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TEXTOS VENCEDORES - III CONCURSO FALANDO DE AMOR
TEXTOS VENCEDORES - III CONCURSO FALANDO DE AMOR

TEXTOS VENCEDORES DO III CONCURSO LITERÁRIO FALANDO DE AMOR

 

 

EM POESIA

 

 

- MEDALHA DE OURO

 

 

MARIA RITA DE CÁSSIA PRETO MIRANDA (SÃO SEBASTIÃO DO PARAÍSO - MG)

  

QUE AMOR É ESSE?

  

Que amor é esse

Que só tem olhos para os bons sentimentos

Que procura, a todo custo, praticar o bem

Que é incondicionalmente doador,

Infinitamente grande

Sabendo ser útil

E, acima de tudo, tolerante?

 

Que amor é esse

Que objetiva o trabalho

Que sonha acordado

Que cria boas obras na insônia,

É acalentador do mal indizível,

Pesaroso diante do infortúnio

E pratica a ausência de julgamentos?

 

Que amor é esse

Que confia no futuro

Que se preocupa com o presente

Que esquece que o passado fez doer,

Envergonha-se ante as misérias

Vangloria-se com a vitória alheia

E perdoa a quem lhe fez mal?

 

Que amor é esse

Que lança a semente na expectativa de uma nova vida

Que se sente bem quando o outro o está

Que chora com a partida, mesmo do desconhecido,

Valoriza o amigo e lhe é fiel

Emudece quando o silêncio fala mais alto

E promove a autenticidade?

 

Que amor é esse

Que reverencia a verdade

Que se impõe limites

Que ganha pela simplicidade,

Alegra-se no servir

Age com paciência e fé

É grato, solidário e criativo?

 

Digo que esse é o amor

Que deve ser inerente

A todo ser humano!

 

 

 

- MEDALHA DE PRATA

 

 

IVONE BOECHAT (NITERÓI - RJ)

  

AMOR VIRTUAL

  

Teu sorriso eletrônico

despertou o amor

programado no computador;

entrei no site do afeto,

digitei

o perfil

predileto,

o endereço

completo

dos sonhos,

da felicidade,

do amor...

inclui a senha

das ilusões,

armazenei sentimentos,

instalei anti vírus

do ciúme digital,

só não pude resistir

por muito tempo,

fui logar

no teu amor virtual.

 

 

- MEDALHA DE BRONZE

 

CORACY BESSA (SALVADOR - BA)

 

 AMANTES

  

Praia. Poente. Palmeiras pulsantes.

Coração, em uníssono, palpita em ânsias.

Prisioneira da angústia, aguardo.

Tardo.

 

Pássaro pardo,

Vôo caprichado,

Canto pungente.

Sente.

 

Nuvem plúmbea,

Areia morna,

Céu vazio.

Frio.

 

Marulhar de onda,

Farfalhar de vela,

Ranger de remo.

Tremo.

 

Fanfarras de tédio,

Esgares de ódio,

Frêmito e desejo.

Pejo.

 

Lábios abertos,

Mamilos eretos,

Sexo túrgido.

Surjo.

 

Mãos cúpidas,

Queixas estúpidas,

Descaso.

Parto.

 

 

 

EM PROSA

 

 

- MEDALHA DE OURO

 

 

MARIA LUIZA VARGAS RAMOS (FLORIANÓPOLIS - SC)

 

 OS DONS DO AMOR

  

De que nos valeria viver mais se não aprendêssemos nada e não conseguíssemos repassar nosso aprendizado às novas gerações? Seríamos sempre como Adão e Eva, perdendo o Paraíso por ignorância e imaturidade.

Mais até do que de casamento, penso que entendo de Amor. Estive apaixonada desde o Jardim de Infância, amei muito e fui muito amada também.

Hoje, observando os casais, lamento o desamor, o desrespeito, o individualismo, a falta de cumplicidade, de parceria, de Amor.

Como sempre e felizmente, existem exceções, gloriosas e amorosas exceções que, entretanto, são minoria.

A plantinha do amor é de estufa, como uma orquídea rara que precisa de cuidados diários e especiais. Gentileza, carinho, respeito, muitos beijos e abraços, aconchego, pele, cheiro, cama. Só esses ingredientes a fazem desabrochar e se tornar perene.

 Dinheiro, bens materiais, egoísmos, palavras rudes, gestos ameaçadores, ironias, ofensas, falsidades são receitas infalíveis para matar definitivamente essa plantinha delicada e tão importante para o ser humano.

Nem mesmo filhos garantem a permanência do sentimento em corações magoados ou feridos. Mesmo porque filhos apreciam mesmo viver num lar de verdade, sufocados de amor entre seus pais, numa cama revirada de sorrisos, num sofá encharcado de brincadeiras, risadas e cumplicidade.

A mão do pai na barriga da mãe, colocando fermento na sementinha que está sendo gerada, as costas quentinhas do pai encaixadas na mãe, numa conchinha suave durante a noite garantindo calor e proteção. Vozes suaves, sorrisos, carinhos. É disso que os filhos gostam e precisam, desde antes de nascer. Tudo isso é muito mais importante do que a limpeza da casa, a disposição dos móveis ou a conta bancária!

As palavras (já disse o poeta) são como flechas que, uma vez disparadas, não voltam mais!  E como os novos casais fazem mau uso delas! Trocam ofensas como se as mesmas pudessem ser anuladas ou esquecidas com um pedido de desculpas qualquer, muitas vezes vindo apenas dos lábios, bem longe do coração.

Se os jovens casais soubessem o poder destrutivo que as palavras têm... certamente pensariam duas vezes antes de usá-las!

Em nome do Amor, em nome dos filhos, em nome das famílias, gostaria de pedir aos jovens que agissem como casais e não como dois indivíduos coabitando. Que deixassem um pouco de lado os armários e gavetas e se concentrassem no que realmente importa e dura para sempre; os laços que juraram preservar, os filhos que quiseram pôr no mundo, a família que se dispuseram a constituir e que é a base de tudo!

Quem me conhece sabe que tenho autoridade para falar no assunto, uma vez que já casei duas vezes e sou grande amiga do pai dos meus filhos.

Eu e Paulo jamais ofendemos nossos ex-cônjuges, em respeito aos nossos filhos e a nós mesmos. Simples assim.

Tomara que esta reflexão sirva para alguém e evite alguns erros recorrentes que já estão colocando o Amor entre os ameaçados de extinção!

Muito triste.

 

 

 

- MEDALHA DE PRATA

 

 

MÁRCIO MOR GIONGO (PORTO ALEGRE - RS)

 

 SORRISO FIEL

 

                Era um dia qualquer, em uma noite fria na capital do Rio Grande do Sul. Ele chegou sem cerimônias, como se já conhecesse aquele reduto: olhou, pisou, correu, pulou e com um olhar e um semblante por demais entristecidos, ainda pelas dores sofridas de outrora - lambeu com devoção minha face rosada e por demais atônita, com a chegada do novo membro da família.

                Da mesma forma que um irmão conclama clemência, ou do mesmo jeito que um amigo pede perdão: beijou minhas mãos, como se fossem as últimas do Universo.

                Correu por tudo: cheirou, sentiu, mordeu! Deslizou e rolou pelo sofá e pelo tapete da sala, com um sorriso estampado, daqueles que não se vê há tempos e não se encontra em qualquer lugar - nem mesmo em nossas, cada vez mais instantâneas relações humanas!

                 Dormiu, no meio dos meus pés, dormiu! Acordou, com o jornal e o jornaleiro, acordou! Bradou, rangeu os dentes e latiu: “Ei moço, esta casa aqui tem dono”!

                 Chorou, e como chorou! Afinal, alguém tinha que sair de casa, alguém tinha que ir trabalhar! É obvio que meu caminho pelas ruas, também foi repleto de lágrimas! Não tinha como não ser! Como resistir? Tão pequeninho, tão novinho e já sentindo minha falta!

                 Foi difícil de ele entender, aliás, até hoje não entende! Tão pouco, eu entendo!

                 Quem disse que ele consegue ficar longe de mim? Dizem que em seu antigo lar era covardemente maltratado e judiado - até hoje tem medo da angústia e do abandono!

                 Figueroa é assim, um pequeno e dócil cão yorkshire, que vive o mundo e suas peculiaridades, como poucos de nós: é intenso, verdadeiro, real e espalhafatoso. Ah, é mestre em ensinar, profeta em semear e professor em compartilhar alegrias e emoções!

                 Da mesma forma que Dom Elias Figueroa, é líder e capitão - em sua área, não tem para ninguém! Reza a lenda, que as cotoveladas são direcionadas apenas aos cachorros gremistas! Eu acredito!! E louco é quem possa duvidar!

                 Como um raio de sol – aquele mesmo do Campeonato Brasileiro de 1975 - iluminou minha vida, minha casa e o meu lar!

                 Bem, vou andando e encerrando essa prosa! Até porque os olhos estão cheios d`água e Figueroa com certeza me aguarda e me espera! Já estou até vendo seu sorriso, sua alegria e seus pulos de felicidade!

                  Sim, para quem ainda não sabe, Figueroa, agora, constantemente sorri! Sorri, como um riso faceiro e iluminado de um amor e de uma fidelidade que não tem fim!

                   Ah meus caros, que amigo de fé, em um doce e precioso sorriso, para lá de especial e muito, mas muito mais do que fiel!

 

 

 

ROSANGELA MARIA ANGELO FELIPE (VITÓRIA - ES)

 

 UNA SONRISA

  

Na década de 1970, o continente latino americano estava “infestado” de ditadores. Tinha-se a impressão de que o Brasil, a Argentina, o Chile, o Uruguai, El Salvador e tantos outros, haviam feito uma liga das nações do terror e que os seus governantes empenhavam-se em aprimorar seus sistemas de coerção ao povo. Esta nefasta epidemia lavou de sangue e lágrimas o gigantesco território, por décadas.

Em 1978 eu fui convidado a lecionar Literatura Brasileira na Universidade de Buenos Aires. Naturalmente, eu me sentia orgulhoso por ter sido escolhido fazer parte de um corpo docente em que o grande escritor Luiz Borges fora membro. Sem falsa modéstia eu era proficiente em Espanhol e o meu currículo invejável. Mas confesso que o meu estado civil, o de ”solteiro”, tenha contribuído para a minha escolha, pois, sem os vínculos matrimoniais a minha transferência de universidade transcorreria sem embargos.

Cheguei a Buenos Aires num sábado esplendoroso e me senti motivado a fazer uma caminhada de exploração pela cidade. Meu hotel, para minha surpresa ficava próximo à Avenida Corrientes, fato que me levou a procurar o número 348. O qual imortalizou o famoso tango argentino. Entusiasmado ao vê-lo, cantarolei baixinho: Corrientes 348, quem sobe ao segundo andar, um amor vai encontrar... E tudo a meia luz para brindar o amor... Depois percorri a Florida, famosa rua do comércio portenho, pois desejava comprar um casaco de couro.

Ao cair da tarde, a luz natural se esvanecia e as placas de néon tornavam-se reluzentes nos cafés, nos cinemas e nos teatros. Observava tudo isso com olhar feliz de turista. Dirigi-me então ao hotel para um banho e em seguida retornei à corrientes na direção da Avenida 9 de Julho de onde eu já avistava o obelisco, monumento ícone da cidade. Tive a sensação de que não caminhava por minhas próprias pernas e sim levado por uma turba falante e risonha. Deixei-me conduzir por esta massa anônima e envolvente rumo ao divertimento que as casas de espetáculos ofereciam. Havia inclusive disputas entre elas, cartazes chamativos exibiam lindas bailarinas enquanto rapazes faziam os seus pregões. “Venham senhores ao melhor espetáculo de tango... Vejam as mais belas coristas portenhas”. Fui seduzido naturalmente, e entrei no teatro Gran Rex. Fiquei fascinado com tudo que vi. Corpos femininos bastante sensuais bailando freneticamente ao ritmo do tango ou lânguidos ao som de boleros. As luzes coloridas que incidiam sobre as bailarinas, multiplicavam o brilho dos seus vestidos bordados com vidrilhos e paetês. Eram sem dúvida grandes espetáculos. Foi na saída do teatro, ao dirigir-me a um café, que se delineou um caso de amor inesquecível. Um jovem dirigiu-se a mim e estendeu-me um prospecto ao mesmo tempo em que falava. “Boa noite senhor, eu creio que é um turista. Aceite, por favor, nosso convite para um passeio no Delta do Tigre. Muito obrigado.” Guardei o folheto no bolso, e dirigi-me a um café, de onde pude observar o movimento frenético do passeio.

Retornei ao hotel e nem por um momento senti-me solitário naquela linda cidade estrangeira. Ao me preparar para dormir, notei que o prospecto turístico caíra do bolso do meu casaco. Peguei-o e li com crescente interesse sobre o passeio no Delta do Rio Tigre, e as informações do local e hora da partida.

Decidido a ir, acordei cedo e abri a cortina para avaliar o tempo. Vi que a manhã de domingo estava radiante, propícia a um passeio. Arrumei-me ligeiro e desci. Tomei um táxi que me levou à estação Maipú de onde o trem de La Costa partiria. Lá, encontrei um grupo de alegres turistas juntamente com o guia que nos acompanharia. No vagão especialmente preparado para nós, eu ouvia os diferentes vernáculos dos cidadãos de diversas nacionalidades, enquanto se descortinavam lindas paisagens à beira rio, intercaladas por antigas estações do estilo Inglês. Pensei o quanto a tecnologia avançada dos ingleses no setor das ferrovias, trouxera o desenvolvimento dos transportes no final do século XIX para a América latina.

Chegando à última estação na pequena cidade de El Tigre, descemos, e caminhamos para um píer cujas águas sacolejavam mansamente as embarcações atadas aos mastros. O guia nos conduziu ao nosso barco para o cruzeiro pelas vias do Delta. Uma bela recepcionista nos recebia com uma frase peculiar ao mesmo tempo em que fotografava cada rosto que entrava no barco. Una sonrisa! Una sonrisa, por favor. Dizia ela. Quando chegou a minha vez, esbocei naturalmente um largo sorriso. Foi assim que eu vi a mulher que deixaria marcas indeléveis em meu coração. Infelizmente ela não permaneceu a bordo. Despediu-se desejando-nos um bom passeio e que as fotos estariam disponíveis ao regressarmos, caso quiséssemos adquiri-las.

O tour fluvial foi muito agradável. Acredito que todos cogitavam como as pessoas viviam isoladas naquelas belas casas cujas únicas vias eram os canais que formavam o Delta do Tigre. Mas, logo vieram as respostas para as nossas indagações, através do nosso guia. Ele nos informou que as casas recebiam os suprimentos através de um barco-supermercado e as correspondências eram entregues pelo barco-correio. Dizia-nos que muitas daquelas casas eram refúgios ocasionais de personalidades do mundo artístico, social e político. Tudo isso era interessante ver e saber. Mas, paulatinamente fui tomado por uma estranha inquietação. Desejei retornar logo ao píer de embarque. A minha mente repetia como um disco avariado a frase, Una sonrisa! Una sonrisa, por favor!

Findado o passeio, caminhei por entre os companheiros de viagem a passos calculadamente lentos. Deixei que as pessoas interessadas em suas respectivas fotos se aglomerassem ao redor da encantadora fotógrafa, e quando todas saíram falantes e satisfeitas, me aproximei. Ela ofereceu-me um meigo sorriso e procurou a minha foto entre as não solicitadas, mas não a encontrou. Lamentou a perda e prometeu-me procurá-la no laboratório, e se eu desejasse, ela poderia levá-la ao meu hotel. Quis pagar-lhe antecipadamente, mas recusou com uma gentil negativa. “No, es una cortesía”.

Na segunda-feira fui à Universidade, para apresentar as minhas credenciais para a realização dos tramites de contratação temporária como professor para o mestrado em Literatura Pan Americana que duraria dois anos, e as devidas apresentações aos colegas professores e membros do departamento de Letras. De volta ao hotel, o recepcionista entregou-me a chave juntamente com um envelope. Subi para o meu quarto já ciente que o envelope continha a foto. De fato. Era o meu retrato. Inconscientemente eu procurei algo mais, e virei o verso. Para animar a minha pueril expectativa havia uma frase escrita de próprio punho.

- De que sol você veio?

Um pouco confuso, deitei-me para melhor analisar a sentença. De que sol você veio? Uma frase simples. Mas eu indagava o que ela poderia significar e porque fora escrito ali. Pus-me a olhar atentamente o anverso e o reverso. Notei que saíra muito bem na foto e que a claridade do dia naquele barco à beira do rio Tigre mostrava bem o meu bronzeado, então, subitamente decifrei o “enigma”. Tomei-me de regozijo. Sim, estava claro. A fotógrafa estava quebrando a formalidade profissional e estabelecendo uma certa intimidade, perguntando-me de qual país eu era oriundo. Achei muito original a forma velada com que ela havia me notado, fazendo elogios à cor da minha tez, e mais feliz eu fiquei porque a frase solicitava uma resposta, um contato posterior. Então procurei por um cartão de visitas. Mas não havia. Apenas um timbre no envelope com um logotipo de um barco estilizado, e as inscrições em semicírculo La Costa Turismo com um número de telefone. Desci ao restaurante para o jantar e fiquei planejando um argumento para ligar e falar com a fotógrafa, cujo nome eu desconhecia. Não foi difícil elaborar algo circunstancial.

No dia seguinte após meus compromissos, liguei para La Costa Turismo dizendo que desejava falar com a profissional que havia fotografado os turistas no passeio de barco do domingo, pois eu desejava ter uma reprodução de minha foto. A atendente disse-me que a profissional se chamava Helena e que ela iria contatar-me. Para finalizar pedi-lhe que Helena fizesse a gentileza de encontrar-me à noite, pois somente nesse horário estaria no hotel.

Passei três noites em crescente expectativa, ficava no saguão até tarde, mas em vão. Subia para dormir desolado. Porém numa sexta feira o recepcionista interfonou para o quarto dizendo que Helena me aguardava no hall. Desci ligeiro e tentei dissimular o meu contentamento. Estendi-lhe a mão em cumprimento cordial. Ela foi afável em poucas palavras causando-me boa impressão e estendeu-me o envelope com a reprodução. Peguei a carteira para pagar-lhe, mas ela recusou pela segunda vez dizendo ser um regalo a um rapaz bronzeado. Sorri duplamente agradecido e muito satisfeito pela insinuação. Senti-me à vontade para perguntar-lhe se estava livre para um passeio. Com que alegria eu ouvi um sim.

Caminhamos lentamente pelo passeio que mostrava uma cidade aparentemente festiva. Iniciei nossa interlocução mencionando a frase interrogativa que havia no verso da fotografia. Rrespondi-lhe com um sorriso que eu viera do sol do Brasil. Ela disse que eu não parecia ser estrangeiro, dado a fluência com que eu falava o Espanhol. Senti-me orgulhoso com essa lisonja. Sentamo-nos num café e foi bastante aprazível a sua companhia. A título de manter uma conversa ativa, disse-lhe que havia um belíssimo romance na literatura brasileira intitulado “Helena”. Motivado por seu aparente interesse, fiz-lhe um sumário da estória e ela se sensibilizou com o pungente final.

Lamentou dizendo que a arte imita a vida. Eu concordei sem notar naquele momento que havia um fio de tristeza em sua voz.

Um vento frio que inesperadamente percorreu o passeio alertou-nos que era hora de voltarmos. Caminhando em busca de um táxi ao qual ela pegaria, eis que algo surpreendente aconteceu. Espantado, eu notei pequenas pedrinhas caírem sobre nossas cabeças. Corremos para nos abrigar, e foi admirável o espetáculo que presenciamos. Uma inesperada chuva de granizo que saltitava no chão feito bolinhas de cristais. Helena tranquilizou-me dizendo ser a tormenta de Santa Bárbara, comum em determinadas épocas do ano. Perguntei-lhe se era um bom presságio. Sem responder-me correu sinalizando para um táxi. Ouvi-lhe apenas dizer-me adeus.

Foram inesquecíveis os dois anos que passei em Buenos Aires. Eu e Helena tornamo-nos amantes. Estabeleci-me em um pequeno apartamento e em determinadas noites ela aparecia. Logo percebi que Helena possuía um segredo ao qual me proibiu tacitamente de desvendar. Então eu me permitia apenas conjeturar, pois a sua beleza, a sua docilidade e sobretudo a sua melancolia mantinha-me cativo dessa grande paixão. Quão feliz eu era.

No término de meu contrato com a Universidade, implorei-lhe que me acompanhasse no retorno ao Brasil. Foi nessa ocasião, que em prantos revelou-me o seu segredo.

Helena era indiretamente uma vítima da ditadura militar que com mão de ferro punia os opositores do cruel sistema. Seu marido era um jornalista de esquerda. Seus artigos denunciavam as injustiças e arbitrariedades praticadas por um governo ditatorial. Seu Jornal fora fechado e ele torturado e preso. Seu pequeno filho vivia sob os cuidados de uma irmã que vivia na província de Catamarca, a noroeste da Argentina. Ela trabalhava duramente para manter o filho e visitava semanalmente o marido na prisão. Contou-me da tristeza desses encontros e dos conflitos emocionais que se desencadearam a partir desta situação. A humilhação causada pela suspensão de todos os direitos inerentes ao homem quer de ordem física ou emocional, fez-no um morto-vivo, indiferente a tudo. As suas visitas ao cárcere era um ato de amor sem dúvida, mas, sobretudo um ato de piedade cristã. Por isso, não era livre para amar-me plenamente e seguir-me. A nossa despedida foi extremamente dolorosa. Não haveria esperanças. Viveríamos apenas das lembranças.

No avião, na viagem de regresso ao Brasil, senti-me imensamente solitário. Lembrei-me do romance “Helena” de Machado de Assis e da frase antológica que em tom pungente, Estácio dirigiu-se a Helena, e que naquele momento serviu-me de alento.

“Estes meses de intimidade vão ser esquecidos”? No dia em que penetrastes em minha vida Helena, entrou contigo um raio de luz nova, alguma coisa que faltava e que trouxestes contigo. Pensava que isto seria duradouro, e era simplesmente fugaz. Oh! Helena, melhor fora não ter vindo!

Retirei do bolso um pequeno envelope que Helena havia me entregue em nossa despedida no aeroporto. Era uma nova reprodução da fotografia que ela havia tirado no barco, no passeio sobre o Delta do Tigre. No reverso havia a sua delicada letra a indagar. De que sol você veio para iluminar a minha vida?

Esbocei um sorriso paradoxalmente triste.

FIM

  

 

- MEDALHA DE BRONZE

 

 

NEGE ALÉM (INDAIATUBA - SP)

  

A  DESPEDIDA

 

Manhã fria. Céu nublado prenunciando chuva. Forte desejo impeliu-me a caminhar por uma tortuosa viela que levava ao cemitério. Fui não só pela obrigação filial de orar alguns minutos pela alma de meu pai, como sempre fazia, mas também para despedir-me dele.

Muito triste a derradeira morada terrena dos que já sofreram o impacto das paixões do mundo e agora jazem  esquecidos dos parentes e amigos.

Comecei a minha via-sacra por entre as campas. A oração e a reflexão não me deixavam esquecer que a vida terrena é fugaz e tudo o mais que a rodeia. Sentia-me reduzido ao que sempre fui – um transeunte na terra, aproximando-me a cada dia da Pátria Eterna.

De passagem, detinha-me a observar os túmulos antigos, de lápides escuras e carcomidas, sem marcas de velas ou vasos de flores. Nenhum vestígio de que alguém ainda os visitasse. Eu lia nos epitáfios nomes, quase todos desconhecidos, a data do nascimento e a da morte. Calculava a sua existência terrena e depois os anos em que se encontravam sepultados.

Tão absorto, num instante cheguei a ter a ilusão de ver meu próprio epitáfio entre tantos outros, perdido naquele silencioso retiro. Estremeci. Após algum tempo, também ficará minha sepultura abandonada num canto sombrio, onde nenhum parente ou conhecido possa encontrá-la,  lembrar-se de mim e dizer ao menos breve oração.

II

 

Ajoelhei-me contrito na borda do túmulo de meu pai, alheio a toda a gente que estava ali a rezar por seus parentes ou amigos falecidos recentemente. Persignei-me e comecei a oração:

-- Pai-nosso, que estais no Céu... Sabe, pai, vim despedir-me e pedir  a sua bênção. Vou embora amanhã bem cedo para outra cidade, mas sempre voltarei para visitá-lo. Não tenho mais escolha. Mamãe já sabe de minha decisão e aprovou-a. A situação em casa está cada dia pior, desde a sua partida. Ave-Maria, cheia de graça... Tudo ficou difícil. Não consigo emprego. Santificado seja o vosso nome... Ajudo o seu Nicola em sua oficina de sapateiro. Coitado! Tenho pena dele. Ganha tão pouco em consertar sapatos velhos e, mesmo assim, ainda me dá alguns trocadinhos toda semana.

Não sei quanto tempo me esqueci ajoelhado. As frases da prece baralhavam-se com as da despedida. O pensamento, desligado por instantes, remontava a passados dias e revivia episódios felizes e pitorescos ao lado de meu pai, ora nos campos atravessando por  debaixo de cercas para chegar ao açude e pescar e nadar, ora me via trepado em seus ombros, quando eu era bem pequeno e me sentia cansado das longas caminhadas. E, relembrando aqueles momentos, esquecia-me da oração e quase chegava a sorrir, ao ouvir de memória as histórias de sua infância, ou os ditos engraçados. Como éramos amigos e nos divertíamos! Mas logo eu voltava à realidade. Tornava-me circunspecto e triste e não podia reter as lágrimas.

Calava-me por instantes. Depois, continuava a oração:

-- Venha a nós o vosso Reino... Não sei se vai dar certo, pai! Agora, eu sou o homem da casa e preciso ganhar mais. Quase inútil, não tenho conseguido ajudar minha mãe e os irmãos, como eu queria e devia. Sumiram todos os que se diziam nossos amigos. Ninguém nos conhece mais. Às  vezes, encontro no quintal folhas daquele grosso livro de contas-correntes da vendinha, onde o senhor costumava registrar as vendas fiado. Num dia de grande apertura, mamãe pensou em procurar os devedores que ela conhecia e pedir que pagassem ao menos um pouco do que deviam. Ela teve receios, porque o senhor nunca foi de cobrar a ninguém.

Chuva grossa começou a cair.

Tentei reatar a oração e não conseguia terminá-la. Ora rezava frases do pai-nosso, ora da ave-maria, ora ligava uma oração à outra e ao monólogo.

-- Sabe, pai, como disse, venho fazer-lhe mais esta visita e despedir-me. Quero a sua bênção.

Senti profunda amargura ao imaginar que o estava deixando. As águas da chuva misturavam-se com as lágrimas de meus olhos. Caminhei passos lentos em direção ao portão da saída. Detive-me e voltei apressado.

-- Pai, apesar de todo que lhe disse, não posso ir embora! Vou ficar.

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