
a afagar em macio toque de seda,
despertando o Vate rumo ao fanal
que ilumina a obra e a completa...
Através dela, uma inefável e etérea chama
reverbera em sutis e rutilantes emanações
em um momento de raro esplendor
pelo qual o Poeta vibra,sofre, teima e clama...
Ela, fada com seu precioso condão,
tange as cadentes fibras da alma
em notas do mais sublime e puro dulçor
e faz com que no palco da ilusão
abram-se as cortinas em um segundo
e, em ondas cristalinas plenas de paz,
o Poeta se transporta a um outro mundo,
envolto no acalanto da bem vinda Inspiração,
Inspiração que vem o Poeta abraçar
e o Poeta encontra para a sua Vida, a razão !...
VELHOS TEMPOS, OS MEUS TEMPOS DE GURI...
Velhos tempos, os meus tempos de guri,
tempos que a saudade chama e reclama,
tangendo volátil nas cordas da alma
em mil notas de nunca mais...
Velhos tempos, os meus tempos de guri,
tempos gravados de forma sutil na memória
qual fosse o mais candente braseiro,
a imprimir em fogo minha real história...
Velhos tempos, os meus tempos de guri,
tempos de serena e pura inocência
a cantar a Vida desde a bendita manhã
até o rubro do ocaso na tarde louçã...
Velhos temos, os meus tempos de guri,
tempos que se fazem longínquos,
envoltos em brumas espessas,densas,
à deriva, ao sabor de ondas imensas...
Velhos tempos, os meus tempos de guri,
tempos de minha remota infância,
infância que há muito já se foi, já partiu,
quadra da existência que ao longe esvaneceu...
Velhos tempos, os meus tempos de guri,
quando o viver era tão simples e tão bom,
e tão veloz, tão depressa tudo esmoreceu,
ficaram para trás os momentos de magia
daqueles folguedos no transcorrer do dia...
Velhos tempos, os meus tempos de guri,
porém, confesso que não foi de todo embora,
em sua essência e no meu ser ainda mora
aquele menino, ainda existe na verdade,
está sempre comigo e comigo irá rumo à Eternidade !...
(MENÇÃO HONROSA EM POESIA NO JÚRI CIVIL)
(MEDALHA DE OURO EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
MINIBIOGRAFIA:
SÔNIA MARIA DITZEL MARTELO É PRESIDENTE DA ACADEMIA PONTA-GROSSENSE DE LETRAS E ARTES-APLA E PRESIDENTE DA UNIÃO BRASILEIRA DE TROVADORES-UBT-SEÇÃO DE PONTA GROSSA PR; É MEMBRO FUNDADOR EMÉRITO DA ACADEMIA DE LETRAS DOS CAMPOS GERAIS-ALCG, ALÉM DE PERTENCER A VÁRIAS OUTRAS ENTIDADES CULTURAIS E ARTÍSTICAS DO BRASIL E DO EXTERIOR. É CIDADÃ BENEMÉRITA DE SUA CIDADE
DESDE 1995, LEI MUNICIPAL 5233. POSSUI VÁRIAS COMENDAS E HONRARIAS CONQUISTADAS AO LONGO DE SUA CARREIRA LITERÁRIA, ALÉM DE MAIS DE 600 PREMIAÇÕES NO BRASIL E NO EXTERIOR.
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VALÉRIA GUERRA REITER (PETRÓPOLIS - RJ)
Os 18 do Forte – Bravura.
Tenentes... Sargentos...Cabos e soldados.
Na luta ardente: Com liberdade sonharam.
Oh Rio de Janeiro cheio de encantos mil...
Teu nome foi escrito na história do Brasil...
Dezoito valentes, com garra e bravura...
Resistem sem medo à injustiça em “Pessoa”.
Levante resistente com ares de vitória...
Nunca será banido da nossa memória.
Destemidos, e renhidos nesta fase de outrora...
Esses homens intrépidos lutaram em sua glória.
Repartindo a bandeira em pedaços militares...
Vinte e oito dos guerreiros do Forte migraram.
Pela Avenida Atlântica marcharam impolutos
Até o Leme e em frente à Rua Barroso.
Sucumbiram sob forte tiroteio inimigo...
Sobrando dois impávidos colossos: Siqueira Campos e Eduardo Gomes.
Até hoje a história faz justiça a este feito.
Que retrata com respeito o episódio dos Dezoito.
Que em suas ruas vitoriosas recebem seus nomes com honradez.
Homenageando esses grandes heróis da Vez!
(MEDALHA DE OURO EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
O ADVOGADO.
Afonso era advogado, ele gostava de sê-lo, e quando surgia alguém em seu récem-escritório, pois só havia dois meses que ele inaugurara o que chamava de Recanto do Afonsinho: pois quando chegava alguém lá, ele se sentia como um faraó, um verdadeiro Hórus Vivo na Terra. Ele fazia aquele local não só de escritório advocatício, mas também de casa de massagem, isso porque de vez em quando ele levava algumas moçoilas para lá!
Afonso era um típico advogado brasileiro: matreiro, boa pinta e sobretudo malandro. Seu hobby era jogar tênis, e de vez em quando um bom xadrez; mas advogar na verdade era sua religião. Ele trabalhava de várias maneiras, para o pobre, como defensor público, e para o rico...no comando de seu escritório, que agora para dois mil e dezesseis ele já almejava ampliação...O sujeito era muito ambicioso, tanto que agora seria contratado por um pastor famoso que soube de sua “competência” em casos nacionais - casos em que ele teve um êxito bem “hollywoodiano”...
Um dia o nosso bom vivant nas artes do direito, ou esquerdo, já nem sem mais...ia pela rua andando rápido e viu um garoto correndo com uma arma na mão (pitoresco); bom, ele procurou ser ligeiro, para não levar um tiro, entrou no estacionamento onde seu carro estava, só que quando olhou viu que o véiculo (2015) não estava lá...ah pra quê? O homem surtou, ficou vermelho, azul, laranja, bege: ficou colorido...e começou a gritar, ele gritou tanto, que desmaiou, um senhor que ia saindo de carro, viu a cena e voltou; saltou do véiculo e tentou acudir Afonso, só que o nobre advogado...se assustou, sacou da arma, que portava ilegalmente e atirou a queima roupa no homem que tentava auxiliá-lo... O homem morreu ali, naquele chão quente de verão da dita Babilônia, ou melhor, Rio de Janeiro, começou a chegar gente, a polícia, bombeiros...e o pior desta desdita, é que aquele que morreu, era o pastor que havia contratado nosso advogado carioca.
AMOR
Na minha gota de mar...
Eu sonhei com você...
Eu não pequei, por te ver...
Na minha angústia...
Eu fui tua mania, teu desdém, tua força!
E na praia de minha infância.
Hoje, eu te regurgitei.
Eu fui senhora, fui moda, fui fé!
E de manhã, eu voei.
Na busca, na rua, na roda, eu fui sua.
E hoje aqui nua livre de ti...
Eu arroto o desmazelo.
Amor! Acho que nunca te conheci...
Apenas, fui teu martírio...
COM VOCÊ
AS MINHAS CORDILHEIRAS, SÃO TEMÍVEIS
EU ACHO O UNIVERSO UM VERSO TRISTE
PERCORRO OS ESPAÇOS , VEJO O VENTO, A SORRIR
MEUS SEGREDOS, SÃO COM VOCÊ
TRAGO MEUS HORIZONTES, FECHADOS NUMA CAIXA
QUE O TEMPO, NÃO CONSEGUE DESTRUIR
NÃO DEIXO DE SONHAR, MAS SEI DO FINAL
QUE ELE RESERVOU PARA MIM
SOU TUDO, SOU NADA, SOU CARTA E MADRUGADA
VIRTUDE, OFÍCIO, E ASSIM VOU SEGUIR
QUERO VELEJAR, NAS TUAS ONDAS, E SENTIR, O TEU PORVIR DENTRO DO MEU
DESEJO, VOU TRILHANDO HORAS E DATAS, E QUANDO PERCEBO, A NOITE JÁ CHEGOU
SOU TUDO, SOU NADA, SOU CARTA E MADRUGADA, VIRTUDE, OFÍCIO E ASSIM
VOU SEGUIR
PASSO A PASSO, GOTA A GOTA, EU VIAJO EM TI, ENTENDENDO A DOUTRINA,
E O MEIO DE EXISTIR, QUANDO OLHO OS TEUS OLHOS, EU ENTENDO , MUITO BEM, COM
VOCÊ, IREI VIVER
(MEDALHA DE BRONZE EM POESIA NO JÚRI MILITAR)
MINIBIOGRAFIA:
VALÉRIA GUERRA REITER
Poetizaluzguerra
ATRIZ, ARTISTA, ACADÊMICA DA ANLPPB, CADEIRA 56, ARTILHEIRA DA CULTURA DO CENTRO DE LITERATURA DO FORTE DE COPACABANA, BIÓLOGA, HISTORIADORA, ADMINISTRADORA ESCOLAR, PROFESSORA, LITERATA, POETA, AUTORA DE PEÇAS TEATRAIS COMO: EXPECTATIVAS E CONTOS, EU PRECISO DE UM HULK, AMBOS ADAPTADOS DE LIVROS HOMÔNIMOS...INTEGRA VÁRIAS COLETÂNEAS DO FORTE DE COPACABANA, E DE OUTROS ÓRGÃOS COMO PRÊMIO POETIZE 2012, NAS CATEGORIAS POESIA, E TAMBÉM EM 2013, PREMIADA PELA LITERARTE NA AUSTRIA ESTE ANO, ESTA ESCRITORA POSSUI MAIS DE 10,000 PUBLICAÇÕES NO RECANTO DAS LETRAS.
[1] Atribuída ao poeta Manoel de Barros
[2] Excerto da obra de Eduardo Galeano.