Prezados, desta vez eu lhes trago uma entrevista feita com a rainha do cordel sergipano: Izabel Nascimento. Boa leitura!
Sou sergipana de Aracaju. Aprendi os primeiros versos de Cordel no ambiente familiar. Sou filha de pernambucanos, os poetas Cordelistas Pedro Amaro e Ana Santana, que moram em Aracaju há quase 50 anos. A literatura de Cordel, vivenciada no seio familiar, sempre me encantou. Eu presenciava os encontros de poetas e cantorias na minha casa e aos 7 anos de idade, comecei a fazer os meus primeiros versos, sempre em homenagem aos meus pais, tempo em que já desenvolvia a leitura e a escrita. Aos 13 anos, escrevi o meu primeiro folheto: "Um falso amor". Na escola, sempre me destaquei pela habilidade de escrever e de apresentar meus trabalhos à turma. Tudo o que aprendia na escola, apresentava aos meus pais em casa. Porém, apresentava na Escola, muitas das coisas que escrevia com ajuda e incentivo da família.
Gosto de ler Cordel. Recentemente, tenho me dedicado às leituras teóricas sobre a Literatura de Cordel e mergulhado no campo da pesquisa. Como passei a conhecer muitos poetas cordelistas através das redes sociais, tenho lido os cordéis que recebo de presente destes amigos. Além de meu pai, Pedro Amaro, leio e releio os folhetos do saudoso sergipano João Firmino Cabral, me encanto com a alegria dos versos do meu conterrâneo e amigo, o Poeta João Batista Melo, me impressiono com a grandeza dos versos do paraibano Zé de França, aprecio a coesão dos versos do grande Moreira de Acopiara e pesquiso na fonte inesgotável que deixou o grande Patativa do Assaré.
Pesquiso diretamente na internet, através do celular. Faço muito isso e não só pelo significado das palavras, mas também pela rimas que determinada palavra pode oferecer ou provocar. Este exercício é muito bom e favorece o momento da criação dos versos de Cordel.
Eu não sou membro de nenhuma Academia, embora tenha muitos amigos acadêmicos que admiro.
Dialogo muito com poetas - cordelistas e não-cordelistas - pelas redes sociais, alguns deles/as não conheço pessoalmente. É o caso dos poetas que compõem o grupo "De Repente Cordel" no whatsapp. São oito poetas de 06 Estados brasileiros distintos que interagem diariamente há quase dois anos. No grupo, produzimos versos e ano passado escrevemos um material poético para confecção de um livro, o qual estamos buscando apoio para publicar. Os poetas Gustavo Queiroz, Igor Alves, Jonh Morais, Júnior Adelino, Palloma Brito, Paulo Medeiros, Rarisovaldo Oliveira e Zé de França são poetas do Cordel com quem tenho aprendido bastante.
Fora do "De Repente Cordel", há muitas outras pessoas ligadas a poesia que me ajudam e ensinam bastante. Um ótimo exemplo disso é o contato virtual com as Mulheres da Literatura de Cordel, que antes conhecia apenas on line, mas que tive a oportunidade de interagir pessoalmente num encontro na cidade do Crato-CE, ano passado. É muito forte e bonita a história da Mulher no Cordel e encontrar as talentosas poetisas foi algo que muito me fortaleceu.
Já participei de Antologias e de Cordéis coletivos. Acho muito interessante a construção coletiva para divulgação de nossos trabalhos. É uma das formas que eu considero de crescer com solidez e legitimidade. Certamente participaria de uma Antologia lançada pelo amigo Caruso. Seria uma honra!
Não sou membro de nenhuma Academia ainda. Eu sempre fui muito resistente a esse movimento pelo fato de trabalhar com a literatura de cordel e vê-la muitas vezes discriminada pelo fato de ser uma manifestação de origem popular. Para mim, as Academias de Letras não me contemplavam enquanto cordelista e defensora do Cordel como Literatura. Recentemente, observo o surgimento em todo o Brasil de novas academias, estas com propostas de ações inovadoras, que valorizam e agregam as literaturas, fortalecendo-as. É importante este novo pensar porque a partir dele, os caminhos para a valorização do cordel, por exemplo, se abrem. Nesta ótica e com este objetivo, ficaria lisonjeada com um convite para ser membro de uma Academia de Letras.
Entre folhetos, poemas e material para as redes sociais, tenho em média 60 textos literários.
Escrevo ininterruptamente há 10 anos, e mais intensamente nos últimos cinco.
Embora não tenha dificuldades de escrever em prosa, trago os versos em 98% dos textos.
São minha grande paixão.
Sim, alguns. Nas páginas no facebook:"Izabel Nascimento (cordelista)" e "Casa do Cordel - Espaço Cultural Pedro Amaro do Nascimento"; No meu perfil pessoal "Izabel Nascimento"; No blog: www.izabelnascimentocordelista.blogspot.com; No site: www.casadocordel.com.br
Uma das características da Literatura de Cordel é exatamente o relato cotidiano. Embora tenha alguns folhetos de ficção, gosto muito de incitar reflexões sobre as questões atuais da sociedade.
Estou muito envolvida com a Cultura, o que é um verdadeiro privilégio para mim. Costumo sim, visitar teatro, museus, apresentações musicais, cinema em Aracaju e sempre que viajo, tento encaixar programações culturais no roteiro. Ultimamente tenho reproduzido e criado pinturas em murais com traços de xilogravura. O desenho e a pintura são habilidades da infância que estavam adormecidas e que despertaram nos últimos anos, felizmente.
Para mim, gostaria muito de poder me manter através da minha arte. Gostaria que o povo brasileiro enxergasse nitidamente a riqueza e a diversidade da nossa cultura, que percebesse o quanto somos ricos culturalmente e que compreendesse que não pode ser chamada de cultura a manifestação que distorce, agride, humilha ou ultraja o Brasil, seus cidadãos, sua literatura e manifestações. Para o mundo, gostaria que o mundo deixasse de ver o Brasil através da "imagem" da mulata que rebola, que apreciasse a nossa literatura e conhecesse nossas reais riquezas.
Acho que precisamos caminhar muito com políticas de incentivo à leitura no Brasil. A origem da literatura no mundo aponta que ler era elemento da nobreza. A meu ver algumas instituições ainda respiram isso. E o reproduzem mesmo sem perceber. A democratização real da leitura é uma mola que pode impulsionar as mais diversas transformações no mundo pois sabemos o quanto ler liberta. O que nos falta mesmo são oportunidades. Para os leitores, ter livros com preços mais acessíveis, bibliotecas mais iterativas e interessantes, por exemplo. Para os escritores, possibilidades de publicações. No universo da leitura tudo ainda é muito caro. Em algumas instituições, muito pomposo. Quem trabalha no processo de alfabetização com jovens e adultos sabe o quanto é latente o desejo de aprender, na mesma medida que é forte a chaga do preconceito contra quem não sabe. Este preconceito, a sociedade impõe e ela mesma cobra. Muitas dessas pessoas tem a leitura da vida muito mais aguçada de quem tem a leitura da palavra, parafraseando Paulo Freire.
A meu ver o povo brasileiro não lê mais por falta de incentivo e oportunidade. Quem faz a leitura sem profundidade , o faz porque não consegue enxergar além disso ou nunca foi motivado a fazê-lo.
Sim, registo a maioria deles. Só não faço com todos porque já tenho despesas com a publicação dos meus folhetos, uma vez que eu mesma pago para fazê-los. Mas os principais, eu envio a FBN.
Recentemente, passei por problemas com o famoso "Cordel do Whatsapp", que escrevi em janeiro de 2015. Ele continua circulando por todo o Brasil com "autor desconhecido". Mas está devidamente registrado agora.
Não tenho.
Conheci o Paulo Caruso num grupo de escritores do Whatsapp. Sempre muito simpático e atencioso com todos os membros do grupo, não foi difícil consolidar uma amizade virtual com este grande escritor-poeta.
Difícil na história do Cordel, alguém se manter de sua arte. Para mim, o Cordel é algo para além de um hobby, mas é uma missão.